Para Jhon Macker, sobre Direitismo e Esquerdismo

Um comentário sobre meu artigo "Alguns Motivos para Ler Olavo de Carvalho" do caro colega Jhon Macker, sempre bem vindo mesmo com divergências, me chamou a atenção sobre os usos que fazemos dos conceitos de direita e esquerda e das confusões que isto pode levar.

Pessoalmente acho os termos tão desgastados, que é difícil utiliza-los sem uma nota ou referência explicando em qual sentido se utiliza, tal o uso indiscriminado e pouco preciso com que se tem feito ao longo de pelo menos 200 anos desde dos tempos da Assembleia Nacional francesa.

Corremos certo risco de tratar certo sentido e ser interpretado por outro ao usar estes termos. Vou relatar alguns usos equivocados destes termos e seus similares.

> Esquerdismo como sinônimo de comunismo

Esta não foi inventada por Olavo de Carvalho, remonta tempos da Guerra Fria em que qualquer simpatizante de causas sociais ou princípios de igualdade já era tomado como comunista. O que o Olavo fez aqui foi ressuscitar o antigo erro.

Segundo o cientista político Noberto Bobbio, entendemos como direita as ideologias que tomam as desigualdades sociais como algo inerente as desigualdades humanas, que benéficas ou não, depende da vertente, não são corrigíveis dada a natureza humana ou a forma como é possível vivermos em sociedade.

As desigualdades sociais seriam parte da forma como vivemos, uma consequência e qualquer alteração nesta forma de vida nos seria impossível ou uma experiência arriscada.

Edmund Burke, considerava que a Revolução Francesa nunca daria origem a instituições eficientes e consolidadas por milênios, pelas mãos de homens de diversas gerações, tal como aquelas que havia renegado por completo.

A "arrogância iluminista", vista por estes homens como a aventura de homens pretensiosos de inventar instituições e leis em substituição àquelas que por séculos ordenavam a sociedade.

Havia também a desconfiança de que as novas leis, sem o respaldo dos costumes, tradições e religião, não teriam força moral para se estabelecer sobre os homens. Os levando ao caos e a retrocessos.

A ideia de homens iguais, tomada em seu extremo, tornaria inviável as sociedades e os empreendimentos humanos, em que os mais talentosos e habilidosos tivessem a mesma importância do que os outros de menor inteligência e conhecimento.

>>Não vou entrar aqui no mérito das afirmações, mas somente descrevi em linhas gerais os pressuposto do que se chama de pensamento de direita.

Dentro desta perspectiva, muitas variações são possíveis e inclusive as consideradas "extremas". Direita cristã, direita liberal, direita conservadora... Nas formas extremas, autoritárias, fascismo e sua derivação que é o nazismo. Se diferenciam conforme as explicações e como valorizam esta desigualdade: mal necessário, benéfica, parte da natureza humana, parte da competição pela vida, algo que pode ser mais humanizado, etc.

O que chamamos de direita liberal possui uma profunda convicção em valores da liberdade individual e no mercado como forma auto reguladora dos comportamentos econômicos. Os indivíduos buscando seus interesses particulares, pelo processo de competição e alocação de recursos no mercado, tornaria não intencionalmente a produção e distribuição de mercadorias mais eficientes para todos.

Na defesa do indivíduo, eles repudiam qualquer entidade como Estado ou associações, pois seriam formas de solapar decisões individuais para decisões de grupos organizados. Para eles, coletividade, Estado ou entidade não tomam decisões, mas pessoas que as usam como forma de exercício de poder para impor suas vontades sobre os outros.

A igualdade como indivíduo significa que as leis auto regulamentadoras da economia se impõem a todos, a não ser quando o Estado interfere na mesma a favor de seus interesses ou de algum grupo - incluindo as minorias sociais.

Por isto muitos liberais de direita se opõem a políticas de cotas e de redução das desigualdades, as quais acreditam ora serem necessárias dada a competição por recursos escassos, ora consequência da meritocracia e das diferenças naturais entre os homens. Algumas vertentes liberais defendem programas de renda mínima como forma de corrigir desigualdades extremas e nocivas a própria economia.

Por isto defendem Estado Mínimo, e acreditam que interferências do mesmo na economia geram prejuízos para todos os envolvidos. Em sua forma radical, temos o anarcocapitalismo que acredita que até mesmo o Estado é dispensável para a existência de uma capitalismo em um sistema de livre mercado.

Como direita conservadora, temos a vertente que focaliza mais a questão das tradições e aspectos culturais de uma civilização, do que o econômico. A preocupação com as normas sociais, os valores e as crenças mais arraigadas de um povo se configura como a preservação de uma identidade nacional, cuja perda implicaria na decadência e atraso cultural e social de um povo.

O conservadorismo tem por base a ideia de que existem valores e instituições que uma civilização desenvolve que são fundamentais para sua preservação e crescimento. Como a desigualdade social é algo de extrema antiguidade e constituinte da maioria das sociedades existente hoje e no passado, esta mesma tende a ser resguardada pelo conservadorismo como um valor e algo natural do ser humano.

Há correntes que acreditam que tal igualdade promovida pelos socialistas teriam mediocrizado e sufocado o desenvolvimento artístico e filosófico de um povo. A ideia de inclusão e do relativismo promovido pela esquerda teria rebaixado o pensamento e erudição de uma forma geral tornando as expressões medíocres com o mesmo valor daquelas elaboradas e consagradas.

A visão a respeito do homem não é individualista, ideia de moral e valores civilizacionais são superiores a liberdade e relativismo nos costumes ( arte moderna, movimentos identitários, homossexualismo, etc.). Família, certo tipo de cultura, religião e valores seriam fundamentais para uma sociedade e seu rompimento levaria ao caos e decadência de uma sociedade frente as outras.

O mercado e o capitalismo não são negados, e sim certos valores liberais que tendem a colocar no indivíduo uma importância exagerada e sobreposta a valores nacionais ou civilizacionais. Nem tudo poderia ser reduzir a escolhas e decisões individuais.

No que chamamos de extrema direita, temos o fascismo e seu derivado nazismo. Se trata de algo diferente tanto do liberalismo quanto do conservadorismo, embora possa se valer da roupagem deste. São ideologia modernas, que partem do princípio de que homem pode moldar o seu destino e construir uma sociedade conforme seu merecimento e valor.

O elemento extremo de desigualdade se dá pelo fato de seus projetos de sociedade não comportarem ideologias e pensamentos que sejam opostos ao projeto político do grupo dominante. As classes sociais se representam pelo Estado coorporativo que busca a síntese não conflituosa entre patrões e empregados, colocando acima destes o Estado e a união da sociedade.

A construção de uma sociedade coesa, significaria dentro desta ideologia uma sociedade não liberal, diversificada, sem conflitos de classe e de interesses políticos, tendo o Estado Corporativo o papel de ordenar e harmonizar estes interesses em prol de uma visão específica de sociedade e de povo. A democracia é vista como uma fraqueza política, onde a disputa de interesses leva a corrupção e desunião de um povo em torno de um objetivo comum.

A derivada nazista inclui de forma mais categórica a ideia de povo como uma unidade cultural e racial, onde o extermínio se estende não só aos opositores políticos e pensamentos adversos como também a raças e povos considerados inferiores.

A política racial nazista consistia na elevação do que se chamou de raça ariana e no extermínio do seu meio e de onde viessem conquistar de elementos raciais que "contaminassem" e enfraquecessem a raça e a cultura alemã. Foram alvos disto os judeus, ciganos, eslavos...

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As ideias que o autor classifica como esquerdistas são aquelas que tem como foco a redução ou eliminação das desigualdades sociais. Primeiro que não tomam as desigualdades como algo natural ou determinante para e existência da sociedade, mas como construções humanas e como tais podem ser reformuladas ou substituídas por outras.

Dentro desta perspectiva, temos o socialismo e suas variações:

> socialismo utópico. Assim denominado por Karl Marx, pois considerava tais tentativas de redução das desigualdades ou amenização da pobreza sem que alvejasse as condições econômicas que fundamentam uma sociedade. Exemplos: Robert Owen, Fourier, Saint Simon.

> Comunismo: constituído de várias vertentes que tem como base o materialismo histórico-dialético de Karl Marx. Conceitos como luta de classes, revolução, ditadura do proletariado, capitalismo como forma de exploração do trabalho e que uma sociedade comunista (sem distinção de classes, exploração do trabalho, e sem Estado seria uma etapa seguinte a superação do capitalismo como modo de produção). Para os comunistas, antes que uma sociedade plenamente comunista seja alcançada seria preciso um período de transição em que ainda existiria o Estado e elementos institucionais do mesmo.

> Anarquismo: vertentes revolucionárias e não revolucionárias. Acreditam que uma sociedade comunista, sem distinções de classe e sem Estado, não deveria ser almejada diretamente, sem a intermediação de uma ditadura do proletariado ou outro tipo de Estado. Os anarquistas são mais radicais quanto a nocividade de qualquer forma de hierarquia e dominação política pelo Estado. Teóricos: Proudhom, Bakunin, Goldman

> Reformistas: vertentes não radicais do socialismo, que acreditam humanizar e reduzir as desigualdades sociais em um processo lento e sem choques com o modo de produção capitalista. Exemplos: Socialdemocracia, Trabalhismo, liberalismo social, socialismo cristão (teologia da libertação), etc.

Vertentes consideradas de extrema-esquerda: marxismo leninista, maoísmo, stalinismo, trotskismo, entre outras. O que impede de enquadrar o marxismo de uma forma geral na extrema esquerda, é que o marxismo como pensamento econômico e social inspirou tanto vertentes radicais quanto reformistas. É preciso diferenciar o marxismo como teoria social dos diversos movimentos e características que estes assumiram conforme as lutas que enfrentavam e o contexto em que ocorriam.

O stalinismo representou a forma mais radical de operacionalizar certa visão do marxismo e da condução da revolução na ex-URSS. Para que projetos de industrialização e desenvolvimento econômico fossem feitos a partir de anos de czarismo e guerras revolucionárias muita violência, perseguição política e extermínios foram utilizados.

É preciso considerar que praticamente o desenvolvimento da URSS nas primeiras décadas se fez tendo o Ocidente os encarado como ameaça e todo um histórico de apoio aos adversários dos bolcheviques.

O interessante nesta história toda do stalinismo, é que o próprio Marx alertava sobre a necessidade de internacionalização da revolução como condição de sobrevivência da mesma, Stalin defendia a tese do socialismo em um só país - o que significava que não provocaria as potências europeias insuflando e apoiando diretamente seus movimentos revolucionários, tal como defendia Trotski.

Quando Lennin e Trotski perceberam que a revolução não eclodiriam em países desenvolvidos como a Alemanha, ele se viram na situação de tocarem sozinho a revolução. Se industrializar maciçamente a toque de caixa para fazer frente a ameaças diversas era o única coisa a se fazer. O custo foi o deslocamento de milhões de pessoas, mortes por fome, extermínio e por precariedade nas condições de vida, além de expurgos paranoicos que mais prejudicaram do que ajudaram seus quadros científicos e militares.

Algumas correntes comunistas no Brasil não acreditam em revolução no atual momento em que vivemos, acreditando que suas condições históricas ainda precisam ser amadurecidas para que ela tenha sucesso, outras acreditam que só a revolução imediata é saída.

>>> É tão diversificado o que chamamos de "esquerdismo" ou mesmo de comunismo, que tomar tais termos como se eles se referissem a uma única forma de pensar não teria nenhum efeito analítico e interpretativo sobre as formas como os diverso grupos atual e pensam a realidade social e política.

Da mesma forma, quando falamos sobre direita ou direitismo.

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Muita coisa deixou de ser falada aqui, trata-se de um resumo de umas pontuações que podem nos ajudar a qualificar o debate sobre direita e esquerda, além de ser uma base com o qual pode se aprimorar ou mesmo corrigir o que foi afirmado.

Se colegas com fontes melhores e conceituação quiserem contribuir ou corrigir o que foi dito seria algo bem vindo e muito construtivo para o entendimento.

Wendel Alves Damasceno
Enviado por Wendel Alves Damasceno em 05/04/2020
Reeditado em 05/04/2020
Código do texto: T6907895
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