Voo Livre

Bater as asas e voar essa é um dos primeiros acontecimentos, depois de comer, em que os pássaros aprendem a fazer. Suas mamães são obrigadas a empurrarem os frágeis filhotinhos de cima de árvores, penhascos ou qualquer lugar alto para os ensinarem a dar seus primeiros “passos” sozinhos. Assim como os pássaros, o homem também aprende a voar. Cada qual com sua dificuldade.

Durante muitos anos é a família quem coordena cada passo de uma criança, auxilia e ensina desde o seu primeiro balbuciar até o momento do: “mamãe estou indo embora” – uma das horas mais difíceis na vida materna –, entretanto a comparação entre o pássaro e o homem tem alguns embates, sabendo que o homem não aprende a “voar” tão cedo e, algumas das vezes, não tem apoio da família e precisa tomar essas decisão sozinho, portanto se formos equivaler as duas “espécies animais” – aves e humanos – o homem seria quase um albatroz, que só consegue voar se o vento estiver favorável, com o ser humano acontece da mesma forma, só conseguem voar quando algo os favorece e os incentiva para realizar tal feito.

O ato de sair de casa para “cuidar da própria vida” é uma das decisões mais difíceis, complexas e, talvez, radicais já tomadas, entretanto é uma escolha extraordinária, já que viver sozinho irá fazer da pessoa um alguém maduro, com conceitos e valores próprios, tendo uma visão mais ampla sobre o mundo. É tão fácil acordar doente e pedir um chazinho para a mamãe ou então ter que tomar uma decisão importante e pedir ajuda aos pais. Se prestarmos atenção, quando estamos rodeados pela família, é tudo decidido por eles, é claro que nós sabemos o que é melhor para nossa vida, entretanto há uma grande “intromissão” – se assim me permitem mencionar – dos pais na vida de um filho, o que é natural, já que foram eles quem incentivaram e ensinaram tudo a seus pequerruchos, portanto têm um amor incondicional sobre esses pequenos, que jamais deixarão de serem crianças para seus genitores.

São muitos os motivos que fazem do homem a necessidade de sair de casa. Estudar e trabalhar são os principais fatores que incentivam às pessoas tentarem viver longe da família. Alguns são tão corajosos que resolvem morar em outro país, outros são menos radicais e vão para alguma cidade por perto, mesmo assim é um grande sofrimento para a família esse corte do cordão umbilical, que acontece tão rapidamente. Já ouvi relatos de pessoas que optaram por essa alternativa e hoje são integralmente felizes, porque aprenderam a ver a vida de uma forma diferente, conseguem ser decididas, são maduras e sensatas para saber das dificuldades enfrentadas a cada passo dado no caminho da construção da vida, mas também, ouvi histórias de indivíduos que se tornaram arrogantes e mesquinhos, olhando para o próprio umbigo e esquecendo da vida que tivera ao lado dos pais quando pequenos. Muitos que agem de tal forma deixam a família em segundo, ou melhor, em quinto plano, esquecem de suas raízes, têm vergonha – algumas vezes – de mostrar a infância humilde pela qual passou. Entre um caminho e outro, há quem se arrependa da decisão que tomou, entretanto esse é o caso mais simples, voltam à casa dos pais e tudo continua como era, porém a pessoa já tem uma bagagem diferente da que tivera antes de tais acontecimentos, ou seja, querendo ou não aprendeu um pouco ao estar fora de casa sozinho.

As dificuldades enfrentadas por quem opta pelo “voo livre” são gigantescas, cada passo dado pode ser crucial ao futuro pessoal, profissional e social da pessoa que fez a escolha, lembrando que além de Deus, apenas ela pode cuidar de si mesma, o que condiciona a pessoa a ficar mais atenta e esperta aos acontecimentos de sua vida, contribuindo para esse amadurecimento citado no parágrafo acima.

Há psicólogos que incentivam o “corte do cordão umbilical”, apoiam a escolha e ainda afirmam que é uma das atitudes mais corretas a serem tomadas na vida de alguém, que aprenderá a dar valor não só no que conseguir adquirir durante esse “tempo solitário”, mas até mesmo na família.

Se formos observar minuciosamente, é fato que o ato da separação é muito drástico e muitos de nós não gostaríamos de ter, contudo é uma das formas mais sensatas de se aprender a viver, já que seremos nós por nós mesmos. Por fim gostaria de propor uma pequena reflexão aos leitores que chegaram até esse ponto do artigo. Como está nossa vida nesse exato momento? Se você está longe da sua família faça um breve flashback e veja se valeu a pena ter se esforçado tanto (posso garantir muitas lembranças boas), observe no que isso acrescentou em sua vida. Agora você que está pensando em optar por “pular do penhasco” e “bater as asas” pense bem e organize suas ideias, veja os pontos positivos que isso trará para você, não tenha medo do estranho, nada que, apenas, imaginamos acontecerá, devemos ser práticos naquilo que escolhemos para a nossa vida, ou então, nada nunca acontecerá. A vida não se faz, só de palavras, mas sim das atitudes que tomamos.

Originalmente publicado no periódico Folha Extra.