Os méritos de um pastor - Dom Mauro Ramalho

Padre Geovane Saraiva*

Coragem e perseverança são as palavras de ordem para quem encontrou em Deus o sentido da vida. Podemos olhar Samuel, personagem da Bíblia que crescia, sempre na presença de Deus (cf. 1Sm, 3, 19). Já Dom Helder, que por graça do mesmo Deus, constantemente experimentou sua bondade, dizia: “E graça divina começar bem, graça maior é persistir na caminhada, mas a graça das graças é não desistir nunca”.

Ana Paula, criatura boníssima, advogada e funcionária do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, presenteou-me com o livro “A Voz do Pastor”, publicação de autoria da professora Maria do Socorro Pinheiro, que descreve a história de vida do ilustre filho de Russas, Dom José Mauro Ramalho, primeiro Bispo da Diocese de Iguatu, que a exemplo de Samuel, buscou sempre viver na presença de Deus. O título da obra foi inspirado no programa radiofônico que leva o mesmo nome, apresentado durante anos, por Dom Mauro. O desejo alimentado pelo homenageado era de escrever um livro sobre sua trajetória de vida, que felizmente se concretizou através da mente dadivosa da professora Maria Socorro, tornando realidade o sonho do querido bispo emérito de Iguatu.

As pessoas que acolheram a mensagem do Salvador da humanidade, anunciada por Dom Mauro, no mundo em processo de transformação, a partir do Concílio Vaticano II, foram, com certeza, profundamente marcadas por seu estilo de vida e por sua fé inabalável, nas tristezas e angústias, alegrias e esperanças, saindo de si mesmas, no desprendimento e na liberdade, doaram-se a serviço do reino de Deus.

O livro, A Voz do Pastor, acentua os aspectos sobre a vida e o trabalho do primeiro bispo de Iguatu, D. José Mauro Ramalho de Alarcon e Santiago, iniciando-se com a infância do menino Mauro, que nasceu na cidade de Russas, interior do Ceará, e que depois dos estudos rigorosos no Seminário da Prainha, viria se tornar sacerdote aos 23 anos de idade. A partir desse período foram necessários mais 13 anos para que o jovem padre fosse chamado para uma nova missão, quando o Papa João XXIII tomou a decisão nomeá-lo bispo para a Diocese de Iguatu, fato esse, que foi consumado ao ser ordenado bispo dia 06 de janeiro de 1962, na cidade de Aracati, vindo a assumir o posto de primeiro bispo da 5ª diocese do Ceará, em 04 de fevereiro de 1962, na cidade sede de sua circunscrição eclesiástica. Seguiu-se a partir daquele momento, em nosso meio, toda uma trajetória de um homem reto e piedoso, com uma missão evangelizadora repleta de graças e bênçãos do céu, sempre demonstrando um zelo intransigente pelas coisas sagradas, nunca esquecendo que o reino de Deus tem o seu início já aqui, daí sua preocupação aos apelos da caridade e solidariedade, indo ao encontro dos irmãos carentes e empobrecidos, tão bem expressado no seu lema episcopal, que procurou viver rigorosamente: Reple cordis íntima - enchei o íntimo do coração.

A autora Maria do Socorro, na sua feliz iniciativa, me faz lembrar o querido Dom Benedito Francisco de Albuquerque, hoje bispo emérito de Itapipoca, que quando andava por sua Diocese em visita pastoral, costumava dizer: “O bispo vibra!” Dom Benedito, o bispo vibra com que? Ah! o bispo vibra e se alegre com agricultores, com um bom inverno, com uma boa safra! Mas bispo se alegra e vibra mesmo é com os padres e com as comunidades que procuram se organizar para viver a sua fé, sempre prontas a dar razões motivações suas esperanças (cf. 1Pd 3, 15).

Tenho a mais segura convicção, que com Dom Mauro Ramalho, na sua vida bonita e maravilhosa, nos seus 50 anos bispo, com todas as suas realizações, de sol a sol, na Igreja do Vaticano II, em processo de mudança e transformação, o nosso Dom Benedito se alegra e vibra! De todos os padres conciliares que ainda vivem, em torno de dez, ele é o mais novo.

Olhamos para Dom Mauro, totalmente sintonizado com seu irmão no episcopado, Dom Aloísio Cardeal Lorscheider, de saudosa memória, ao afirmar: “Somos afins, na vocação surgida desde a infância e na graça que nos foi concedida. Ambos recebemos a ordenação sacerdotal em 1948, ambos fomos convidados ao episcopado pelo mesmo Papa João XXIII, ordenados bispos em 1962 com diferença de apenas quatro meses, eu a 06 de janeiro de 1962 e Dom Aloísio a 20 de maio daquele mesmo ano”. Disse mais: “Fortaleza teve a graça de recebê-lo em 1973 para suceder a Dom José de Medeiros Delgado. Lembro-me, ainda, da satisfação com que os bispos do Ceará, em plena Assembleia de Itaici, fomos convidá-lo a aceitar a proposta para assumir a sede episcopal de Fortaleza, Igreja mãe das Igrejas do Ceará. Tendo-o conhecido desde a primeira sessão do Concílio Ecumênico Vaticano II em que estreávamos como bispos recém ordenados, o privilégio de sermos Padres conciliares, protagonistas da busca de renovação da Igreja de nossos tempos, eu brincava aquele tempo, sem saber que mais tarde iria vê-lo Arcebispo de Fortaleza, chamando-o de Tomás de Aquino, o grande teólogo da Idade Média, cognominado Doutor Angélico, autor de um profundo estudo – a Suma Teológica”

Na sua generosidade e seu jeito habilidoso de se unir a Deus Pai, vendo-o no rosto do povo que lhe foi confiado, estando bem pertinho e amando-o, coragem e ternura nunca lhe faltaram para falar bem alto da grande novidade na Igreja, que chegava concomitante com sua missão de pastor, a Igreja do Concílio Vaticano II, naquilo que a humanidade desejava ardentemente: uma Igreja servidora, pobre e renovada, com melhores condições de vida e mais dignidade, não só no sentido de falar de esperança, mas ele mesmo quis proporcionar esperança, levando ânimo a sua querida gente. Percebemos com clareza e rendemos graças ao bom Deus pela importância desse bispo e pastor, na história do nosso Estado do Ceará, através dos seus grandes feitos, ao construir, no sertão centro sul, um grande edifício, formado de pedras vivas (cf. 1Pd 2, 4-6), animando-o pela fé e mantendo-o vivo na esperança.

A Opção Preferencial pelos pobres, que a Igreja da América Latina percebeu ser uma exigência daquele momento, diante da injustiça institucionalizadas em que estava estruturada a sociedade, Dom Mauro a compreendeu e assimilou com um senso de solidariedade cristã, não se perdendo em mera explanação verbal, mas procurando colocá-la para si como um programa de vida, através de gestos e atitudes, num esforço constante de ser a testemunha fiel, tão claramente evidenciada nas letras sagradas do Evangelho: “Servo bom e fiel, como foste fiel no pouco, irei te constituir no muito” (MT 25, 21).

Termino com as palavras vindas do coração generoso de Dom João José Costa, atual bispo de Iguatu: “Um coração que não somente se encheu do Espírito Divino, mas que transbordou. Os que conviveram e ainda convivem com Dom Mauro são agraciados pelo seu ministério e podem testemunhar esta grande verdade”. Bendito seja Deus por suas criaturas!

*Pe. Geovane Saraiva, sacerdote da Arquidiocese de Fortaleza, Escritor, Membro da Academia de Letras dos Municípios do Estado Ceará (ALMECE), e da Academia Metropolitana de Letras de Fortaleza

pegeovane@paroquiasantoafonso.org.br

Geovane Saraiva
Enviado por Geovane Saraiva em 06/05/2013
Código do texto: T4276905
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