PAIS DE BRINQUEDO

PAIS DE BRINQUEDO.

O PRINCIPAL OBJETIVO DA EDUCAÇÃO É CRIAR PESSOAS CAPAZES DE FAZER COISAS NOVAS E NÃO SIMPLESMENTE REPETIR O QUE AS OUTRAS GERAÇÕES FIZERAM. JEAN PIAGET

Percebe-se que, de certo tempo para cá, mais e mais jovens tornam-se pais e mães em idade extremamente precoce, mesmo considerando-se o pleno acesso à informação sobre os meios contraceptivos disponíveis e o diálogo que se estabeleceu entre pais e filhos, denotando uma maior liberdade dentro do seio familiar. Trata-se de uma contribuição para a melhoria da relações humanas que tem ganhado muito espaço na mídia e colaborado para uma sociedade mais aberta e sincera.

Todavia, este fato – a precocidade de pais e mães – traz consigo certos perigos que ainda não foram devidamente avaliados pelos especialistas e que possuem desdobramentos cujas repercussões criam reflexos indesejados, e até mesmo perigosos.

Senão vejamos. Pode-se ter certeza ( ou mesmo certo grau de confiança) de que um jovem situado na faixa etária entre catorze e dezesseis anos tenha o mínimo preparo para tornar-se pai ou mãe? E não queremos nos referir à vivência ou experiência que sejam capazes de contribuir para a formação de um indivíduo – obedecendo à máxima de que se aprende por amor ou por dor – mas apenas aos limites da capacidade de cuidar e criar um novo ser que acaba de chegar, referindo-se a questões mais profundas que alimentar e agasalhar esse pequeno recém-nascido.

Sabemos muito bem que este terreno é árido e espinhoso, e que as circunstâncias em que se encontra inserido também é algo a ser objeto de estudo em apartado, mas não podemos nos imiscuir da imperiosidade que o tema traz à baila, uma vez que em nossa sociedade dita como “sociedade da informação”, ainda hajam tantos e tantos indivíduos desinformados, que no afã de buscar uma satisfação orgânica, esquecem-se de pensar nas consequências, principalmente quando essas consequências são outros indivíduos que vem ao mundo carecendo de afeto, de carinho, de proximidade, de formação e de informação.

Não queremos aqui estabelecer um apanágio com tons positivos ou negativos, até mesmo porque tal procedimento deve ficar ao encargo de especialistas no tema que sobre ele se debrucem à procura de perguntas (não apenas de respostas). O que se almeja é um questionamento de ordem social e comportamental, uma vez que esses jovens tendem a não declinar o devido cuidado com suas crias como deveriam. E não nos referimos ao aspecto econômico ou financeiro, já que vivemos em uma sociedade em que “ter” sempre é mais importante que “ser”.

Olhemos o seguinte aspecto: permanecerão juntos estes jovens após quatro ou cinco anos de casamento? E se permanecerem, em que grau de qualidade encontrar-se-á essa relação? As respostas a estas perguntam constituem um pequeno painel do futuro do recém-nascido. Ele irá crescer sendo amado, porque também foi querido, ou será apenas o resultado de uma relação carnal que nasceu sem muito compromisso?

Perdoem-me os infindáveis questionamentos, mas não há como elaborar uma digressão sobre um tema tão complexo que não exija a formulação de perguntas que sirvam de eixo de orientação tanto aqui, no presente, como também e principalmente no futuro. Observa-se que, na maioria das vezes (e sem querer generalizar, até porque a generalização é burra), nas classe sociais mais abastadas ou suficientes sob o aspectos financeiro, o evento resume-se a criar os filhos e os netos como se todos filhos fossem, sem impor-se compromissos e responsabilidades, deixando ao alvedrio de filhos exercerem os papéis de pais e de mães.

Por mais que se possa conceber isso como algo corriqueiro, há uma certa dose de crueldade que revelar-se-á crítica à medida que o tempo passa – o tempo, esse nosso inimigo íntimo – resultando em desagregação e absoluta ausência de fraternidade – restando apenas a responsabilidade imposta pelo meio social.

Ora, um jovem de dezesseis anos, que ainda joga vídeo-game e curte o facebook, não demonstra ter muito tempo disponível para trocar fraldas, empurrar carrinho de bebe, ou ir ao mercado fazer compras. Isso pode soar preconceituoso ou reacionário apenas se for observado como um cenário isolado. Porém, visto dentro de um contexto denota uma realidade que mal se preocupa com indivíduos, mas apenas com o que eles “valem” para o meio social.

De que importa que este jovem tenha cometido um deslize tão normal e atávico como a própria existência humana, se ele é “punido” com um cabedal de deveres, obrigações e responsabilidade para os quais não foi preparado e muito menos conscientizado pelos seus pais, pela escola que frequenta e pelos meios de comunicação que se auto-intitulam “provedores de informação social”. Podemos realmente crer que esse jovem casal abraçará este fardo (e não me refiro aqui à criança) e o conduzirá de forma digna e confiável. Sem generalizar, responde-se que não, e quem pagará o preço desse infortúnio são os filhos (!).

Já nas classes sociais mais carentes o cenário que se descortina é um pouco mais frio e cruel. Impõe-se que os jovens devem casar-se e prover-se por si mesmos (!), fato este que guarda certa dose de imagem insólita e que certamente desaguará em separações e desagregações sociais tendo como vítima principal o pequeno recém-nascido que nada sabe e nada percebe a não ser a ausência de carinho e de proximidade.

A bem da verdade, transformamos filhos inexperientes em pais, nos esquecendo que eles sequer despiram a posição de filhos que são. Exige-se deles algo para o qual não foram preparados impondo-lhes uma nova situação em que o ambiente não é propício ao crescimento e desenvolvimento de um novo ser humano, e simplesmente deixamos que a vida siga o seu curso natural!

Descalabro é a palavra que encontramos para justificar o descontentamento com tal situação. Crianças cuidando de crianças, filhos tentando serem país! Inadmissível e mesmo inconcebível, especialmente quando temos em mente que estamos no início do século vinte e um e que os jovens de hoje tem muito mais acesso à informação do que há algumas décadas atrás. E as expressões que mais ouvimos são: “Ah! Que gracinha! Tão novos e tão responsáveis!” - isso será realmente verdadeiro ou apenas uma frase de efeito?

De qualquer modo, isso não importa, já que esse novo casal precisará transpor diversas barreiras até que possam sem considerados aptos a enfrentarem essa nova situação com consciência e responsabilidade.

Ante a inabilidade em lidar com essa situação redunda o surgimento aos milhares de filhos autoritários e mais despreparados que seus pais. Sucessão de crises e ausência de amor pleno são fatores que irão estimular o falecimento desta união nascida da inconsequência. Além de avós que tornar-se-ão super-protetores dos netos, relegando seus filhos à um segundo ou terceiro planos.

E a situação não para por aí: esses jovens totalmente despreparados serão inevitavelmente jogados em um mercado de trabalho altamente competitivo e especializado, cuja principal tônica é a descoberta do talento, mote para o qual tais jovens são apenas um rastro de poeira engolida na passagem. E isso implicará na imperiosidade de que os pais sustentem esse casal, tornando-os mais dependentes do que já eram, propiciando o cenário ideal para a desagregação e a discórdia.

Vejamos o seguinte excerto:

Até meados dos anos 60, as regras dentro de casa eram impostas aos jovens. Hoje, é bastante comum um acordo entre pais e filhos. Antes, os pais davam broncas, colocavam os filhos de castigo e cortavam regalias porque era assim que as coisas funcionavam e ponto final. Hoje, cada bronca precisa ser acompanhada de boas justificativas. Um dos motivos disto é que os jovens atuais são muito bem informados. Outro dado é que eles nasceram num ambiente já bastante marcado pela educação liberal. Com a revolução comportamental dos anos 60, a difusão dos métodos pedagógicos e de todo o sistema de informação, a liberdade passou a dar o tom nas relações entre pais e filhos. A tal ponto que hoje se vive o oposto da rigidez: em muitos lares, os pais é que se sentem desorientados e os filhos, na ausência de quem estabelecer limites para sua conduta, assumindo o papel de tiranos. Nessas condições, é natural que estabelecer limites de conduta se transforme numa tarefa difícil.

Á ideia de que a liberdade é a melhor resposta em todas as situações, somam-se culpas cultivadas pelos pais. Por trabalharem e passar pouco tempo com os filhos, é comum que um casal se torne permissivo com os desejos dos jovens para compensar sua ausência. E às vezes não é nem a culpa que causa o estrago: é o desejo de fugir da tarefa difícil que é educar um adolescentes. Alguns pais acusam a falta de tempo como subterfúgio. Outros usam a medicalização, ao menor sinal de que alguma coisa está fora dos eixos, os pais correm para um consultório médico, em vez de tomar a eles próprios as rédeas da situação. Acreditar que a escola possa assumir sozinha o papel do educar um adolescente é uma saída pela tangente bastante comum também. A permissividade chegou a um ponto em que os próprios colégios estão tendo de chamar a atenção dos pais para seus deveres . No fundo, o que eles procuram é uma saída do problema. Querem uma justificativa externa para o mau comportamento dos filhos e têm a falsa ideia de que dois comprimidos por dia resolvem qualquer problema.1

O texto acima nos dá a ideia de que tudo parece ter sofrido uma inversão de valores nos quais a premissa crucial é o direito à liberdade, o que, ao nosso ver, é bastante válido, desde que seja dosado de responsabilidade e de bom senso. E aproveitamos ainda o mesmo texto acima para aferir a seguinte consideração: “A título de se colocarem como amigos os filhos, muitos pais acabam sendo cúmplices de erro que em nada contribuem para a formação deles. Nunca custa lembrar: a função do pai não é ser amigo e confidente, para isso, os adolescentes têm suas turmas, papel de pai é ser pai”.

Toda essa inabilidade em lidarmos primeiramente com nós mesmos cria uma situação ideal para que se prolifere a frouxidão moral, a incapacidade de orientar e acompanhar o crescimento de nossos filhos e, em alguns casos, impõe à sociedade a responsabilização por solucionar os problemas que possam surgir de um total despreparo de filhos que não conseguem ser pais, pois jamais deixaram de ser filhos!

E isto se trata de uma constatação que não deixa qualquer margem para dúvidas ou incertezas. As próximas gerações, em que pese o fato do avanço científico e tecnológico superarem as melhores expectativas, terão diante de si o dilema filosófico de buscarem um aprimoramento emocional e moral que não lhes foi concedido pelas gerações anteriores. E a penalização virá de uma forma ou de outra.

Aliás, arriscamos dizer que esta penalização já está acontecendo, posto que o abandono social e emocional cria deturpações como os chamados “reality shows”, onde tudo é tomado como parte de um imenso jogo – mas que jogo é esse! – de permissividade, de desrespeito e de absoluta ausência de uma visão abrangente dos laços sociais que permitiram ao ser humano chegar onde chegou. Parece apenas uma triste constatação de que não estamos mais no controle de nossas vidas, porque preferimos adotar um “modelo”, um “padrão” que se encontra mais adequado aos interesses do grupo a que pertencemos.

Todavia, perdemos de vista nossos próprios valores, deixando de lado a valorização do ser em detrimento do ter. E assim é que criamos filhos totalmente despreparados e cujo nível de informação, embora alargado pela o próprio caminhar da sociedade, não está devidamente alimentado de noções primordiais de decência, honra, temperança e coragem. Ensinamos a eles a importância do uso do preservativo para prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, porém não lembramos a eles que o excesso de bebida pode ser prejudicial em todos os sentidos.

Mostramos os perigos escondidos nas vielas escuras do consumo de drogas, mas pouco nos importamos quando alguns deles ateiam fogo no corpo adormecido de um inocente. Sentimos um enorme orgulho quando eles obtém suas carteiras de habilitação, porém nos esquecemos de condená-los pela inconsequência no trânsito.

Do mesmo modo das consequências e responsabilidades decorrentes de uma gravidez inesperada ou não planejada. Permitimos, então, que eles continuem morando conosco, afagando-lhes a cabeça e consolando sua absoluta falta de compromisso com o mundo que os cerca.

Faz-se necessário, portanto, uma certa dose de equilíbrio: nem tanto autoritários, nem tanto possessivos, super-protetores, excessivamente descompromissados com a formação de indivíduos. Precisamos escolher o “caminho do meio”, aquele que nos permite um caminhar mais sólido e com passos mais decididos. Sob esta consideração, transcrevemos o verbete abaixo:

“Mas o carinho com os filhos não deve significar falta de exigência. Precisamente por serem queridos é que devem ser exigidos de maneira progressiva. Com efeito, as crianças que não se sentem exigidas pelos pais consideram-se menos queridas, já que recebem menos atenção. O carinho aos filhos deve levar, isso sim, a uma exigência compreensiva, isto é, proporcionada ao que se pode pedir a cada filho em cada momento. É preciso, portanto, que os pais sejam ao mesmo tempo exigentes e compreensivos, o que, evidentemente, não é fácil. Na prática, diante dessa dificuldade, os pais costumam polarizar-se numa dessas atitudes, de forma que a compreensão sem exigência cria pais permissivos, e a exigência sem compreensão cria pais autoritários”.2

Portanto, antes de nos preocuparmos com o futuro de nossos filhos, preocupemo-nos primeiramente com seu presente, com aquele exato momento em que percebemos que eles são indivíduos e assim devem ser tratados e considerados. Notemos sempre que a individualidade deles é a nossa percepção do que é certo e do que é verdeiro. Deixemos, pois, ao largo nosso sentimento de superioridade e de posicionamento social e desçamos até eles que sempre esperam de nós o nosso melhor.

Seguindo a esteira da ideia central do nosso trabalho, transcrevemos abaixo um excerto publicado pela revista CRESCER que muito oportunamente apresenta alguns problemas que surgem quando nos deparamos com a educação de uma criança. E isto vale tanto para nossos filhos como também vale para nós mesmos;

ERRO 1: Mentir: “Esse carro só liga quando todos os passageiros estiverem com o cinto. Só falta você colocar o seu”. Quantas vezes, você já se pegou mentindo para o seu filho para conseguir que ele faça algo que você deseja? Pode ser mentira ou chantagem, não importa. A relação entre filhos e pais deve ser o mais clara possível. Como ele vai confiar se você mente? “E não importa o quanto essa mentira seja insignificante, toda vez que você mente, você perde a chance de conversar abertamente”, diz a psicoterapeuta Teresa Bonumá, de São Paulo.

COMO CORRIGIR: Troque a mentira pela conversa. Seja objetivo e explique a situação em detalhes para a criança entender. Em vez de dizer que o carro só liga se o seu filho colocar o cinto, peça para ele colocar o cinto, porque só assim, vocês podem transitar com segurança.

ERRO 2: Ameaçar e não cumprir: Quem escolhe esse caminho, já sabe: da próxima vez que usar a mesma tática, seu filho não vai ouvi-la. Os exemplos são muitos: “se você não parar de jogar areia, vou tirar os seus brinquedos” ou “se você não me obedecer, vai ficar sem televisão”. Quando ele perceber que mesmo sem parar de jogar areia, os brinquedos continuam ali, não vai nem ligar quando você fizer o mesmo em uma próxima situação.

COMO CORRIGIR: Em vez de ameaçar, avise o seu filho. Se ele persistir, tome alguma atitude imediatamente. Da próxima vez que isso acontecer, apenas o lembre do que aconteceu: “lembra que você ficou sem os brinquedos da última vez que jogou areia? Espero que isso não se repita, combinado?”

ERRO 3: Desautorizar o pai (ou a mãe) na frente das crianças: Após aquela arte que seu filho aprontou, seu marido decide colocá-lo de castigo. Durante a conversa entre eles, você se intromete, dizendo que basta uma conversa. O mesmo pode acontecer na hora de decidir o valor da mesada, o horário de buscá-lo na festa e assim por diante. Ao questionar a decisão do seu companheiro, você diminui a autoridade dele perante as crianças.

COMO CORRIGIR: O melhor é sempre conversar antes de tomar a decisão. Se não for possível, não discuta na frente do seu filho. Espere para falar com o pai depois.

ERRO 4: Comentar os defeitos do parceiro com seu filho: “Seu pai é tão pão duro. Ele nunca vai comprar esse brinquedo para você”, “Nossa, sua mãe é muito atrapalhada, não consegue organizar as coisas”. Conversar sobre as falhas do seu parceiro com seu filho é tentador porque é ele que está no dia a dia ao seu lado, vivendo as mesmas situações. Mas não é um bom exemplo a ser dado. Em primeiro lugar, a atitude mostra desconsideração pelo pai (ou mãe) da criança. E, pior ainda, ela pode entender que pode fazer isso com qualquer pessoa também.

COMO CORRIGIR: O comentário pode ser feito, mas na frente da pessoa para que ela possa se defender e assimilar a dica. Ah, e isso até pode virar uma brincadeira.

ERRO 5: Quebrar as regras: Seu filho já sabe que não pode comer assistindo TV. Mas, um belo dia, você está almoçando às pressas e liga a televisão. Rapidamente, seu filho chama a sua atenção. Para tentar escapar, você inventa uma desculpa e diz que você pode fazer isso, mas ele não.

COMO CORRIGIR: Não tem jeito! O seu exemplo é a melhor solução. É ele que vai inspirar o seu filho a ser uma pessoa melhor.3