Nóis sófre e num góza... nóis é besta, memu!

“ Poderiam ser 400 unidades de educação infantil, 100 escolas técnicas, mais de 40 quilômetros de corredores de ônibus, 16 hospitais bem equipados, 1.400 pistas profissionais de atletismo, 820 aparelhos de Raio X de última geração, ou 10.500 casas populares. Poderia, mas será um estádio de futebol.”

(Revista Veja-Artigo sobre a Copa do Mundo no Brasil)

Eu, brasileira e pagadora de impostos, sou contra a Copa do Mundo no Brasil. Não tenho nada contra eventos esportivos. Gosto de assistir um bom jogo. O fato é que o Brasil não tem “pedigree” para sediar uma Copa do Mundo e uma Olimpíada. Vejamos a seguir algumas reflexões:

1º) Segundo fontes oficiais, menos de 50% da população brasileira tem o saneamento básico satisfatório, sendo que a maioria dos locais atendidos com este serviço está nas grandes cidades do país. O desperdício de água pelas companhias concessionárias é muito grande. O acesso à rede de esgoto não atende a 30% da população das grandes cidades brasileiras, e mais da metade não tem este serviço essencial, sendo que 80% dos esgotos são lançados diretamente nos rios. Algumas cidades atendem menos de 3% da população que nela reside.

Com esses índices alarmantes a saúde da população brasileira mais pobre é sacrificada, e as doenças que poderiam ser evitadas com investimentos na rede de abastecimento de água e de coleta de esgoto são problemas que irão persistir por várias gerações no Brasil. Segundo fontes governamentais, as obras necessárias para resolver esses problemas são caras, muuuuito caras.

2º) A educação no Brasil vai de mal a pior. Os resultados das condições de “letramento” que se encontram nossos jovens nos levam a questionar até mesmo o próprio sistema educacional que deveria ser repensado, desde o currículo das escolas até a forma de ingresso às universidades. Dar kit-educação, bolsa-educação, mochilinha e sacolinha não tem apresentado melhoras no desempenho dos alunos e nas avaliações oficiais.

Culpar os professores é o caminho mais fácil, afinal, delega-se isso à eles, como se fossem os únicos responsáveis pela educação das nossas crianças. A verdade é que para os nossos representantes - Educação - não é prioridade. Não se investe no profissional professor, não se investe em tecnologias escolares, em laboratórios de informática, em salas de apoio para ministrar aulas em espaços diferenciados (artes visuais, música, teatro, física, química e práticas esportivas), onde seria possível o professor planejar projetos com seus alunos, visando a investigação e o conhecimento do mundo, garantindo momentos de pesquisa, vivência, conversas, registros e estudos que mobilizariam a investigação e a aprendizagem.

3º) A saúde no Brasil está doente. O brasileiro sofre com uma das mais altas cargas tributárias do planeta, onde em tese, isso lhe garantiria um atendimento de saúde universal e decente. Mas não. Só em sete capitais, mais de 170.000 pessoas terão de esperar até cinco anos por uma cirurgia não emergencial. Nos hospitais e pronto-socorros, mais filas e queixas quanto à qualidade do atendimento. O engraçado é que todos os dias, diante da TV, temos novas notícias de corrupção e roubo no governo. Agora, nesse momento, todos estão preocupados com a construção de dezenas de novos estádios de futebol para a Copa do Mundo de 2014; Enquanto que nossa população sofre e morre nas intermináveis filas do SUS sem receber o tratamento médico necessário a sua saúde.

Por tudo isso e muito mais, penso que os brasileiros não deveriam aceitar a Copa do Mundo no Brasil. E o motivo principal está justamente nessa discrepância de valores - uma exorbitância de dinheiro que irá ser gasto com a Copa do Mundo seria muito melhor empregado se fosse destinado, sem desvios, à saúde e segurança pública, à educação, ao saneamento básico, habitação, meio ambiente, recuperação da malha rodoviária e ferroviária, revitalização do transporte ferroviário, infra-estrutura aeroportuária e naval, dentre outros e outros.

Temo pelo pior depois da Copa realizada, onde conseqüências desagradáveis, decorrentes dos gastos desmesurados, irão aparecer, e o país se transforme novamente aos moldes de antigamente, quando nos ajoelháva-mos aos pés do FMI e a inflação era de 75% ao mês (vide Grécia, pós-Olimpíada/2004).

Pior de tudo é que a gente sabe que tem uma minoria graúda que vai ganhar muito dinheiro, em detrimento do grosso da população que vai sair no prejuízo, em curto, médio e longo prazos.

Só para ilustrar, depois de muita discussão a Fifa está repensando um valor mais acessível para assistir aos jogos, pelo menos para a primeira fase da competição, o que, diga-se de passagem, é totalmente direcionado para o público distante. É isso aí - o Brasil continua sendo um país de “poucos”.

Nóis sófre e num góza...nóis é besta, memu!

MIRAH
Enviado por MIRAH em 01/12/2011
Reeditado em 26/01/2012
Código do texto: T3366843