A Rolinha Barriguda

Quando colocamos alpiste e canjiquinha no quintal, porque preferimos ver os passarinhos comendo e indo embora depois, observamos que uns parecem querer a comida só para eles. Porque ficam impedindo que os outros comam também. Obviamente não tiveram noção, dentre outras coisas, das diferenças entre socialismo e capitalismo. Prevaleceu apenas o comportamento instintivo.

Até nisso não nos diferimos muito dos outros animais.

A água foi disponibilizada por uma força maior e está na natureza (ou essa força maior não é a própria Natureza?) para o uso de todos. No entanto, ela é industrializada e vendida. Para que possa ser consumida por todos. Até aí nada demais. Há um custo na sua industrialização, tratamento, engarrafamento, etc. Se é distribuída através de tubulações a prédios residenciais, também devem ser consideradas as necessárias implicações financeiras. A questão é que, sob a ótica capitalista, o preço de venda é sempre maior (normalmente o maior possível) que o custo da produção. Porque tem que contemplar a remuneração dos trabalhadores e o lucro do produtor. Que nunca deve parar de crescer. Ao contrário do ganho dos trabalhadores.

O mesmo ocorre com outros materiais, metais, minerais, etc. que encontramos na natureza. Para os passarinhos o ouro não tem nenhum valor diante do alpiste. Para o homem, não. Trata-se de um metal que ele aprendeu a considerar como muito valioso, devendo por isso ser comercializado sempre sob o maior preço de venda possível. Função da sua raridade ou pouca disponibilidade na natureza em relação a outros metais não tão valiosos. Exatamente por serem mais fáceis de se encontrar.

Desse modo, podemos entender porque certos países forjam guerras e invadem outros países por causa, por exemplo, do petróleo, do urânio para o enriquecimento de artefatos nucleares e de outros minerais e riquezas naturais. Daqui a pouco, países como o Brasil correrão o risco de serem invadidos. Porque nosso país “detém cerca de 12% da água doce superficial do planeta” e, como sabemos, esse bem precioso começa agora a não estar tão disponível na face da terra ou no seu interior.

Guerras são forjadas e vencem os que são mais fortes ou estão melhor aparelhados em termos bélicos. Tal como a barriguda da rolinha, que espanta os outros passarinhos, e até mesmo alguns canários, para comer sozinha.

A partir daí, podemos chegar, ainda que tangencialmente, a algumas conclusões básicas a respeito do que sejam capitalismo e socialismo.

No capitalismo importaria o triunfo pessoal. Se sou mais capaz, devo usufruir do melhor. Quem for igual a mim, que faça o mesmo. Não é justo que eu ajude o outro com o que tenho (ou acumulei) ou com o que custei a ganhar. Todos devem trabalhar, produzir como eu e que ganhe mais o mais forte, o mais capaz. Ou o mais sabido e engenhoso – o mais esperto.

No socialismo, embora certos capitalistas achem que não, não se inibe o triunfo pessoal. Só que ele é também coletivo. A capacidade individual devendo sempre ser usada em benefício da coletividade. Não implicaria no empobrecimento da potencialidade do indivíduo. Cuja recompensa seria o uso da sua parcela maior de capacitação pessoal a favor do maior número possível de seus semelhantes. Ensejando uma possibilidade mais concreta do exercício da solidariedade. Possivelmente pessoas que crescessem num ambiente sob tais condicionamentos tenderiam a ser mais solidárias umas com as outras.

Nessas circunstâncias, talvez pudéssemos domar os nossos instintos naturais em prol do reconhecimento de que todos, ou a maior parte, deveriam dispor, dentro do que fosse possível, dos benefícios por mim conquistados a partir da minha capacitação pessoal.

Mas isso é o que também acontece no universo capitalista. A vacina Sabin, ao que parece, não foi desenvolvida num país sob o regime socialista. E, no entanto, sua produção só fará sentido se puder ser usada em qualquer pessoa. A telefonia celular, a internet e todos os benefícios (como também os malefícios) da parafernália tecnológica estão accessíveis a muitos. Não foram originalmente criados para se transformarem em monopólio de alguns. Embora possa ser o monopólio, em muitos casos, de um conglomerado de empresas.

A questão fundamental do capital é a venda de tudo pelo maior custo possível. Enquanto a do social deveria ser a de vender tudo pelo menor custo possível. Sob este aspecto, as duas ordens político-social se complementam. Porque quem vende tem de ter público para comprar. A produção material, intelectual e até religiosa nada será se não tiver a quem ser direcionada. Agora, essa produção poderá ser boa e cara ou boa e barata. A segunda opção não nos parecendo muito lógica. Já que estamos acostumados a considerar que tudo que seja bom tem obrigatoriamente de ser caro.

Talvez fosse o caso de nos aproximarmos dos gregos da antiguidade. Para quem o ideal seria o meio termo. Ou seja, um pouco do capitalismo e um pouco do socialismo. Ficando claro que tudo o que for produzido, pensado e empreendido terá sempre como alvo a coletividade.

Rio, 12/07/2013

Aluizio Rezende
Enviado por Aluizio Rezende em 12/07/2013
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