Os seguidores da Ciência seguem qualquer coisa, menos a ciência. Histeria coletiva. Palavras e mais palavras. Aristófanes e os homens da lei. Notas breves.

Muitas pessoas, assim que, no distante ano de 2.020, ouviram falar sapienciais médicos e cientistas renomados, evoluíram, de homo sapiens para homo seguidoris cientificus - que me perdoe o leitor o péssimo latim, que é dos latinos, e não meu -, Seguidores da Ciência, em vernáculo. A imprensa elevou, estamos cientes, aos píncaros da notoriedade certos médicos e cientistas, uns quatro, ou cinco, e atribuiu-lhes dons supremos, infalibilidade. E de tanto ouvirem tais sumidades descarregarem, usando de um vocabulário pra lá de estrambótico, que ninguém entendeu, mas todos fingiram que entenderam - todos, aqui, são os homo sapiens que ambicionaram a evolução que viriam a sofrer -, tempestuosamente platitudes sem fim, ou coisa que o valha, os homo sapiens que passavam por um ligeiro processo evolutivo introjetaram, conscientemente, suponho, os conhecimentos superiores que delas ouviram, aprenderam a rejeitar negacionismos, dando mostras inegáveis de que estavam predestinados a superarem a sua natural condição homosapiensnica - que neologismo escalafobético - e a enfiarem o dedo acusador no nariz dos seres humanos inferiores fadados a viverem eternamente - enquanto vivos, é óbvio - sob o domínio de sua homosapiensticidade (Hoje eu 'tô demais; é este o segundo neologismo que invento em menos de cinco minutos). Na prática, recusaram-se a dedicar um pouco, um pouco que fosse, de sua atenção às vozes dissonantes e a ponderarem a respeito das objeções que eles aventaram. Excitados pelos pronunciamentos das celestiais autoridades midiáticas, médicos e cientistas eleitos pelos donos do poder, que impuseram uma visão única do fenômeno epidêmico - real, ou não, não vem, aqui, ao caso -, arvoraram-se defensores legítimos do debate democrático, livre, franco, aberto, e declararam-se dispostos à controvérsia. Verdade seja dita, primeiro eles rotularam de nazistas, fascistas e genocidas os que não assinaram embaixo dos documentos chancelados pelos sábios de plantão e recusaram-lhes acesso aos canais de comunicação, e assim, eliminando-os do debate público, fizeram valer a verdade homoseguidoriscientificusênica (e aqui vai o meu terceiro neologismo). E clamam aos quatro ventos que venceram o debate público. Qual debate público? O que nunca existiu.

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Ainda persiste a histeria coletiva que a imprensa e a internet criaram nestes meses de domínio do protagonismo do coronavírus no cenário midiático e político global. Impressiona a facilidade com que as pessoas abandonaram - as que a possuíam - a razão para adotar, mecanicamente, o discurso predominante, que foi sendo alterado numa sucessão de narrativas sem pé nem cabeça. No início, dizia-se que era o vírus velocíssimo, a mover-se numa velocidade hipersônica, e de baixa letalidade; daí a necessidade de se impôr uma política de quinze dias de quarentena para se desacelerar a transmissão do vírus entre os humanos e dar tempo para os órgãos públicos de saúde prepararem hospitais para acolherem a enxurrada de doentes infectados pelo vírus. E depois destes quinze dias, era o que se dizia então, o vírus seguiria o seu curso natural, e as pessoas saudáveis infectar-se-iam, até se atingir a imunidade de rebanho, natural. As pessoas assumiram o compromisso de praticarem certas atividades, apropriadas, que contribuiriam para a contenção da transmissão do vírus. E fim. The end. E todos viveriam felizes para sempre. Mas de repente, mais que de repente, alterou-se a narrativa. Tinham, agora, todas as pessoas de se conservarem indefinidamente trancafiadas em suas casas até que se produzisse a vacina, pois a imunidade natural inexiste, ou é, existindo, inútil. E aceitou-se tal narrativa, o novo consenso científico entre médicos e cientistas, quatro, ou cinco, escolhidos a dedo, que apresentaram ao admirável público, tão receptivo, tão sugestionável, a boa nova. E menciono outro ingrediente da narrativa: nenhum remédio, pois remédios provocam efeitos colaterais, podia ser administrado aos humanos já infectados pelo vírus. E poucos foram os que se perguntaram quanto tempo teríamos de esperar pela vacina milagrosa, e o que aconteceria com as pessoas que subsistem de venda de balas-de-goma, paçoca, bugigangas, nas praças, e cuja renda lhes dá meios para a aquisição da refeição de um dia, apenas para a da de um dia, e se apenas os remédios indicados para uso contra o vírus ao qual se atribui todos os males que nos afligem provocam efeitos colaterais nas pessoas que deles fazem uso. O terror psicológico, de assustar. Muitas pessoas viram o vírus em todo lugar, e o viram porque não o podiam ver. A imaginação, em estado de histeria, fê-las vê-lo, e vê-lo com a figura de uma criatura monstruosa, escatológica.

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Com a ressignificação das palavras enfia-se novas idéias na cabeça de todos, idéias que não correspondem ao objetivo real dos que ressignificam as palavras e o qual o público rejeitaria se apresentado com as palavras conservados os seus significados correntes; é o objetivo alegado dos ressignificadores de palavras benéfico, sempre; e o verdadeiro, inconfessado, oculto, maléfico. Ao se dizer "controle de natalidade" e "aborto de feto" está-se a dizer, ensina o discurso oficial, que se faz urgente uma política social, pública, para se evitar o esgotamento dos recursos naturais, e, consequentemente, o colapso da civilização, e, o mais preocupante, a aniquilação dos seres vivos e a destruição da Terra; mas o que se esconde com tal palavreado do público desavisado é a política, a real, de assassinato de crianças, de dessensibilização dos humanos, de promoção da cultura da morte, do hedonismo, de uma cultura anárquica, suicida. Ao se dizer "amor intergeracional", defende-se - é o discurso oficial - o sentimento amoroso (entenda-se, relações sexuais) entre adultos e crianças, sentimento que se deve compreender e respeitar; mas está a se promover a violência, o abuso, a exploração sexual de jovens e de crianças. São belas as palavras de tolerância, de respeito, de luta contra os preconceitos e os tabus. Vende-se gato por lebre. Em nome do combate ao machismo promove-se o ódio ao homem - daí o discurso contra a "cultura do estupro" e a afirmação "todo homem é um estuprador em potencial" e a condenação da "masculinidade tóxica" (daí afirmarem que todo homem é violento, selvagem, incivil, uma ameaça à civilização). Na luta contra o racismo, sustenta-se o ódio mortal pelo homem branco. Em defesa das mulheres, com palavras melífluas, além de justificarem o ódio aos homens, enobrecem o mal que se faz às mulheres. Ressignificando-se as palavras são atos anti-democráticos as manifestações pacíficas de bolsonaristas; e manifestações pela democracia, livres e espontâneas, populares, revoltas e sublevações violentas que jogam policiais feridos, nos hospitais, às portas da morte, e deixam casas a arderem em chamas e, destruídos, prédios públicos e privados. E é aliança pela democracia e contra o fascismo a associação de criminosos contra o povo honesto e trabalhador.

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Aristófanes, dramaturgo que viveu, há dois mil e quatrocentos anos, na Grécia, não tinha em alta conta os homens das leis. Em As Vespas ele exibe o seu desprezo por tal gente. Sem papas na língua, ferina, corrosiva, rididulariza juízes, que atuam, segundo ele, não em benefício da Justiça, mas de si mesmos, a salvaguardarem os seus privilégios e os dos poderosos que os sustentam. E as exceções confirmam a regra. Ontem e hoje.

Ilustre Desconhecido
Enviado por Ilustre Desconhecido em 18/11/2021
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