“CAÇADAS DE PEDRINHO E A ESTUPIDEZ TUPINIQUIM”

Quando escreveu  “Caçada da Onça”,publicada em 1924,Lobato queria apenas registrar um sonho irrealizado que era o de tornar-se caçador.
Numa carta á sua  esposa,D. Purezinha,ele confessa seu desejo de “matar a bicha”,uma das suas ambições,que justificava a subida á serra para lá encontrar uns caçadores de onça,atrás de uma que andava a fazer estragos nos pastos.E,faz a promessa: -se matar , levo-te um dente.Deste livro nasceu as “Caçadas de Pedrinho,hoje,vítima de tantas controvérsias.
De caçador de onças,muitos anos depois e sem sequer imaginar passar por isso um dia,o maior e nunca igualado escritor infantil,é vítima de uma caça ás bruxas,digna da Idade das Trevas,por determinados movimentos que enxergaram racismo onde existe apenas carinho e maldade onde existe ,apenas,afago familiar.
Já naquela época, a Emília,o alter ego do Lobato,dizia ao rinoceronte que morava no sítio,que o governo é uma entidade misteriosa,cheia de razões obscuras que não podem ser contestadas.
Mas,porque introduzir um animal africano,nas matas do interior de São Paulo? Responde o próprio Lobato:
-Exatamente para fazer uma coisa diferente.
Ele sabia como ninguém usar da ironia e do humor para denunciar e criticar o governo,sem ferir suscetibilidades nem afrontar ninguém.Mas,suas palavras nos levavam á reflexão sobre a nossa realidade.O que ele queria era “criar uma boa safra de adultos” pensantes,mas,infelizmente,fracassou.
Se houvesse racismo no Sítio do Picapau Amarelo,Tia Nastácia não seria a segunda pessoa mais amada e respeitada pelas crianças e,ainda hoje,idolatrada pelos  leitores do Sítio.Amiga e companheira de D. Benta,Nastácia mostrava a sabedoria e a força do  homem comum,na formação do povo brasileiro.
Como andava aos saltos ,em criança,era chamada de macaquinha e acusada de fazer macaquices,embora fosse branca e de olhos claros.Não existia bulliyng naqueles tempos serenos e as crianças não se sentiam hostilizadas nem discriminadas,nem corriam para a delegacia quando eram carinhosamente chamadas de “neguinhas”. Havia muita pureza naquelas crianças e nenhum rasto de ódio racial.
Digo que Lobato foi o meu pai espiritual; bebi sabedoria plena nos seus livros infantis e,através dele,conheci e amei a Mitologia Grega,as Ciências,  a Geografia e fiquei apaixonada pela História.E, um pouco Emília,como sempre fui, aprendi a ter liberdade de pensamento,a questionar,a debater,a perguntar e a procurar saber cada vez mais,sobre tudo.Só não aprendi a ser racista porque isso não me foi ensinado.Aprendi a respeitar povos e etnias,cultos e ideias diferentes das minhas.Também aprendi a ter coragem para defender minhas crenças.”O que vale não é ser gente grande,é ser gente de coragem”,ensinava ele,que foi responsável,embora  nunca  soubesse, pela minha espinha dorsal de aço inoxidável,aquela que nunca costuma se vergar aos poderosos de plantão.Porque Lobato também me ensinou que os poderosos passam ,mas,as verdades ficam.E,  a ter paciência com a Estupidez Humana,esta ,sim,eterna.
Presente ontem, como agora.
*Artigo publicado no site Artigonal e no blog “Lado Avesso”,da autora no dia 30/9/12
 http://mirokcaladoavesso.blogspot.com.br/


Miriam de Sales Oliveira
Enviado por Miriam de Sales Oliveira em 02/10/2012
Código do texto: T3912953
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