A necessidade missionária habita o âmago da vida cristã. Partimos do pressuposto que aqueles que fizeram uma verdadeira experiência de Cristo, não a podem conter, isto é, um dos frutos de encontrar Jesus é um transbordar, um desejo insaciável de que o mundo o conheça, que todos possam também encontra-lo e se sentir amados por Ele. No entanto, um grande problema se interpõe: a quem vamos anunciar? De onde partir? Quem realmente precisa? No afã de evangelizar, muitos se perderam, quiseram anunciar o Cristo, mas pararam de beber na fonte, isto é, não o encontraram mais, não o buscaram mais, e assim, seu testemunho se tornou vazio. Quando se trata de anunciar o Evangelho é preciso ter uma consciência muito clara de que Ele é ao mesmo tempo o ponto de partida, o caminho, e o objetivo. Quem o esquece em alguma dessas etapas, talvez nunca o tenha encontrado. Há, no Evangelho, três imagens que delineiam bem o perfil daqueles que, pelo chamado e pela experiência querem anunciar o Cristo: o pastor, o semeador e o pescador.

A primeira imagem, do Pastor narrada por João, apresenta a importante ideia da relação que existe entre o pastor e as ovelhas: “Eu sou o bom pastor; conheço as minhas ovelhas e as minhas ovelhas me conhecem, como o Pai me conhece e eu conheço o Pai. Eu dou a vida pelas minhas ovelhas. Tenho ainda outra ovelhas que não são deste redil: devo conduzi-las também; elas ouvirão a minha voz; então haverá um só rebanho, um só pastor.” (Jo 10, 14-16). O Evangelho de Cristo não deve ser anunciado apenas para aqueles que ainda não o conhecem. O Evangelho é uma fonte inesgotável do amor de Deus, voltar a ele é uma necessidade vital. A imagem do pastor nos recorda que aqueles que já conhecem Cristo, bom e belo pastor, também precisam de sua presença, precisam constantemente de seu cuidado, e é por eles que se deve começar. Há uma tentação muito grande de reduzir o espírito missionário a sair em sentido geográfico para anunciar o Evangelho, e muitas vezes, saindo, esquecemos de oferecer o alimento aos que já são nossos. O pastor tem consciência de que há ovelhas fora do redil, e que elas lhe pertencem, mas nem por isso abandona aquelas que já estão junto dEle. A missão que Cristo nos confia, portanto, de anunciar a sua Boa Nova, começa com aqueles que são nossos, dentro de casa, dentro da Igreja, com aqueles que creem como nós.

A segunda imagem, do Semeador, nos é apresentada em forma de parábola no Evangelho de Mateus: “Eis que o semeador saiu para semear. E ao semear, uma parte da semente caiu à beira do caminho e as aves vieram e a comeram. Outra parte caiu em lugares pedregosos, onde não havia muita terra. Logo brotou, porque a terra era pouco profunda. Mas, ao surgir o sol, queimou-se e, por não ter raiz, secou. Outra ainda caiu entre os espinhos. Os espinhos cresceram e a abafaram. Outra parte, finalmente, caiu em terra boa e produziu fruto, uma cem, outra sessenta e outra trinta.” (Mt 13, 3b-8). Este segundo passo nos mostra um outro aspecto da missão cristã, a necessidade de sair pelo caminho. A existência do caminho nos diz que ali Cristo já é conhecido, e os diversos ambientes denotam a realidade do coração das pessoas que, embora conheçam Cristo ainda não se despertaram para a necessidade de pertencer a Ele. É tarefa do missionário lançar sementes, independente do terreno, não cabe a nós definir quem é ou não digno de receber a semente do Evangelho. Ao missionário semeador cabem duas atitudes: testemunho de vida, pois Ele já pertence a Cristo; e esperança de que suas sementes encontrem solo fértil no coração das pessoas. Não depende de nós que a missão seja bem sucedida, apenas cabe a nós exerce-la de modo autêntico: “Acontece com o Reino de Deus o mesmo que com o homem que lançou a semente na terra: ele dorme e acorda, de noite e de dia, mas a semente germina e cresce sem que ele saiba como. A terra por si mesma produz fruto: primeiro a erva, depois a espiga e, por fim, a espiga cheia de grãos. (Mc 4, 26-28). Ser missionário semeador, é em suma, permitir que Deus haja na vida das pessoas, é tornar-se ponte que revela o amor inesgotável de Deus por todos nós.

Por fim, a terceira imagem, do Pescador, narrada especialmente no chamado que Jesus faz aos primeiros discípulos: “Estando ele a caminhar junto ao mar da Galileia, viu dois irmãos, Simão, chamado Pedro, e seu irmão André, que lançavam as redes ao mar, pois eram pescadores. Disse-lhes: ‘Segui-me, e eu farei de vós pescadores de homens.’ Eles, deixando imediatamente as redes, o seguiram.” (Mt 4, 18-20). A figura do pescador carrega dois importantes aspectos missionários: entrar no mar e pescar homens. O mar é o lugar do desconhecido, simbolicamente é o lugar do caos. Ser missionário no mar é ir até aqueles que ainda não tem consciência da existência de Deus. Pescar, é importante lembrar q a pescaria leva à morte, tirar um peixe de seu ambiente vital o mata, e é justamente isso que o pescador de homens deve fazer: matar. Pescar homens, sob a orientação de Jesus significa matar o homem velho, que ainda não tem consciência do amor de Deus, para que possa, dessa morte nascer um novo homem, um homem que viva para Cristo. A outra narrativa do chamado dos pescadores, no Evangelho de Lucas nos revela atitudes muito importantes: “Quando acabou de falar, disse a Simão: ‘Faze-te ao largo; lançai vossas redes para a pesca’ Simão respondeu: ‘Mestre, trabalhamos a noite inteira sem nada apanhar; mas, porque mandas, lançarei as redes’. Fizeram isso e apanharam tamanha quantidade de peixes que suas redes se rompiam [...] Jesus, porém, disse a Simão: ‘Não tenhas medo! Doravante serás pescador de homens’. Então, reconduzindo os barcos à terra e deixando tudo, eles os seguiam.” (Lc 5, 4-6.10-11). A atenção à Palavra de Jesus, o pescador precisa ter consciência de quem é Aquele que guia o barco, quem é Aquele que sabe onde pescar. Além disso, a constante presença de Cristo deve ter em nós a força de afastar o medo, acalmar as águas impetuosas, atingir o nosso coração. Para que o pescador não seja apenas aquele que leva à morte o homem velho, mas dê testemunho da vida nova. Em suma, para ser pescador é preciso antes ter sido pescado, encontrado, fisgado, apanhado, pelo Cristo.

Compreendemos assim que o mundo todo é lugar da nossa missão, todos, absolutamente todos ainda precisam de um encontro pessoal, íntimo e transformador com Jesus. Nunca nos esqueçamos de que: é o próprio Cristo que vai à frente na missão, é Ele mesmo a mensagem da nossa missão, é Ele mesmo o caminho que devemos tomar para anunciar a Boa Nova, e por fim, é Ele também a fonte e a meta da missão: dEle partimos e para Ele nos dirigimos.

 

Referência:

BÍBLIA DE JERUSALÉM. 1ª Ed. 9ª reimpressão. São Paulo: Paulus, 2002.

Abra a Porta e Hiago Fonte Boa
Enviado por Abra a Porta em 25/01/2022
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