IGREJA, O CORPO DE CRISTO

A volta de Jesus, aguardada ansiosamente pela igreja, é precedida de alguns acontecimentos: a restauração de todas as coisas profetizada em Atos 3:21 e o derramamento das últimas chuvas, conforme Tiago 5:7, ambas necessárias para preparar a igreja para as bodas com o cordeiro. Um dos aspectos desta restauração profetizada por Pedro diz respeito à compreensão e prática do que é a igreja, considerando que tanto em termos de visão como de prática, após o terceiro século houve um distanciamento do modelo deixado por Jesus o qual foi praticado pela Igreja primitiva. Conhecer e entender a história nos ajuda a não cometermos os mesmos erros do passado e isto vale também para a igreja, tanto que Paulo diz claramente em I Coríntios 10 que a história de Israel foi escrita para exemplo nosso, para não cometermos os mesmos erros que eles cometeram.

O que podemos aprender com o exemplo da história de Israel? Passagens como a saída do Egito em que o povo pediu para Arão fazer um “deus“ para eles a semelhança dos deuses do Egito e do episódio que o povo rejeitou o governo de Deus sobre eles, tendo pedido a Samuel que ungisse um rei para Israel mostram um desejo de seguir o modelo e prática das outras nações. Além destes, existem muitos outros exemplos de desvios da vontade de Deus nas escrituras, fruto do convívio muito estreito do povo de Deus com o paganismo.

Mas o que tem isto tem a ver conosco? Tudo, pois Paulo está escrevendo “para exemplo nosso” na sua carta aos Coríntios e destaca o perigo da idolatria, algo aparentemente tão óbvio, mas se atentarmos às escrituras a maior parte dos desvios de Israel e também os nossos são sempre em questões aparentemente óbvias, por isto a necessidade de restauração e para restaurar se faz necessária uma visão clara, que Deus providenciou através do ministério profético e quando este não era ouvido havia disciplina; o silêncio ou o afastamento da presença de Deus.

Jesus disse: “Pois também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do hades não prevalecerão contra ela;” Mt 16:18. Duas vezes Jesus falou sobre a igreja; aqui nesta passagem e em Mt 18:17. Igreja (Ekklesia) significa no original “reunião de cidadãos chamados para fora de seus lares para um lugar público”, é uma assembleia em sentido geral, refere-se às pessoas e não a um local. Jesus ao se referir à comunidade dos discípulos escolhe uma palavra que trás em si um sentido dinâmico e vivo, nunca antes utilizada e encontrada fartamente em Atos dos apóstolos e nas cartas de Paulo, que define a igreja como o corpo de Cristo (Col 1:24). Este conceito era novo para os primeiros discípulos de Jesus. A questão do “local de culto” estava tão enraizada em suas vidas que a primeira coisa que lhe perguntaram foi: “onde assistes” (Jo 1:38), indagando quanto ao lugar em que ele ensinava. Até mesmo a mulher samaritana o questionou sobre o lugar correto para adorar a Deus (Jo 4:5-24). Jesus não tinha um endereço fixo, primeiramente os levou para onde estava morando e depois para todos os lugares, nas casas e na rua (At 10:38). Diferente dos Judeus que mantinham nas sinagogas um lugar específico, onde apenas os homens se reuniam para ofertar, fazer orações e ler as escrituras. As sinagogas foram criadas durante o período do cativeiro na Babilônia para suprir esta necessidade em razão do distanciamento do Templo, mas mesmo depois de sua volta a Jerusalém elas faram mantidas.

Jesus em todo seu ministério nunca definiu um lugar para estas atividades. A principal característica da igreja está presente na própria palavra Ekklesia através da preposição Ek, que significa “para fora”. Mesmo depois do revestimento dos discípulos pelo Espírito e o grande mover que vemos em Atos o qual resultou em um crescimento numérico expressivo da igreja, nunca os apóstolos se preocuparam em buscar um local fechado para seus encontros e muito menos chamaram algum local de igreja. Muito possivelmente este erro vem de um equivocado entendimento de algumas passagens de Atos, onde diz que a igreja se reunia no templo e de casa em casa. Se aplicarmos ao pé-da-letra esta passagem, concluímos que a igreja primitiva tinha um templo para seus encontros. Tem-se que considerar que o templo a que estas passagens se referem é o Templo de Salomão, mais especificamente ao pórtico (ou alpendre) de Salomão (At 5:12), mesmo local onde Jesus andava para estar com o povo. Ou seja, a igreja (comunidade de discípulos) se reunia em um local público (átrio do templo) e de casa em casa seguindo os mesmos passos de Jesus (Jo 10:23).

“É necessário, pois, que, dos homens que nos acompanharam todo o tempo que o Senhor jesus andou entre nós,” At 1:21

O TABERNÁCULO E O TEMPLO

Quando Deus quis confirmar sua aliança com Israel pediu para Moisés lhe construir uma moradia (tabernáculo - Ex 25:1-9) tendo especificado uma relação de materiais que deveriam ser ofertados e forneceu a “planta” da obra para Moisés quando lhe mostrou o modelo no monte. O tabernáculo era inovador, não possuía materiais normalmente utilizados nos cultos pagãos, sua estrutura era leve, simples e móvel, própria para um povo peregrino. O templo foi um desejo de Davi não compartilhado por Deus (II Sm 7:1-17), pois a verdadeira moradia permanente de Deus seria estabelecida apenas com Jesus, o qual foi falado profeticamente nesta passagem.

O tabernáculo nasceu do coração de Deus e tipifica muito mais a igreja do que o templo. O tabernáculo é celestial, o templo é terreno (Ap 15:6; 21:1-3). O tabernáculo é móvel, o templo é estático. Somos peregrinos nesta terra como Israel, nosso reino não é daqui (Jo 18:36). Israel tinha como alvo chegar à Canaã e o tabernáculo os acompanhavam, nós também temos um caminho e um alvo para alcançar, que é Cristo e isto exige simplicidade e mobilidade. Quando a nuvem (Deus) se movia o tabernáculo de movia. Quando Ele se move, nós devemos nos mover também, o tabernáculo vai atrás da nuvem e não o contrário.

A visão celestial de Paulo deu a ele uma percepção única sobre a igreja, o mistério de Deus, compartilhada em seus escritos conosco. Para Paulo, igreja é o corpo de Cristo, congregado em uma determinada cidade ou casa, é a união de judeus e gentios:

“para que, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus se torne conhecida, agora, dos principados e potestades nos lugares celestiais,” Ef 3:10

“Agora, me regozijo nos meus sofrimentos por vós; e preencho o que resta das aflições de Cristo, na minha carne, a favor do seu corpo, que é a igreja;” Col 1:24

“Saudai também a igreja que está em sua casa. Saudai a Epêneto, meu amado, que é as primícias da Acáia em Cristo”. Rm 16:5

“À igreja de Deus que está em Corinto, aos santificados em Cristo Jesus, chamados santos, com todos os que em todo o lugar invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso:” I Co 1:12

“Se, pois, toda a igreja se congregar num lugar, e todos falarem em línguas, e entrarem indoutos ou infiéis, não dirão porventura que estais loucos?” I Co 14:23

“As igrejas da Ásia vos saúdam. Saúdam-vos afetuosamente no Senhor Áqüila e Priscila, com a igreja que está em sua casa.” I Co 16:19

“Saudai aos irmãos que estão em Laodicéia e a Ninfa e à igreja que está em sua casa.” Col 4:15

“E à nossa amada Áfia, e a Arquipo, nosso camarada, e à igreja que está em tua casa:” Fil 2

“Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e orem sobre ele, ungindo-o com azeite em nome do Senhor;” Tg 5:14

A experiência prática de vida da igreja primitiva tem muito a nos ensinar sobre simplicidade. Quando lemos a passagem de Tiago vemos que ele manda chamar os presbíteros “da” igreja, hoje nós fazemos o contrário, levamos o enfermo aos presbíteros “na” igreja (edifício). Por quê? Para a maioria é por costume, infelizmente um costume adquirido desde que os cristãos abdicaram de suas atribuições determinadas por Jesus (Mc 16:18, Mt 28:18-20) e pelos apóstolos, principalmente Pedro quando chama a igreja de nação de sacerdotes: “Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz;” I Pe 2:9.

Criticamos a Israel por terem pedido que Moisés lhes desse a lei para que eles não precisassem se santificar e frustram o desejo de Deus de ter uma nação de sacerdotes e fazemos hoje o mesmo (Ex 19 e 20).

Em I Coríntios 14:23 Paulo fala da reunião da igreja num “lugar”. A ênfase é a reunião e não o lugar. Paulo não diz: “quando vos reunis no lugar tal...” ele simplesmente diz: “quando vos reunis” e passa a dar orientações que devem nortear estes encontros da igreja, sejam eles em locais abertos (ruas, praças, etc.) ou fechados (casas, escolas, cinemas, etc).

Igreja não é sinônimo de prédio!

Modernamente os evangélicos criaram diversas formas de se referir ao prédio que abriga o encontro dos irmãos: igreja, casa de Deus ou templo, todas as formas erradas pelos seguintes motivos:

IGREJA – É o corpo de Cristo, não é um local. Insistir em chamar um edifício de igreja demonstra falta de visão de que a igreja é o corpo de cristo, estabelecida por fortes relacionamentos e que se edifica a si mesmo com o propósito de formar uma grande família tendo Cristo como modelo. A igreja é a noiva, ela é que será salva e não um prédio! Sendo sabedores disto, porque continuamos a chamar nosso local de reunião de igreja? Por mera tradição, por herança religiosa.

Quando estamos reunidos em um determinado local, a igreja é o que está dentro do prédio, não é o prédio.

CASA DE DEUS – A palavra fala claramente que o Senhor está nos edificando para sua habitação em Espírito (Ef 2:22). Chamar um prédio de casa de deus é uma tentativa de santificar o local de reunião, sendo que o que deve ser santificado são as pessoas que formarão o edifício onde o Senhor vai habitar. Desvios deste tipo levam os irmãos a se preocupar mais com a cor das paredes, o conforto das cadeiras e outras peculiaridades dos prédios do que com a edificação de Cristo na vida dos irmãos que só acontece com a prática determinada por Paulo em Ef. 4:11-16. Cuidar da casa de Deus não é cuidar dos encanamentos e telhado do prédio, mas zelar pela formação de Cristo na vida dos irmãos. Possivelmente alguns desejem apenas enfatizar a presença de Deus nestes lugares, entretanto Jesus disse que onde dois ou três estivessem reunidos em seu nome ele estaria ali. É uma promessa e isto vale para qualquer lugar! Deus possui apenas uma casa, que é a sua igreja, os redimidos pelo Senhor (I Tim 3:15).

"Todavia, o Altíssimo não habita em casas feitas por homens. Como diz o profeta” At 7:48.

TEMPLO – Templo houve somente um, construído por Salomão e que substituiu o tabernáculo com todos os seus serviços sagrados. Tentar restaurar o templo e suas práticas é rejeitar a obra de Cristo na cruz e a nova aliança, é uma ofensa ao seu derradeiro sacrifício. Chamar de templo um edifício onde uma parte da igreja se congrega é ignorância, pois nada do que era feito no templo é feito hoje na igreja: o sacerdócio foi substituído, os sacrifícios foram cessados e o acesso a Deus foi aberto a todos os homens criando definitivamente a nação de sacerdotes desejada por Deus. Jesus estabeleceu a nova aliança no seu sangue, sem templo, sem locais de sacrifício, pois ele fez o último sacrifício.

”Então eu disse: Aqui estou, no livro está escrito a meu respeito; vim para fazer a tua vontade, ó Deus. Primeiro ele disse: "Sacrifícios, ofertas, holocaustos e ofertas pelo pecado não quiseste, nem deles te agradaste" ( os quais eram feitos conforme a Lei ). Então acrescentou: "Aqui estou; vim para fazer a tua vontade". Ele cancela o primeiro para estabelecer o segundo. Pelo cumprimento dessa vontade fomos santificados, por meio do sacrifício do corpo de Jesus Cristo, oferecido uma vez por todas. ...porque, por meio de um único sacrifício, ele aperfeiçoou para sempre os que estão sendo santificados” Hebreus 10:14Hebreus 10:7-10,14

Apesar de sabermos que Jesus e os apóstolos não estabeleceram lugares fixos especiais para os encontros dos irmãos, é pecado existir um local assim?

Não, se a existência de lugares fixos, sejam próprios ou alugados, não induzir o povo a abdicar de suas responsabilidades sacerdotais, que pode ser resumida no serviço comum a todos os santos de serem testemunhas e edificadores da igreja, formando uma família de muitos filhos semelhantes a Jesus, conforme Paulo fala em Rm 8:28-29 e Ef 4:11-16.

Sim, se forem reservadas para estes lugares a prática de certas liturgias consideradas “especiais”, que somente podem ser “ministradas” pelo “clero da igreja” e não pelos leigos. Este pensamento não encontra correspondência em nenhum lugar das escrituras, especialmente na passagem de I Co 14:23-40, ele é fruto da reintrodução do sacerdócio no modelo levítico dentro da igreja que criou duas categorias de irmãos: o clero e os leigos, resultado da doutrina dos nicolaitas e judaizantes que se infiltraram desde cedo na igreja e que foi alvo das advertências do Senhor nas cartas às igrejas em Apocalipse.

Séculos de erro são difíceis de serem percebidos e mais difíceis ainda de serem corrigidos, pois nos apegamos com facilidade a zona de conforto do “sempre foi assim” e a única solução dada por Jesus é: “Lembre-se de onde caiu! arrependa-se e pratique as obras que praticava no princípio. Se não se arrepender, virei a você e tirarei o seu candelabro do lugar dele” Ap 2:5. Que o Senhor nos encontre abertos para as correções que ele quer fazer na igreja, sob pena dele passar para outro aquilo que ele não conseguir concluir através de nós.

“Mas receio que, assim como a serpente enganou a Eva com a sua astúcia, assim também seja corrompida a vossa mente e se aparte da simplicidade e pureza devidas a Cristo.” II Cor 11:3

CARLOS A S SILVA
Enviado por CARLOS A S SILVA em 08/11/2018
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