Hoje estou transparente

Enquanto seguia rumo ao trabalho resolvi observar o comportamento das pessoas que caminhavam e passavam pelas ruas. O quanto são dispersas e não param um segundo nem mesmo pra dizer um oi. Os carros trafegam “voando”, deixando pra trás apenas a sujeira do escapamento, as salivas que são gastas durante o tempo em que caminham ficam presas no celular. Pontos de ônibus lotados de pessoas que esperam incansavelmente a condução para mais um dia de trabalho. Nas lojas, vendedoras arrumando manequins, trocando roupas de lugares, sentadas ou debruçadas sob o balcão. Ninguém conversa, nem cumprimenta o outro a não ser que já se conheçam. Isso chega a ser triste! E o respeito então? É assustador! Não sei quantas vezes tive que parar no meio do caminho para esperar alguém atravessar a rua, e a quantidade de carros que atravessavam na preferencial sem nem mesmo olhar para os lados? Depois acidentes fatais acontecem e ninguém sabe o porquê, já que após a morte todo mundo vira “santo”. Falta de responsabilidade e consideração.

Durante o trajeto encontrei pessoas de todas as formas, algumas sorridentes (quantidade ínfima), outras distraídas, algumas numa seriedade que dava medo. Dos restaurantes pessoas saíam para voltar ao batente, nas padarias adolescentes. Os bares repletos de “desocupados” – com exceções é claro – as sorveterias a todo vapor. Em alguns lugares uma “muvuca danada”, em outros ‘tranquilíssimo’. Cada passo dado era uma nova figura avistada. Resolvi parar e tomar um suco (tentando observar um pouco mais), do meu lado pessoas totalmente diferentes, alguns engravatados, conversando sobre negócios; do outro algumas senhoras, que possivelmente não se viam há tempos, comentando sobre a vida durante o tempo em que não se viram. É engraçado isso, toda essa diversidade existente. Todas essas pessoas conversando, trocando ideias, sendo simpáticas umas com as outras e depois que colocam o pé na calçada e saem do estabelecimento mudam completamente. Não sorriem, muito menos são gentis. Entram e saem de lojas incessantemente, não fazem amizades novas, não perguntam como o outro está – a não ser que seja por obrigação e superfluamente – estão sempre correndo como se o mundo acabasse naquele exato momento. É tão simples ser um pouco mais complacente, observar com mais cuidado, olhar ao redor, sorrir mais, sentir o delicioso cheiro que sai das padarias, lanchonetes e restaurantes, deliciar-se com um suco gelado de uma tarde quente. É tão bom ter um tempo pra você mesmo, nem que esse seja minutos. Se todos soubessem aproveitar essas pequenas coisas nem a depressão existiria mais.

Portanto, se você chegou até aqui nesse artigo é porque concorda com minha opinião, é porque sabe que é isso mesmo que acontece em todos os lugares do país, ou melhor, do mundo. Ninguém está nem aí com nada a não ser com o próprio umbigo. Estão todos pensando no que precisam fazer, no dinheiro que irão receber, nas contas que precisam pagar e acabam esquecendo que a vida lhes foi concedida pra ser aproveitada e não descartada e jogada no lixo como estão fazendo. E é por esse e tantos outros motivos que ainda prefiro continuar transparente e observar as pessoas de maneira diferente. Faça um teste, tire 30 minutos do seu precioso tempo e faça alguma gentileza, olhe pra pessoa ao seu lado e diga: - como está linda hoje, pergunte como foi seu fim de semana ou o que fez no último feriado, cumprimente alguém na rua – mesmo que não conheça – ria de bobagens, alimente-se mais devagar, dê mais valor nas coisas simples. Queira, também, de vez em quando e por alguns minutos ser um pouco transparente.

Artigo originalmente publicado no jornal impresso - Folha Extra/ Wenceslau Braz-PR