QUANDO A MONTANHA REMOVE A FÉ!

QUANDO A MONTANHA REMOVE A FÉ!

J.B.Xavier

Morris West em seu romance O Verão do Lobo Vermelho escreveu: “Quem já esteve lá, sabe como é; quem nunca esteve, não tem a menor idéia de como é a geografia do País do Amor.”

Faço minhas as palavras de West, mas as coloco em outro contexto:

“Quem esteve lá, sentiu nas próprias veias o pulsar de um país gigante adormecido, acordando de um sono de secular, preparando-se para o século XXI. Quem não esteve, não tem a menor idéia de como era o Brasil dos Anos Sessenta.”

De um lado, Caetano Veloso cantava, misturando o espanhol e o português demonstrando as afinidades com os regimes de esquerda que dominavam a América Latina.

“Soy loco por ti, América,

soy loco por ti amores”.

E acrescentava ao seu grito de liberdade:

“Antes que a definitiva noite se instale em Latinoamérica, el nome del hombre es pueblo.”l

Do outro, Don e Ravel ecoavam, num tom claramente nacionalista:

“Eu te amo, meu Brasil, eu te amo!

Meu coração é verde, amarelo, branco, azul anil.”

Caetano, Chico, e a maioria dos artistas e intelectuais brasileiros, entraram na onda “chic” de execrarem a ordem estabelecida e, através de ações revolucionárias, estabelecerem uma nova ordem social, na época cristalizada pelos regimes socializantes, tendo o comunismo como exemplo.

Nunca Marx foi tão comentado e tão pouco lido, e, lido, tão pouco compreendido.

Anos mais tarde, um dos homens que ajudou a “mudar o Brasil” fundava o PT - Partido dos Trabalhadores, sobre os alicerces das idéias de uma elite intelectualóides, das grandes universidades brasileiras, especialmente da USP.

As décadas passaram, o pó do tempo encobriu as passeatas e os gritos pela liberdade. A geração que viveu esse momento tão especial do Brasil, começou a desaparecer. Mas ainda restaram alguns, como eu, cujas vozes são demasiadamente débeis para chamar a atenção, mas teimosas demais para ficarem caladas.

Por sua história, do PT se podia esperar coisas como Ingenuidade, desinformação, e até burrice. Mas nunca desonestidade. Mesmo eu, que não sou petista - mas sou brasileiro - torcia para que Lula acertasse. Debalde. No mundo globalizado da informação, não há mais espaço para retórica.

Luiz Inácio Lula Não Sei Nadinha da Silva quase convenceu o país de que estudar não é importante.

Quando ele declarou que nunca leu um livro na vida, por um triz não queimo os que tenho. Afinal, se não fizeram falta para ele, por que fariam para mim?

Por pouco o analfabetismo de sua mãe não se torna o padrão ideal para dar à luz, e por um triz ele não nos convenceu de que assumir a presidência de um país como o Brasil, era, afinal, um probleminha apenas um pouquinho maior do que negociar greves fabricadas, gritando palavras de ordem sobre um caminhão de som, no Grande ABC, em São Paulo.

Sem a menor idéia da diferença existente entre os termos “país, Estado e nação”, ele, em sua abençoada ignorância - à qual, às vezes, parece realmente grato – deixou de ler o que Winston Churchill escreveu há décadas:

“Pode-se enganar alguns durante algum tempo, mas não se pode enganar a todos o tempo todo”.

Se tivesse lido a frase do grande estadista inglês, ele provavelmente pensaria: “Mas pode-se tentar!”

Feliz por ter certeza de que a população do Brasil era apenas uma platéia ampliada dos pátios das montadoras, ele esqueceu que no exercício da presidência, não teria a seu favor uma fábrica parada, cujo prejuízo forçava o acordo.

E assim, jogando com cartas marcadas, ele foi construindo a imagem de líder, de negociador, sem ter a menor noção do que essa palavra implica.

Encantadas com o discurso populista, algumas trupes pseudo-intelectuais,encasteladas nas torres de marfim das universidades, distantes do exercício real e cotidiano de governar um país, passaram a considerá-lo carismático, esquecendo, também elas, que esse termo implica no conjunto de habilidades sustentadas de encantar, seduzir e despertar a aprovação e a simpatia das massas.

Por um triz, Lula não preenche esses requisitos.

Através de observações no ABC e da prática recorrente e constante de incitações de metalúrgicos à paralização, ele foi aprendendo, adquirindo e desenvolvendo a habilidade de encantar e seduzir. Mas esqueceu da palavra “sustentadas”.

E foi aí que novamente o vácuo de sua formação – do qual ele tanto se orgulha, a ponto de fazer-nos parecer idiotas por termos estudado - o impediu de ser um personagem verdadeiramente carismático e de passar à história como estadista: Faltou-lhe sustentação no discurso, que perpetuasse suas idéias e por conseguinte, suas habilidades de encantar. Leia “conteúdo” em lugar de “sustentação”, se preferir.

Sem conteúdo, suas historinhas metafóricas, utilizadas para ilustrar grandes idéias – graças às quais os pseudo-intelectuais o classificaram como grande comunicador - aos poucos foram se tornando repetitivas, até que, ao perderem o gosto de novidade, começaram a aparecer como realmente são: Mal formuladas e insípidas, ou seja, sem gosto e sem cheiro. Numa palavra: Vazias!

Não é à toa que algumas das verdadeiras cabeças pensantes do PT debandaram, como Cristóvão Buarque e outros. Eles sabiam que o partido estava criando cobras no quintal, e não tonham estômago tão forte ao ponto de não vomitar com o que viam.

De outro lado, o partido expulsou todos os que seguiam sua ideologia à risca, ou seja seus fiéis e sinceros escudeiros.

Com a debandada dos poucos pensadores que lhe davam sustentação e sentido, e dos seguidores fiéis, o PT ficou acéfalo e entregue à sandice desenfreada dos medíocres que permaneceram.

E como um bando de piranhas disputando uma carniça, eles desmantelaram todos os princípios ético-políticos que ainda restavam de pé no Brasil.

Hoje a figura de Luiz Inácio Lula Não Sei Nadinha da Silva é pouco mais que uma figura decorativa, desengonçada e pouco à vontade, numa roda à qual não pertence. Um bobo útil, ao fim e ao cabo, manipulado pela máquina financeira nacional e internacional, que ele julgou ser tão fácil de capitanear.

É um jogo que ele aprendeu a jogar. Os banqueiros lhe tiram, mas também lhes dão. E dão muito!

Assim, o sonho ideológico gramisciano* do PT foi para o vinagre, e ele se tornou uma maionete do jogo financeiro, cujos fios vão até as mãos de hábeis manipuldores, que certamente, juntamente com os fios, mantém a ponta de seu rabo preso, por deterem informações sobre suas falcatruas que não devem ser reveladas ao grande público - ainda!

Assim como não é possível que ele tenha sido enganado por todos, já que é muito mais esperto que seus correligionários - afinal foi ele quem chegou á presidência - também é difícil crer no conto de fadas de que ninguém até hoje encontrou indícios de suas falcatruas.

Como em política é impossível saber exatamente em que mãos está a ponta do próprio rabo, o melhor é não arrriscar e amenizar o discurso, poupando a quantos puder, para que não lhe puxem o tapete, como fizeram com Collor.

Exemplo disso é a enxurrada de absolvições que, fora da mídia, os deputados vão promovendo com os mensaleiros - já quase todos absolvidos.

O escárnio às instituições é tanto, que chegou à dança da deputada em pleno plenário, diante da câmeras.

E assim como em toda democracia existe a figura do Ministro Sem Pasta, "Não Sei Nadinha da Silva acaba de inventar o Presidente sem Função - talvez sua mais original criação. Ou melhor ainda, sua função não pode ser divulgada oficialmente, porque o descaramento no Brasil ainda não chegou a esse ponto – mas chegará rapidamente – mas é, como todos sabemos, o de Coordenador dos Insensatos”

Por não ter a menor condição de governar, já que não faz idéia da complexidades dos problemas universais, intrincadamente inter-relacionados, "Não Sei Nadinha da Silva" gasta seu tempo como garoto propaganda do Brasil – uma espécie de Príncipe Charles brasileiro, metendo-se em assuntos internacionais sobre os quais não tem o menor domínio.

Por não ter noção das proporções gigantescas - quer em escala de amplitude, quer em profundidade – da tarefa que recebeu das mãos dos eleitores, e por não ter recursos pessoais e morais para manter a farsa de estadista, ele está aos poucos liberando sua turma e a si próprio do respeito que um governante deve ter pelas instituições e pelas leis.

Haja vista o episódio do caseiro e do ministro, onde o Estado brasileiro despejou todo o seu peso sobre um homem simples, cujas declarações abalaram os últimos resquícios de moralidade que o governo ainda tinha.

Seus aliados, convenientemente içados para lhe fazer companhia e dar ao governo o “clima” de pátio de fábrica do ABC paulista, foram caindo uma a um, nocauteados pela sanha do deslumbramento do enriquecimento ilícito, pago com o trabalho daqueles que nele acreditaram. E assim, Luiz Inácio Lula Não Sei Nadinha da Silva está cada vez mais encastelado no alto da cadeira de presidente que ele insiste em confundir com um trono.

Seus antigos escudeiros, como Mercadante - que até o PT assumir o poder dizia ter as fórmulas mágicas para colocar o Brasil nos eixos - e outros tantos “gigantes” que posavam de heróis, com másculas e sangrentas biografias, por terem trocado tiros com o Status Quo, foram diminuindo de estatura até ser tornarem insignificantes liliputianos, personagens secundários de uma peça teatral de terceira categoria, cuja única coisa que parece verdadeira é o cenário de papel onde ela está sendo encenada: A farsa de um país feliz e progressista. .

Finalmente, há uma cota respeitável da platéia dessa peça que ainda julga “Não Sei Nadinha da Silva” inteligente, quando na verdade ele é apenas um esperto. Se espertinho ou espertalhão, o tempo dirá.

A esses crentes esclareço que esperteza é a inteligência de curto prazo. Mas, o curto prazo pode ser muito útil a pilotos de Fórmula 1 - que aliás, andam em círculos - pois precisam decidir em átimos de segundos, mas é terrivelmente perigoso ao capitão do transatlântico Brasil, que precisa pilotar de olho no horizonte distante.

Enquanto foi oposição, “Não Sei Nadinha da Silva” perturbou o quanto pode os governos estabelecidos, e seja por falta de prática ou por outro motivo qualquer, a oposição de hoje não perturba quase nada, se comparado ao que foi perturbada quando era governo.

Tenho que admitir: Enquanto foi oposição, o PT não se vendeu à situação, como faz agora o PMDB e outras legendas de aluguel.

Na verdade, o PT atual não tem oposição. Tem gatos pingados, com suas vozes apagadas por bem ou por mal, como foi o caso da morte do escritor Yves Hublet, que após desferiu bengaladas na cabeça de José Dirceu, morreu dia 26 próximo passado numa prisão de Brasilia e seu corpo foi cremado sem que nem mesmo a família tivesse sido avisada.

Então, não foram as elites nem a oposição que desmoralizaram o governo de "Não Sei Nadinha da silva". Seu governo desmoralizou-se por falta absoluta de sustentação, de conteúdo, de educação básica e principalmente de ética, da qual ele se diz o único detentor no país.

Seu governo implodiu simplesmente, ruiu sobre si mesmo, por ter tentado enganar a todos o tempo todo.

O canhestro desempenho como Presidente da República e ignorância dos assuntos mais triviais do cenário mundial, suas gafes internacionais e nacionais, que puseram às claras a extensão de sua ignorância, tornaram Luiz Inácio Lula Não Sei Nadinha da Silva motivo de chacota, e uma figura política apenas decorativa, tão útil quanto um cinzeiro em uma motocicleta, a não ser, obviamente para os que tem interesses escusos no governo.

E o que começou como um furacão, prometendo o “espetáculo do crescimento” terminou com o Brasil esquecendo os mais básicos preceitos de cidadania, e a mais desbragada e coordenada corrupção de que já se teve notícia neste país.

Os ternos caros que usa não modificaram o conteúdo. O abrandamento dos modos não encobriu a incompetência.

A estratégia de governo funcionou apenas durante a campanha à presidência, enquanto era apenas um planejamento, e porque era feita por um marketeriro profissional - que, aliás, está também lambuzado de imoralidades até à alma.

"Não Sei Nadinha da Silva" não sabia - e não lhe foi informado - de que todos os humanos possuem um "ponto de incompetência" para além do qual eles não se tornam apenas inúteis, tornam-se perigosos.

Ele atingiu o dele no momento em que foi chamado para exercer uma tarefa muito além de suas possibilidades: Negociar no cenário mundial sem ter a lhe garantir uma horda de operários de uma fábrica parada dando prejuízo.

Na verdade, todos caminhamos para o Ponto de incompetência, e o atingiremos algum dia, se vivermos o suficiente. Cabe-nos então redirecionarmos nossos esforços para outras áreas onde este ponto esteja ainda distante. isto tem um nome: Inteligência - mudar para seguir o rítmo eterno das metamorfoses universais.

Calcada sobre premissas equivocadas, a famigerada competência e combatividade de "Não Sei Nadinha da Silva" foi crescendo como um balão de festa de aniverário: Inflado, frágil e oco. Assim, feita de paredes finsíssimas, elas se rasgam ao menor toque, apenas para nos mostrar que em seu interior existe absolutamente nada!

Assim, a grife chamada "ética" de "Não Sei Nadinha da Silva" não emplacou; seu discurso não fez escola, e sua biografia está irremediavelmente manchada.

Os brasileiros que votarão em Dilma Rousseff não tem a menor idéia de que estão ajudando a construir aquilo que Ronald Reagan chamou na década de 80 de “O Eixo do Mal”, hoje desenhado pelo alinhamento do Brasil, Venezuela, Cuba, Irã e provavelmente dentro de pouco tempo também pela Coréia do Norte, e alguns países africanos.

Entristeço-me, porque afinal, não se aprendeu nada com a catarse dos anos 60. O cantor e compositor Belchior enxergou isso 20 anos antes de nós todos quando escreveu numa de suas músicas “e hoje eu sei que quem me deu a idéia de uma nova consciência e juventude está em casa, guardado por Deus, contando os seus metais”. E finaliza: “minha dor é perceber, que apesar de termos feito tudo o eu fizemos, ainda somos os mesmo e vivemos como nossos pais.”

Agora, somente agora é que sinto bem o peso das palavras de John Lennon, quando disse: “O sonho acabou!”

Estamos de volta à barbárie, perdidos numa terra onde a lei não se impõe, uma terra para onde fogem os gangsters internacionais, porque aqui tudo é permitido e a lei é uma piada, como piada são também a maioria dos candidatos à próxima eleição, as pessoas que produzirão nossas leis.

Do Chico Buarque eu modificaria os versos de sua música de protesto contra o regime militar para:

“Você que inventou a mentira, agora tenha a fineza de desinventar. Voce vai pagar é dobrado, porque em dinheiro roubado não dá prá confiar”.

E você Caetano? Porque você não volta a nos lembrar que

“Antes que a definitiva noite se instale em Latinoamérica, o nome do homem é POVO?”

Com a vitória de Dilma, foram-se as últimas esperanças de um país alinhado com a modernidade.

A montanha, finalmente, conseguiu remover a fé!

* * *

*Antonio Gramsci é o fundador do Partido Comunista da Itália.

JB Xavier
Enviado por JB Xavier em 08/09/2010
Reeditado em 08/09/2010
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