Filosofia da Religião um olhar histórico panorâmico sobre a edição neotestamentária
Muitos entusiastas religiosos apegam-se a letra que mata e não ao espírito da letra que vivifica, incapazes de hermeneuticamente lerem os textos religiosos com olhos críticos e sinceros, observando seus impasses e contradições, muitos apenas leem pela ótica da tradição herdada, sem ao menos se dá ao trabalho de observar o que de fato o texto narra, o que do texto pode ser compreendido, e o que pelo texto se pode dialogar. Sem conhecer em nada a historicidade da construção do mesmo, muitos ainda acreditam que o mesmo surgiu como em um passo de transe, onde o Escritos passaram a serem redacionados durante momentos em que o Espirito soprava sobre os ouvidos dos escritores! Ignorando o longo processo histórico, conciliar e teológico que levou para que textos, parágrafos, livros, dogmas e doutrinas fossem sendo moldados. Na jornada pela formatação literária os grupos de escribas neo-judaicos (cristãos), passaram a transcrever em pequenos papiros princípios essenciais de sua fé; depois passaram a transmitir a nova forma judaica ao mundo, que ficou conhecido como "boa nova" - euggangelion", a outras regiões. Tais Evangelhos foram redigidos em um ambiente confuso em meio a muitas seitas judaicas, romanas e gregas, e do contexto mítico judaíco-zoroastrico e greco-romano, assinalavam a agonia do seu contexto sociocultural de sua época, fruto do seu momento histórico, depois sob a influência das discussões que caracterizaram os primeiros tempos do Cristianismo, se ressentiu marcadamente dos preconceitos da época e da influência teológica de sua geração. Cada grupo nessa época tinha seu próprio Evangelho, que diferiam um do outro, nem toda comunidade pensava de igual modo em todos os pontos, em todas as doutrinas. Grandes querelas dogmáticas agitavam de um lado para outro o mundo cristão e provocavam uma sanguinária perturbação no Império da época - Roma. Até que Teodósio, conferiu a supremacia do papado, e assim impôs a opinião do bispo de Roma sobre toda a cristandade. Foi assim, e a partir daí, que o pensamento ortodoxo criou forças para dominar os demais pensamentos e teologias diversas da cristandade. Sendo assim deu-se inicio a uma sucessão de Concílios Eclesiásticos para discutir muitos temas, entre tais a natureza de Yeshuah (O Jesus Histórico - frente ao mito criado pela tradição teológica eclesiástica), uns cristãos, mais antigos ligados ao Egito, Israel, Turquia, e demais localidade do Oriente Médio rejeitavam a divindade jesuítica, o papa Damaso confiou então a Jerônimo no ano de 384 d. e. c., a responsabilidade de redigir uma tradução latina do Antigo Testamento e do Novo Testamento. Esta tradução passou a ser por ordem papal a versão ortodoxa e reconhecida como sendo fiel! Conhecida como VULGATA. Para aquele que tiveram contato com a obra original de São Jerônimo em latim, sabe do que falo aqui, mas transcreverei. Esse trabalho ofereceu bastante dificuldade para Jerônimo, como ele próprio dizia: " (...) em presença de tantos exemplares corruptos, adulterados, duvidosos, de tantos exemplares, cópias de cópias". Essa montanha ou variedade de textos obrigava a fazer escolhas, a procurar saber qual dos tais seria o melhor para se entender ser tido como sendo o "original", uma vez que tal original já havia se perdido no tempo e no espaço. Diante de tantos textos retocados, rabiscados, essa não era uma tarefa nada fácil! Assim São Jerônimo como ficou conhecido, se dirigiu ao papa Damaso, deixando claro que sua tarefa em traduzir a obra para o latim, traduzir os Evangelhos para o latim seria um drama: "Reverendíssimo Damaso! De velha obra me obrigas a fazer nova. Quereis que, de alguma sorte, me coloque com árbitro entre os exemplares das Escrituras que estão dispersos por todo mundo, e, como, diferem entre si, que eu faça distinção os que estão de acordo com os verdadeiros textos gregos. É um piedoso trabalho, mas é também um perigoso arrojo, da parte de quem deve ser por todos julgado, julgar ele mesmo os outros, querer mudar a língua de um velho e conduzir à infância o mundo já envelhecido. Qual, de fato, o sábio e mesmo ignorante que, desde que tiver nas mãos um exemplar novo, depois de haver percorrido apenas uma vez, vendo que se acha em desacordo com o que está habituado a ler, não se ponha imediatamente a clamar que eu sou um sacrilégio, um falsário, porque terei tido a audácia de acrescentar, como outros fizeram, substituir, corrigir algumas coisas nos antigos livros? "Meclamitans esse sacrilegeum qui audeam aliquid in veteribus libris addre, mutare, corrigerre". Jerônimo termina dizendo: "Este curto prefácio tão somente se aplica aos Evangelhos, cuja ordem é a seguinte: Mateus, Marcos, Lucas, João. Depois de haver comparado certo número de exemplares gregos (que são muitos), mas dos antigos, que se não afastam muito da versão itálica, combinamo-lo de tal modo (ita - calamo temperavimus) que, corrigindo unicamente o que nos parecia alterar o sentido, conservamos o resto tal qual estava." ( Obras de São Jerônimo, edição dos Beneditinos, 1693, t I, col. 1425.). Assim o que havia parecido bom livro sagrado, do ano de 386 ao ano de 1586 d.e.c, passou a ser questionado, o que fora aprovado como sendo ortodoxo em 1546 pelo Concílio ecumênico de Trento, foi declarado insuficiente e errôneo pelo papa Sixto V, em 1590. Fez-se mais uma nova revisão, por sua ordem direta, depois modificada por Clemente VIII em uma nova edição, em uso até hoje canonicamente. Em todos os séculos certos homens dedicaram a vida para se aplicarem a entender como as Escrituras foram editadas, procurando desembaraçar a sombra do mito dos fatos históricos. Não há religiosidade e nem teologias frutos da tradições que esteja acima do conhecimento honesto, do conhecimento que gera verdade e sabedoria, e verdade é todo principio que não se contradiz! E a teologia das tradições é contradição sobre contradições!