EXPLICANDO O INEXPLICÁVEL : A VIDA

Explicar o que é a vida mesmo ninguém explica. Vai aí uma analogia, depois de pensar sobre o tema nestes últimos 50 anos. Nascemos dentro de uma montanha e não sabemos de onde viemos. Então passamos a vida como tatus escavando no interior de uma montanha. Nascemos para escavar nossos túneis e avançar montanha a dentro. Nossa herança é o túnel que escavamos. Não dá para usar o túnel feito pelo outro. Cada um deve escavar o seu.

Porque escavar tanto? Porque precisamos nos mover para frente. Porque sonhamos sair de dentro desta montanha, que é a própria vida úmida e ver o sol.

O objetivo é este mesmo. Achar uma saída da montanha, sua parede externa e encontrar ar puro, o verde, ouvir a lira celestial, o canto dos pássaros e descobrir a liberdade, que supomos é o céu, onde supostamente moram os anjos, os espíritos iluminados e por fim Deus.

Mas há muitas armadilhas em nosso caminho. Porque ao escavarmos, acharemos ouro, pedras preciosas e nos desviaremos do verdadeiro objetivo. Indo atrás do ouro, sairemos de nossa rota original, que é nossa missão e nos embrenharemos ainda mais no interior da montanha seguindo o veio do ouro que é impreciso, errático e labiríntico e se infiltra pelos interiores da montanha, tanto para cima como para baixo e assim, nos enterraremos cada vez mais, no seio da montanha e corremos o risco de lá, nunca sairmos.

O que deveríamos fazer é escavar em linha reta. A dureza da rocha, contudo, também nos faz desviar, à procura de rochas mais macias e o caminho fica mais longo. Assim a maioria de nós, morrerá dentro da montanha e jamais veremos o shangri-lá com que tanto sonhamos.

Beber se divertir ajuda-nos a esquecer nosso destino, mas não o resolve. Quando termina o efeito do álcool, da festa, teremos a montanha e suas rochas, pela frente. Desistir, seguir os prazeres, não nos faz avançar, apenas nos leva a permanecer nos calabouços da montanha para sempre. Morto dentro da montanha, sua alma ficará presa, aguardando alguma redenção.

Escavar causa sofrimento. Qual o sentido de escavar, então? Escava-se para ganhar olhos e asas. O sofrimento nos dá asas e olhos. Olhos da consciência e asas da maturidade. Porém, nem as asas, nem os olhos nos ajudarão no interior da montanha. Eles não poderão ser usados enquanto estiverdes na montanha, mas quando saíres desta. Os olhos do corpo, servem para ver apenas dentro da montanha. Precisaremos dos olhos da consciência, para ver, quando conseguirmos romper a montanha e atingir os vales ensolarados fora desta.

O sofrimento é assim necessário, diria, vital na nossa trajetória. Se não o obtiverdes cavando, você o terá por outros meios. São os segredos implacáveis da montanha. Há muitos segredos dentro da montanha! É como se houvesse uma cota de sofrimento a cada um, necessário a obtenção dos olhos e das asas

Um dia ao sairmos da montanha, poderemos dar em algum lugar que seja muito alto em relação ao solo. Pode ser que saiamos em um ponto tão alto em relação ao solo do novo mundo que não conseguiremos ver abaixo dos nossos pés, pois lá estará um precipício abrupto a nos impedirá de descer e ver o chão. Precisaremos então de olhos novos para ver o paraíso e de asas para explorá-lo. Esqueci de dizer, que quando, finalmente, saímos da montanha, sofremos uma transfiguração. Mudamos de estado e o corpo atual é descartado sem que soframos nada com isso, pelo contrário, esta mutação será plena de satisfação e júbilo.

Lembre-se contudo, só o sofrimento nos dará os olhos da consciência e as asas da liberdade para explorarmos fora da montanha. A bondade, também poderá nos ajudar neste mister, um pouco, mas não resolve tudo.

Quem acha ouro dentro da montanha e segue seu veio infinitamente, tem como recompensa, o poder temporário da montanha. O poder de comprar equipamentos que pode lhe ajudar a cavar mais rápido, contratar pessoas para escavar para você e assim achar mais ouro, mas estará condenado a esgueirar-se por dentro da montanha e perder-se. Terá atribulações para evitar que seu ouro seja roubado. Uma vez atrás do ouro, sempre atrás do ouro é a regra básica da montanha. Construirá tuneis gigantescos para abaixo da terra ou em círculos ou ainda de volta à direção inicial porém nunca em direção ao paraíso. Para retomar sua rota, terás que se desfazer de todo ouro, se desfazer de todas as máquinas e tudo que o ouro comprou e voltar a escavar com as mãos em linha reta. Só quando você escava com as mãos você escava em linha reta. Este é um outro segredo da montanha.

O problema é que tu poderás estar muito longe. O outro problema é que não terás muito mais tempo, pois poderá já estar no fim do seu ciclo na montanha. Sim, temos um tempo limitado para ficar dentro da montanha.

A busca frenética do ouro, poderá tê-lo levado a distancias enormes e assim dificilmente, você poderá atingir as paredes externas da montanha e achar o paraíso e fatalmente você perecerá com todo seu ouro, com toda sua riqueza no interior frio e úmido da montanha, sabe se lá por quanto tempo. Eternidades , talvez?

Depende de você, depende do que você quer para sua alma. Deus está te esperando do outro lado. Ele vê o que se passa no interior da montanha e dotou esta, de poderes para te ajudar, mas não resolverá seus problemas. Ele dotou algumas pessoas de caridade e também usa a ambição dos que correm atrás do ouro, para abrir-lhe oportunidades. Porém não deixe de escavar. Escave sempre! Escave a vida. Escave dentro de você mesmo. Mesmo que as mãos sangrem, escave. Mesmo que os olhos embacem, escave. Mesmo que o coração se machuque, escave. Mesmo que a vida lhe embruteça, escave. Talvez você não consiga chegar onde precisa, mas estará mais perto. Quem sabe a reencarnação não exista e não lhe dê uma outra chance de recomeçar em algum ponto, pelas mãos misericordiosas do criador da montanha?

Mas afinal, o que existe do outro lado? Bem leitor, eu ainda não cheguei lá, né. Estou aqui, no meio das rochas, escavando. As mãos doem, os olhos se embotam e eu sempre tenho a sensação de que falta muito.