Apenas uma triste constatação da realidade cotidiana

Apenas uma triste constatação da realidade cotidiana

Luiz Eduardo Corrêa Lima

(Professor Titular de Biologia – FATEA/Lorena)

Sempre que falar de amor, fale de amor por inteiro. Sempre que falar de dor, fale de dor por inteiro. Nada de partir e repartir, porque o verdadeiro amor e a verdadeira dor são plenos, assim como devem ser todos os sentimentos e todas as atitudes reais da pessoa íntegra. O que for parte acaba não sendo tudo e assim, em parte, também acaba sendo uma grande mentira. Pois é, essa tal de mentira é o maior mal de toda sociedade humana.

É preciso que nos soltemos e que assumamos nossas posições total e plenamente, pois do contrário continuaremos nesse mundo de mentira em que vivemos e além de não nos tornarmos felizes, principalmente não poderemos permitir a felicidade dos demais seres humanos. Nosso pecado está exatamente aí, porque enquanto fazemos mal a nós mesmos é apenas mais um problema nosso. Porém, quando passamos a fazer mal aos outros estamos influindo negativamente na sociedade. O resultado disso é a triste situação da sociedade em que vivemos. Uma sociedade totalmente destruída e sendo movida por valores efêmeros, perniciosos e imorais.

Se realmente amarmos ao nosso próximo, certamente também deveremos ser, mesmo que seja despretensiosa e ocasionalmente, amado por ele. Amar ao próximo, eis o grande propósito a ser atingido pela humanidade. Essa deveria ser uma regra primária na condição de qualquer ser humano, independentemente de qualquer princípio religioso, porque amar ao próximo deveria ser a base verdadeira da relação de causa e efeito entre os seres humanos. O problema é que nós não somos plenos, temos as nossas restrições e não amamos ao próximo plenamente e assim criamos os malefícios e conturbamos o mundo com inúmeras reticências morais e comportamentais.

Partamos, pois, para a liberdade de ação. Sejamos seres humanos por inteiro e não apenas parte. Sejamos pessoas plenas e íntegras no intuito de melhorar a nós mesmos e principalmente a sociedade em que vivemos, pois assim estaremos sendo verdadeiros e agindo para melhorar o mundo. A vida de cada um é apenas e tão somente uma pequena fração do tempo que se expressa na forma como vivemos. Independente de qualquer situação, nós sempre achamos o nosso tempo curto e, embora não percebamos, quando deixamos de ser reais encurtamos esse tempo ainda mais.

Vivemos num mundo de mentira e pela mentira. O pior é que por conta disso culpamos sempre o outro e fugimos da responsabilidade pela nossa falta de coragem de assumir a vida por conta da nossa falta de amor e de nossa carência em relação à verdade. Trocamos acusações indevidas e esquecemos que somos formados da mesma matéria, somos todos iguais, frágeis. Esquecemos, principalmente, que o tempo é igual para todos e que a felicidade caminha na frente do tempo. Perdemos tempo com o que não nos interessa e deixamos de ser felizes.

A mentira cresceu em nós a tal ponto, que não temos mais coragem de discernir entre o certo e o errado e achamos engraçado quando alguém nos engana, porque somos intimamente conscientes de que também fazemos a mesma coisa com os outros. O errado transparece como certo e alguns de nós, infeliz e ilusoriamente, até têm ficado satisfeitos com isso. Somos seres humanos, mas agimos como pobres figuras miseráveis na busca de minimizar as nossas mazelas. Parece que esquecemos a verdadeira razão de estarmos aqui e estamos deixando de buscar a felicidade plena.

Apelamos para Deus, mas não cremos em Deus verdadeiramente, porque não amamos e nem sentimos de fato aquilo que produzimos. Como eu já disse, vivemos uma vida de mentira e também nos abrigamos nas asas da impunidade, porque também não acreditamos em nada. O juiz safado tem a nossa cara. O político corrupto foi eleito por nós. O bandido miserável é nosso irmão e gostaríamos de estar no lugar dele, enquanto ele se dá bem. É triste afirmar, mas em certo sentido, temos torcido muito para que as coisas erradas se mantenham.

Não cremos na Lei de ação e reação, porque criamos mecanismos para mascará-la e efetivamente ela acaba não existindo. Tapamos o sol com a peneira e fingimos não ver os erros dos outros, para podermos cometer os nossos e para que os outros não comentem sobre esses nossos erros. Somos meros aproveitadores das situações cotidianas distorcidas e seguimos a “Lei de Gérson” em toda a sua plenitude. Nosso lema é levar vantagem em qualquer situação ou momento e nos engamos intimamente com isso.

Que espécie estranha de ser vivo somos nós, que produzimos quase tudo ao longo de inúmeros anos de história e destruímos tudo em rápidos momentos de aflição. Somos uma espécie medrosa e desordeira e nosso medo é tal que nos cria, a cada dia, situações mais vexatórias e perigosas. Caminhamos para o caos e, o que é pior, até aqui temos sido coniventes com isso. E eu paro aqui para perguntar, até quando continuaremos sendo o lobo do próprio homem?

Não podemos reclamar dos juízes safados, dos políticos e administradores corruptos e nem dos marginais, porque nós somos coniventes com a existência desses mal feitores. Nós permitimos e até queremos que eles continuem existindo e assim, nós merecemos isso, embora seja muito duro ter que admitir essa verdade. Temos passado por coisas muito ruins, mormente aqui no Brasil, mas ainda não paramos para fazer a reflexão que nos levará a única verdade. A culpa pelo que acontece é unicamente nossa. Temos o poder de mudar aquilo que quisermos, mas precisamos querer. Até aqui temos apenas assistido à banda passar sentados em nossos camarotes especiais e não tomamos nenhuma posição diferente.

Somos uma plateia apática e vivemos um “reality show” muito perigoso, no qual somos as principais vítimas. Se continuar assim, fatalmente isso nos levará a uma situação de desordem total. Nossas noções de direito e dever desapareceram. Estamos voltando ao “Velho Oeste” e a “Lei do Mais Forte”, porque abdicamos de lutar pelo que é certo? Perdemos o sentido das coisas e principalmente a noção de ética. Não tenho dúvidas de que ainda continuaremos pagando muito caro pela nossa passividade e inoperância em relação aos lamentáveis fatos cotidianos que temos observado. Até quando continuaremos assim, insensíveis, passivos e imóveis?

Luiz Eduardo Corrêa Lima (55) é Biólogo, Professor, Escritor e Ambientalista,

Membro da Academia Caçapavense de Letras – ACL (Cadeira 25),

foi Vereador e Presidente da Câmara Municipal de Caçapava.