O aborto e seus extremos

Os grandes temas polêmicos dividem a sociedade em pelo menos dois grandes blocos: os totalmente a favor e os totalmente contra. Este é o caso da legalização do aborto. A polêmica reside no fato de o aborto ser uma prática que tira a vida de uma pessoa e isso já é argumento suficiente para a Igreja se manifestar contra ele. Na outra ponta, movimentos sociais mais contemporâneos – como os de feministas, por exemplo – defendem o direito à liberdade de escolha individual.

Não é possível querer que a Igreja se posicione de forma diferente. Uma Igreja que não defenda a vida não tem o direito de se constituir como um pilar social. E os que seguem a voz comandante da fé não discutem quanto ao aborto não ser senão crime. Também não se pode afirmar categoricamente que as pessoas não possam ter o direito sobre o seu próprio corpo. A mãe, em último caso, é a voz da autoridade máxima na decisão de interromper uma gravidez.

Mas todos os extremos são igualmente ruins para os homens, pois eles vestem na sociedade uma camisa de força que pode resultar em danos irreversíveis. É preciso ter em mira uma realidade: mães que têm dinheiro fazem o aborto em condições adequadas. Entretanto, a imensa maioria da população brasileira é pobre e desprovida de informação suficiente. Diante da necessidade de recorrer ao aborto, mulheres mais pobres o fazem em clínicas suspeitas e na clandestinidade, colocando também a própria vida em risco.

A legalização do aborto – e, como tal, deve haver, sim, uma legislação especificando as regras para se aceitar a prática do aborto como aborto e não como homicídio – oferece às mães mais carentes a possibilidade de interromper uma gravidez indesejada sem pôr em risco a sua vida. É bom lembrar que também os profissionais da saúde que aceitam infringir a Lei precisam ser igualmente penalizados. Nestes momentos, deve entrar em ação o poder fiscalizador. Sem ele, todo o ônus e toda a culpa voltam a cair sobre os ombros frágeis de mães que, muitas vezes, se encontram sozinhas para tomar a sua difícil decisão.

A discussão em torno da vida se prolongará por todo o sempre. Afinal, é a dinâmica da própria vida que deve movimentar o ser humano. Isso é bom. É um sinal de que estamos preocupados com os que vieram e também com os que ainda estão por vir. É sinal, mais do que tudo, de que quem está por vir pode, afinal, representar a felicidade tão procurada por toda a humanidade.