Metanálise Tridimensional: Wundt e a normatização da loucura. (para ler ao som de Die Zauberflöte)

Qualquer estudioso minimamente comprometido com a verdade sabe que atribuir a Wundt a paternidade da Psicologia é no mínimo uma atitude irresponsável e burra. Infelizmente vivemos a era dos "papagenos" que seguem a repetir qualquer bordão irrefletidamente por algumas porções de bolachas açucaradas.

Ao som da flauta de Pam, iludidos por promessas de prestígio e reconhecimento, e orientados por ideais acatolíticos¹, os profissionais da área submeteram a psicologia, - tal qual fazem aqueles adolescentes provincianos que se revoltam com o pai e a mãe crentes da Deus é Amor -, imergindo suas consciências juntamente com ela, na negação do homem espiritual, no ateísmo, no relativismo e no materialismo absoluto².

Incapazes de enxergar no humano a sua dimensão noética, salvo raras exceções, psiquiatras e psicólogos de todo o mundo, caminharam felizes e saltitantes rumo ao jardim das aflições de Epicuro³, como consequência rebaixando o homem ao nível da instância mental inferior. Não assusta o fato de que as definições de saúde saiam ao modo hedonista associadas a um "estado de bem estar" ⁴.

Fato é que enquanto matéria desprovida de Sentido, qualquer psicoterapia entra em parafuso. - Se você é ou foi aluno de Psicologia, já experimentou perguntar àquele seu professor o que é Psique? (risos) -. Um segredo, cá entre nós, quando desconsideramos o homem superior, intelectual, o homem que está acima da instância da razão instrumental, somente o que sobra é o modelo de Descartes, e dado que a impossibilidade de uma definição satisfatória de saúde mental está implícita na própria condição humana, - sendo a dimensão noética aquela mais abrangente e única que abarca o ser humano e o afeta integralmente - , a tendência é o "efeito torre de babel", ou seja a Psicologia contemporânea cair na fragmentação e na "confusão de línguas".

Uma definição precisa de saúde mental não existe sem uma visão de homem integral. Ao visar a saúde mental o psicoterapeuta deve reportar-se à totalidade humana, sendo necessariamente dependente de uma antropologia geral, de uma visão de homem ideal e d'uma cosmovisão de orientação metafísica, que o permita a direcionar a prática a um fim, um bom fim, logo, devendo se conduzir também por, e buscar reger-se por uma Ética.

Podemos dizer que terapia alguma encontra razão de ser sem os universais ⁵ . Quem se extravia, só pode fazê-lo em face de um Norte, de maneira que só é possível falar em alienação quando admitimos, primeiro uma essência transcendente ou núcleo de personalidade. Da mesma maneira que um caminhante sem destino não pode dizer-se fora de rota, também o homem não pode perder-se ou achar-se senão em face de uma verdade, não inventada, mas encontrada.

Se não há um "bem, um bom, um belo" ou, sequer um "verdadeiro", ou se caímos num relativismo absoluto optando por viver a vida como feras amorais em busca de prazer. E se não existe parâmetro que nos permita apontar o louco, então somente o que temos a fazer é prender quem tente encontrar algum sentido, e por outro lado entregar qualquer indivíduo sintomático à uma distopia das drogas da felicidade, algo a lá Aldous Huxley em seu Admirável Mundo Novo. Se há alguma esperança para a Psicologia, para que ela não sucumba a uma normatização da loucura ou a uma farmacologia psiquiátrica é a proposta de retorno à uma Psicologia da Alma.

Nota do Autor

Como no Brasil é preciso desenhar e explicar o desenho, em suma eu diria que redijo o texto como uma crítica à irreflexão sobre o tema da negação metafísica promovida por certos nichos da comunidade médica e dos psicólogos. O que faz a psicologia e psiquiatria é comparável e pode vir a nos encerrar sob uma distopia semelhante a de Huxley. Dado que atualmente a Psicologia se baseia numa visão positivista e cartesiana de homem, atribuindo paternidade da área erradamente a Wundt, o que se acaba fazendo é reduzir o homem a um conjunto de estímulos e respostas, ignorando assim a dimensão espiritual e transcendente da existência. O estreitamento da visão sobre a ontologia humana leva a medicalização e a uma consequente normatização da loucura. Dado que o desligamento para com a metafísica e a filosofia trás consigo a perda dos ideais, dos transcendentais fornecidas desde a cosmovisão anterior (aristotélica-tomista), a perda dos valores tradicionais, o que empurra a normalidade para a margem da cultura. Como a concepção de normalidade é estabelecida com base na "moda" - embora não o seja -, o resultado é que a busca do bom, do belo, do justo, do verdadeiro passam a ser tomados como uma anomalia a ser corrigida ou eliminada em nome de uma suposta "normalidade" e adaptação social (um novo normal). Em qualquer outra era isso não seria sustentável, todavia a crise se aprofunda quando os sintomas do desvio são silenciados pela via medicamentosa tal como em "O Admirável Mundo Novo" onde os indivíduos são condicionados desde o nascimento a se confirmarem com um sistema totalitário e alienante, que os priva de sua liberdade e criatividade. A proposta é a metanálise como alternativa à barbárie, oferecendo uma cosmovisão que busque conciliar o tradicional com os avanços tecnológicos e científicos, tendo como fundamento uma antropologia do homem total que valorize a intuição, a fenomenologia e a integração dos aspectos emocionais, mentais e espirituais do ser humano. A normalidade não é exatamente uma convenção coletiva, social, mas um modo de viver equilibrado, que coloca em harmonia todos os pólos da pessoa, ao mesmo ético, moral, espiritual, científico, social, etc. O metanalista deve suportar os paradoxos da realidade com muita persistência não se precipitando numa solução unilateral. É esse o enigma humano por excelência, montar as peças do eu individual no quebra cabeças do eu social e vice-versa, portanto, o terapeuta tridimensional deve buscar compreender e respeitar a diversidade humana, considerando a singularidade da essência de cada pessoa e as dificuldades que cada um enfrenta no processo de amadurecimento junto ao meio social. A Metanálise é sobretudo uma prática que busca a eudaimonia, ela celebra a liberdade, a harmonia e a iluminação do ser humano.

1- De recusa da ordem geral e do transcendente. ver Constantin Noica (As 6 doenças do Espírito Contemporâneo);

2- Como é o caso do existencialismo de Sartre, o Behaviorismo Radical de Skinner e muitos outros;

3- Ver o Jardim das Aflições de Olavo de Carvalho

4- “Saúde mental tem a ver com o bem estar físico e psíquico, mas também tem a ver com o bem estar social."

5- Uma Forma de homem, no sentido Platônico, uma ideia de Bom, de Belo e de Verdadeiro.

Yuri Mc Murray
Enviado por Yuri Mc Murray em 21/07/2023
Reeditado em 22/07/2023
Código do texto: T7842406
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