O que é amar?

O QUE É AMAR?

Os livros, as poesias, o folhetim, as artes, estão cheios de menções, conceitos e definições sobre o amor, como se ama, o que é amar. Há décadas passadas, um conhecido refrigerante lançou uma campanha nacional, chamada “amar é”, onde, no interior de cada tampinha apareciam figuras de bonecos, cada uma delas com imagens e mensagens diferentes: “Amar é... pegar na mãozinha dela... não fazê-la chorar... pedir perdão quando chegar tarde... não ter ciúmes...”, etc.

O curioso é que apesar da simploriedade quase infantil da mensagem, as dicas eram interessantes, e, se levadas a sério, seriam capazes de ajudar muito na difícil tarefa de buscar viver um amor dia após dia. No entanto, para a sociedade moderna, tão carente de afeto e perdão, fica claro que mesmo as lições simples do “amar é” não foram seguidas...

No filme “Love Story”, na década de 60, surgiu uma definição tornada antológica: “Amar é nunca ter que pedir perdão!” Será mesmo? Por que não ter que pedir perdão? De certo porque quem ama nunca faz nada que o leve a arrepender-se e assim ter que pedir perdão. Pode ser!

É curioso como neste começo de século XXI as pessoas falam em amor. É viver um grande amor, curtir o amor, esperar o amor, fazer amor, trocar de amor, e, entretanto, nota-se que as pessoas estão cada vez amando menos, mais tristes, com menos esperanças, mais irrealizadas. Será que o amor não lhes traz mais satisfação? Será que não lhes dá aquela felicidade de que se ouve falar nos romances e nas músicas de rádio?

Vendo bem, parece que as pessoas esqueceram-se do que é o verdadeiro amor, como sentimento, abertura de si, trocando-o por dominação egoísta, simples uso para prazer, como coisa, objeto descartável, de utilização funcionalista, do tipo, gosto enquanto serve para alguma coisa. Na verdade, amar não é isto.

Gostar é algo um tanto quanto superficial. Eu gosto de churrasco; minha mulher gosta de sorvete. No terreno humano, o gostar ou é amor mal definido ou é uma simples simpatia a alguém que nos serve. A grande verdade é que gostar gasta. Amar é diferente. Eu como o churrasco até consumi-lo. Come-se sorvete até acabar. Com o amor sucede de outro jeito. A gente ama e está sempre amando mais, o amar não gasta e não se consome; sempre tem mais amor...

Amar é querer o bem do outro... ensinou Santo Tomás de Aquino. Quem ama quer que a pessoa amada desfrute do bem. Mas isto é pouco!. Tem gente que quer o bem do outro, mas não mexe uma palha nesse sentido. Os omissos e os indiferentes querem, mas não fazem nada. Esse é o tipo do amor deles.

Então, amar é querer e realizar o bem do outro... Sim, porque só querer não adianta, tem que buscar, lutar para que esse querer se transforme em realidade. Certo? Errado! Errado, porque tem gente que querer até quer, mas até um certo ponto. Quando aparecem dúvidas, barreiras que requeiram desacomodação e renúncias... não é comigo mais...

Assim, amar é querer e realizar o bem do outro - no nosso caso, do marido, da esposa, ou dos filhos - e aí vem o melhor: mesmo com sacrifício próprio. Quem ama se entrega e, se preciso for, se sacrifica. O egoísta apenas gosta. Na ocasião do sacrifício ele tira o time de campo. Jesus Cristo é o modelo do amor. Ele nos amou até o fim.

Ninguém tem maior amor que aquele que dá a vida pelos

seus amigos (Jo 15, 13).

O amor de Cristo pela Igreja é sinal do amor matrimonial, pois ele amou sua Igreja e por ela se entregou (cf. Ef 5, 25). Amar é valorizar o outro como pessoa humana. É promover marido ou mulher, àquela dignidade ímpar de pessoa única, de filho de Deus...

Teologicamente, amar é ver no outro a pessoa de Cristo, amando-o, respeitando-o e por ele se sacrificando, se preciso for. Nesse aspecto ressalta-se a dimensão testemunhal do amor. Amar é mais difícil que ser amado. Para ser amado, basta o indivíduo tornar-se receptivo às atenções que o outro lhe dedica. Amar significa sair de si, e isso, para o egoísta, é quase impossível.

Como afirma Paul Claudel, “Os egoístas, por definição natural, não podem amar” (In; Oeuvres, 1946). Amar de fato, com todas as suas implicações, como compromisso, respeito, renúncia, não é fácil. E quem afirma isso é um casal cujo casamento dura quase cinquenta anos. Não é fácil! Mas não é impossível...

Considerando que o amor - diferente do gostar - nunca se acaba, quando se vê um casal afirmando que o amor deles terminou, não é difícil concluir que esse amor, de fato, nunca existiu. Na ambigüidade do ser humano, há luzes e trevas, carinho e grosseria, fidelidade e infidelidade, atenção e desinteresse, sussurros e gritos... Só o amor é capaz de ordenar essa dialética, levando tudo a uma formidável síntese de felicidade e realização, carinho e perdão.

Não é fácil amar autenticamente. De uma forma geral, o amor que dedicamos ao outro, vem sempre misturado com muito egoísmo. Amamos com intuito de receber, de tirar vantagens do outro. Existe amor verdadeiro, quando desejamos e trabalhamos para que o outro cresça e desenvolva suas capacidades. Nisso é que surge aquela obrigação: amar... até com sacrifício próprio...

É um erro, portanto, casar para ser feliz; o segredo começa quando a gente casa para tornar o outro feliz. Diz-se que amar não é querer alguém construído, mas construir alguém muito querido. E essa construção, seja cônjuge ou filho, se faz com presença, participação e amor. Único e irrepetível, o amor humano possui diversas faces, que os teólogos de Igreja relacionam em paternidade, filiação, irmandade e nupcialidade (P 583).

Paternidade

é o ato de amor exercido responsavelmente pelo pai e pela mãe, ]

desde o planejamento dos filhos, a concepção, até o

desenvolvimento de uma vida digna, crescente e feliz, passando

pelas fases da espera, da nutrição, da educação e do

encaminhamento para a vida;

Filiação

é a relação de amor dos filhos em relação a seus pais. Quem for

bom filho, por certo será bom pai e boa mãe;

Irmandade

consiste na relação de amor entre os irmãos. Não basta os laços

biológicos, é preciso amar; é levar o amor às últimas

consequências;

Nupcialidade

o amor conjugal vivido entre os esposos. Ele cria vínculos,

fortalece, aproxima e transmite vida.

Esses mesmos níveis de afeto partilhados no seio da família, também são vividos em nossa relação recíproca com Deus. Na família a Igreja busca o modelo para também viver a experiência dessas relações.

Nesse aspecto, enfatizando que amar integralmente é difícil (mas não impossível), vemos, com satisfação, a alegria de tantos casais que se sentem bem em casa, preferindo o calor do lar que as seduções do mundo. Isso os encoraja a buscar, cada vez mais.

A família, santificada pelo sacramento do matrimônio retrata a presença de Deus em seu meio, e torna-se um testemunho da presença pascal do Senhor. No amor, marido e mulher tornam-se um. O amor é a vocação fundamental e originária do ser humano. Amar é uma necessidade histórica e congênita da pessoa. É uma carência de seu coração. Desde a criação, Deus quis dar-lhe uma companhia (cf. Gn 2, 18) pois viu que a solidão não era coisa boa. O ser humano foi feito para o amor... e se torna extremamente infeliz e irrealizado quando não é amado, quando não consegue amar.

Amar é dar-se ao ser amado; é doar aquilo que de mais profundo temos: nosso coração, nossa mente. Dando-se assim, a pessoa se realiza e se plenifica. O ser humano só é feliz integralmente quando é capaz de tornar o outro feliz.