A CONTRIBUIÇÃO DA PSICANÁLISE NA CLÍNICA PASTORAL (PARTE V)

Atualmente, mais do que em qualquer outra época, a escuta psicanalítica precisa vincular-se às questões trazidas pelo paciente. Em última análise, este busca a felicidade, a todo e a qualquer custo. Ser feliz sempre foi um desejo comum a todos os humanos em todas as fases da história da civilização. No entanto, na era em que vivemos, a conhecida pós modernidade, esse ideal parece estar cada vez mais evidente. A sociedade de nossos dias quase que obriga o indivíduo a ser e a viver feliz. Lopes (2013)* chama isso de “ideal ilusório de completude” e diz que, nessa busca, as pessoas infelizes são levadas a se portarem como se fossem felizes, ainda que, para isso, elas tenham que mascarar o desprazer, lançando mão de objetos transitórios que são ofertados como promotores de felicidade.

Freud (1996b, p. 73)**, no início do seu texto “O Mal-Estar na Civilização”, escrito numa época ainda bem distante da nossa, já registrara ser “impossível fugir à impressão de que as pessoas comumente empregam falsos padrões de avaliação”. Hoje, essa situação é perceptivelmente mais grave. Lopes (2013) confirma essa assertiva, ao concluir que os conceitos de felicidade e bem-estar são, em alguns casos, posições desarmônicas, mascaradas.

Tal inversão conceitual exige um preço elevado dos indivíduos. Alguém já disse que o ser humano da sociedade capitalista acaba por ser uma expressão da classe dominante, a burguesia, sendo constrangido a existir de acordo com os interesses dela. Ora, se é assim, requer-se das pessoas que elas anulem suas próprias carências, que são normais e legítimas, e passem a adotar um padrão exterior, de alienação.

Não é sem razão, portanto, que jamais se viu tanta gente sofrendo de depressão. Mendlowicz (2009)***, em suas investigações sobre a depressão na sociedade contemporânea, descobriu que várias pesquisas e inúmeros autores concordam que a depressão se tornou o mal maior da sociedade contemporânea. Muitos deles ponderam que isso se deve, em grande parte, às exigências da sociedade contemporânea industrializada, que provocam sério empobrecimento emocional e ético dos indivíduos. Por isso, eles dizem, o homem moderno está mais sujeito a colapsos psíquicos, depressões e fracassos que o do passado.

Por sua própria origem, a Psicanálise se interessa pela etiologia desses males psíquicos. Daí sua investigação dos possíveis vínculos sociais com a sintomatologia do indivíduo. É preciso levar em conta, na análise do sujeito, seus mitos, sua religiosidade ou a falta dela, suas práticas e valores sociais e o quanto tudo isso afeta seus estados emocional e psíquico. De fato, somos marcados pelos problemas, pelas práticas e pela situação do mundo em que estamos inseridos. Referenciando Freud, Mendlowicz (2009)*** registra que ninguém é excluído de seu mundo.

Nesse contexto, o papel da Psicanálise é, não somente compreender as diversas fontes de doença psíquica das pessoas, mas levá-las a descobrir como conviver de forma saudável com as recentes mudanças à sua volta. Mendlowicz (2009)*** diz que a urbanização, a mobilidade geográfica, a mudança nos papéis sexuais e a desestruturação familiar são alguns dos fatores que muitos autores citam para justificar o aumento do desequilíbrio psíquico e da depressão. Ora, se o ser humano moderno é afetado por esses e tantos outros elementos e se angustia por não poder mudá-los, há de encontrar, pelo menos, um modo de transitar entre eles sem se machucar ou se ferindo o mínimo possível. Ajudar nesse processo é função da Psicanálise atualmente.

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* LOPES, Bruno César Oliveira (2013). A Busca da Felicidade e o Bem-Estar no Mundo Pós-Moderno. Disponível em: https://psicologado.com/abordagens/psicanalise/a-busca-da-felicidade-e-o-bem-estar-no-mundo-pos-moderno. Acesso em 08.11.2015.

** FREUD, S. (1927-1931). O futuro de uma ilusão, o mal-estar na civilização e outros trabalhos. Obras Completas, Ed. Standard Brasileira, vol. XXI, Rio de Janeiro, Imago, 1996b.

*** MENDLOWICZ, Eliane (2009). A sociedade contemporânea e a depressão. Disponível em: http://www.uva.br/trivium/edicao1/artigos-tematicos/4-a-sociedade-contemporanea-e-a-depressao.pdf. Acesso em: 11.11.2015.

José Graciano Dias
Enviado por José Graciano Dias em 14/03/2019
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