Kenneth Janda, em seu artigo Political Science: the state of the discipline, informa que os partidos são tidos como grupos que objetivam a conquista do poder ou grupos que competem entre si, por via eleitoral, para o alcance e a manutenção do poder.
Para Kelsen, a democracia indireta é aquela que a função legislativa é exercida por um parlamento eleito pelo povo, e as funções administrativa e judiciária, por funcionários igualmente escolhidos por um eleitorado. Assim, um governo é ‘representativo’ porque e na medida em que os seus funcionários, durante a ocupação do poder, refletem a vontade do eleitorado e são responsáveis para com este.
Já para Bobbio, filósofo político e senador italiano, partidos políticos devem ser entendidos como o principal instrumento por meio do qual grupos sociais exprimem as próprias reivindicações e necessidades, bem como devem participar da formação das decisões políticas.
Olhando o para-brisa e enxergando as ruas, percebe-se que as palavras supraditas pouco se conectam com a realidade brasileira. A maioria dos partidos políticos ficou anacrônica e sofre de artrose severa em sua estrutura e funcionamento. Volta-se para interesses próprios e outros corporativos entre eles. Atuam com finalidade neles próprios.
Quando o povo grita aos quatro cantos que políticos não o representa, caso das manifestações do Rio de Janeiro, São Paulo, Fortaleza e outras cidades, é porque perderam a legitimidade na realidade fática do plano social. O Estado existe para atender aos desejos, às necessidades e os interesses coletivos da sociedade. Os governos fazem acontecer essas demandas por meio da Administração Pública, que opera a execução das políticas públicas delineadas pelo Executivo e Legislativo. Agora, parece que o povo está declarando a sua falta de confiança nas autoridades oficiais.
O desencanto com a postura política e gerencial de governantes, políticos e gestores públicos, aliada a descrença dos muitos que se locupletam dos cargos que exercem e estão nele para isso mesmo, destrói qualquer possibilidade de apostar em algum futuro promissor para as pessoas da classe média e para os pobres.
O descrédito frente a impotência do Estado no combate às drogas e a constante e sofrida luta para reduzir a violência urbana e rural nos estados nacionais evocam a incompetência estatal para solucionar problemas que se avolumam porque as instituições brasileiras estão defasadas em termos quantitativos e qualitativos para atuarem na eliminação e/ou mitigação desses enfretamentos. Dizem faltar recursos, mas o povo percebeu que para os estádios sobram desvios e outras atrocidades. Na verdade, há recursos com prioridades invertidas. Quem está fazendo a pauta das necessidades e aspirações do povo brasileiro?
A Primavera Árabe eclodiu e já fez cair dois presidentes no Egito. O movimento Occupy Wall Street, iniciado em setembro de 2011, em Manhattan, protesta contra a desigualdade econômica e social, a ganância, a corrupção e a indevida influência das empresas - sobretudo do setor financeiro - no governo dos Estados Unidos. Atualmente, o movimento continua denunciando a impunidade dos responsáveis e beneficiários da crise financeira mundial. O grupo hacker Anonymous, responsável por ataques em sites de governos e também ao Facebook, afirmou que fez isso porque a rede social tem auxiliado governos, vendendo informações de usuários e garantindo acesso clandestino para firmas de segurança que espionam pessoas de todo o mundo.
Isso é um nano flash do mundo real versus o virtual. Os enfrentamentos transformaram-se. Há um novo vetor de comunicação, mobilização, transparência, coordenação e ação funcionando em bases multirradiadas e sinérgicas. Aliado a isso, as lideranças são difusas e sem autoridade representativa concreta no mundo real.
Portanto, é ora de atualizar-se e entender o que representa uma democracia pós-moderna. Partidos poíticos sempre atuarão na democracia. É por intermédio deles (ou deveria ser) que as políticas públicas tornam-se realidade, assim como eles contribuem para manter e aprimorar a doutrina do exercício da cidadania. Não há vazio de poder, o poder será sempre ocupado, se os partidos não estão fazendo a sua parte a insatisfação conduzirá a massa para outro tipo de liderança e esperança: a que eles escolherem e adotarem, mesmo que em um segundo momento, como a história sempre registrou, uma liderança menos flexível se instale e governe fortemente, até sem a força desse próprio povo.
Preservar as instituições em tempos atuais é um exercício pleno de sacerdócio público. Governantes não podem continuar apresentando ações pouco sustentáveis e paliativas endereçadas aos problemas socioeconômicos nacionais.
Relevante entender a voz das ruas. A massa humana deve ser compreendida na sua totalidade, preservando direitos, respeitando à diversidade e caminhando para o plural entendimento das questões das minorias. É só adiante, só progresso.
Caso as instituições legislativas e aquelas outras inerentes às entidades do Executivo não consigam se expressar pelos resultados direcionados ao povo, por tudo aquilo expresso em suas cartas magnas municipais, estaduais e federal, os cidadãos buscarão utilidade fora das instituições e dos partidos políticos.
O objeto que move as manifestações hoje é o conjunto de insatisfações com os serviços públicos oferecidos, desconfiança generalizada nas autoridades e o conhecimento da paralisia e da obsolescência das gestões públicas nacionais. Isso tudo pode não ser tão verdadeiro assim, mas é um caminho para tentar compreender e tentar debelar a fúria resultante das insatisfações, assim como atender aos apelos da mobilização por um Brasil mais justo, mais igual e menos corrupto, aliado a menos desvios, mais ética e mais gestão eficaz da coisa pública.