Combustão Humana Espontânea

"Alguém que persevera em suas investigações se verá obrigado mais cedo ou mais tarde a mudar de método."
GOETHE (1749-1832)

     A autocombustão de seres humanos ainda é um mistério secular. Existem inúmeras referências históricas a respeito de tais trágicos episódios. Até mesmo um livro foi publicado sobre o assunto, reconhecendo a existência de tão estranha doença. Em seu livro "Combustão Humana Espontánea: Estudo Definitivo Documentado com Fotos" de Jenny Randles e Peter Hough, os autores compilam uma lista de 111 casos registrados desde 1613 até os dias atuais. Um outro especialista, Larry E. Arnold, afirmou que os casos arquivados em seu computador já passam de 300.
     O incidente clássico de combustão humana acontece da seguinte maneira: a vítima, sem nenhuma razão plausível, pega fogo e queima em uma surpreendente chama azul, que reduz o corpo e os ossos a cinzas, mas não incendeia objetos próximos. Quando isto acontece dentro de uma casa, como na maioria dos casos, o fogo sempre deixa uma repugnante névoa azul.
     Em tempos mais sombrios, a combustão espontânea foi considerada o castigo pelos vícios, especialmente o da bebida. Mas em 1851, o Barão J. von Liebig derrubou esta teoria, mostrando que quando se injeta álcool em ratos e se ateia fogo, eles não pegam fogo de forma mais eficiente do que os ratos não-alcoolizados.
     As pessoas que mais provavelmente sofrem deste problema são mulheres obesas, com 70 anos ou mais, que vivem sozinhas. Pelo menos esta é a imagem que se faz dos casos relatados por Randles e Hough, no livro citado. Mas lembre-se: esses números são muito inexpressivos para se tirar uma conclusão estatística significativa.
      O horário mais provável para ocorrer a combustão humana é entre meia-noite e 6 horas da manhã. Existem três causas principais para o incêndio espontáneo. Seus intestinos, que frequentemente produzem o gás metano, podem também produzir fosfina, um gás que inflama-se espontaneamente em contato com ar.
A ocorrênccia de eletricidade estática, gerando eletrólise, é outra explicação, bem como um choque com uma partícula subatômica, que desencadearia uma reação em cadeia dentro de você.
     É verdade que nunca foi provado que a combustão espontánea realmente acontece. Mas também ninguém nunca provou que não acontece.
     O mais famoso caso de combustão humana ocorreu com Mary Reeser, de 67 anos, habitante de São Petersburgo, em 1º de julho de 1951. Seu filho, Richard, disse que na última vez que viu sua gorducha mãe, ela estava sentada em sua cadeira favorita, fumando um cigarro. Na manhã seguinte, tudo o que sobrou foram cinzas, fragmentos de ossos e dentes e um pé dentro de um chinelo.
     Algumas pessoas levantaram na época a hipótese de que ela havia sido incendiada pelo fogo de seu cigarro. Se isso fosse verdade, por que os crematórios precisariam gastar tanto dinheiro em equipamentos? Bastaria um cigarro.
Larry Arnold garante que uma pessoa pode pegar fogo em seis minutos, mas reconhece que a probabilidade de isso acontecer é menor do que a de ser atingida por um raio.
      No século passado, o Diccionario de Medicina Popular e das Ciencias Acessorias do Dr. Pedro Luiz Napoleão Chernoviz, publicado em Paris, em 1878, já na 5ª edição, em livro muito utilizado pela classe médica da época, já registrava inúmeros episódios de combustão humana espontánea. Entretanto nas sucessivas edições do famoso dicionário, o verbete sobre esta estranha doença, foi retirado, talvez, para evitar o ridículo a que os médicos ficavam expostos, ao referir-se a tal doença.
      Citamos abaixo o texto integral da página 647 do Dicionário Chernoviz:
      "Certo número de fatos bem observados provam de maneira inquestionável que algumas pessoas tem sido destruídas pelo efeito de um fogo, cuja natureza e origem não estão ainda bem determinadas. Estas pessoas viram declarar-se a combustão de seus próprios corpos pela vizinhaça de uma substáncia acesa, ordinariamente pouco ativa, uma vela, um candieiro, um cachimbo, etc. Ardia o corpo humano em uma chama azulada, que a água, em vez de apagar, aumentava mais. Depois da combustão ficaram alguns lugares em parte queimados e torrados, os outros foram inteiramente consumidos, reduzidos a cinzas, não deixando outro resíduo senão uma matéria gorda, fétida, e uma fuligem de cheiro penetrante. Enquanto o corpo ardia, os objetos que o cercavam eram apenas prejudicados, e até em alguns casos não se consumia a roupa. Estes fatos são tão extraordinários, que por muito tempo não se lhes deu crédito, e eram considerados como histórias inventadas. Hoje já não se duvida deles, porque existem casos observados por pessoas dignas de confiança. Eis aqui alguns exemplos extraidos dos autores:
Maria Bertholi, padre, tendo feito grande exercício no decurso do dia, deitou-se muito cansado; passou um lenço por entre os ombros e a camisa, e, quando todas as pessoas se retiraram, principiou a ler o seu breviário. Alguns minutos tinham apenas decorrido, quando se ouviu do seu quarto um estrondo extraordinário, acompanhado de gritos. As pessoas de casa que lhe acudiram acharam o padre estirado no chão e cercado de uma pequena chama, que se afastava pouco a pouco, e que enfim desapareceu. O braço direito e toda a parte direito do tronco ficaram profundamente desorganizados. O doente morreu no quarto dia. Disse, antes de expirar, que tinha sentido como uma pancada de bengala sobre o braço direito, e que ao mesmo tempo vira uma faísca sobre a camisa, que foi instantaneamente reduzida a cinzas, sem que o fogo atacasse os punhos. O lenço entre a camisa e a pele conservou-se em toda a sua integridade, e, sem o menor vestígio de queimadura. O barrete ficou inteiramente consumido, sem que entretanto um só cabelo fosse queimado. Não se sentia cheiro algum de chamusco no quarto, não se percebia fumaça; só o candieiro, antes cheio de azeite, estava vazio, e a torcida em estado de incineração.
     Em 1765, a Condessa Cornelia Bandioli, de 62 anos de idade, que tinha por costume lavar-se com aguardente canforada, foi achada queimada fora de sua cama. Provou-se que não foi o fogo que ocasionou este acidente; a luz que estava no seu quarto ardeu até o fim, e as torcidas estavam ainda nos candieiros. O quarto desta senhora, no qual a combustão se havia operado espontaneamente, ficou cheio de fuligem úmida cor de cinza, que penetrou nos armários, e sujou a roupa.
A Sra. Boison, de 80 anos de idade, pouco mais ou menos, muito magra, e que bebia muita aguardente, havia alguns anos, estava sentada em sua cadeira ao pé do fogo. A sua criada ausentou-se por alguns momentos, e quando voltou viu-a toda inflamada; grita e acodem algumas pessoas. Um indivíduo quer apagar o fogo com a mão e a chama se lhe pega, como se a mão estivesse impregnada de aguardente ou de azeite inflamado. Deitaram água sobre a senhora, mas o fogo aumentou, e não se extinguiu senão quando todas as carnes ficaram consumidas. O esqueleto, muito negro, conservou-se na cadeira, a qual apenas ficou denegrida.
     Estes exemplos bastaram para dar uma idéia do fenômeno tão extraordinário das combustões humanas espontáneas. Estes acidentes mui raros, foram observados quase sempre em indivíduos de idade avançada. A gordura parece favorecê-los, se bem que haja observações de indivíduos magros que foram deles acometidos, e especialmente, a sra. Boison estava neste caso. As mulheres velhas estão muito mais expostas a serem assim consumidas do que os homens; sobre vinte e oito casos bem provados, havia vinte e seis mulheres. O abuso dos licores fortes predispõe especialmente a esta afecção. Com efeito, quase todas as pessoas mortas vítimas de combustões espontáneas, entregavam-se à mais furiosa embriaguez, e apenas se achariam nesta regra geral, uma ou duas exceções concludentes. O maior número de todas estas pessoas impregnadas de álcool foram encontradas perto de um fogo ainda ardente ou mal extinto. Pensa-se, por conseguinte, que o uso imoderado dos licores e da aguardente pode predispor às combustões humanas, e que o contato de um corpo aceso é suficiente para a produção deste fenômeno. Tal é a opinião geral. Há entretanto médicos que julgam que a combustão só depende de causas internas: admitem que gases inflamáveis podem desenvolver-se no corpo e acumular-se no tecido celular, o qual, sendo eminentemente combustível, é capaz de inflamar-se em consequência de um exercício violento, ou de qualquer outra causa própria a determinar uma faísca elétrica. Esta explicação porém tem poucos partidários.
      Qualquer que seja a teoria das combustões espontáneas, o conhecimento deste fato inspirará um receio justo e salutar, capaz de afastar alguns infelizes do vício da embriaguez.
      O preservativo mais certo, que se possa opor ao desenvolvimento desta horrível moléstia, é uma vida sobria, regular, isenta de todo o excesso. O remédio de que se deve lançar mão, se ela se manifestar por desgraça, é a aplicação constante de um pano molhado, a fim de impedir o contato com o ar."

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Bibliografia:

1) Jornal do Brasil - Rio de Janeiro - 06/11/1994

2) CHERNOVIZ, Pedro Luiz Napoleão:
1878 - Diccionário de Medicina Popular e das Sciencias Acessorias para Uso das Famílias - 5ª Ed. - Casa do Autor - Paris - France