Inútil Cultura

INÚTIL CULTURA

Um leitor ligou, a respeito de algumas coisas, bobagens segundo ele, que a gente é obrigado a aprender na escola, e depois não usa na prática da vida. Primeiro - diz ele - é a matemática; para quê aprender tanta coisa se a calculadora e o computador fazem o essencial? Não sei raiz quadrada até hoje... Depois, qual a finalidade de nos ensinarem o Pai-Nosso em Inglês (Our Father who art in Heaven..) , o Hino da França (Allons enfants de la patrie...), os rios do Canadá (o Ottawa, o São Lourenço, o Nelson), as fábulas de Esopo (Aesopus auctor quam materiam reperit... ) as ilhas da Grécia ( Patmos, Lesbos, Delos, Mikonos...) e outras coisas que se tornam desnecessárias?

Observando a fundo, não posso deixar, de dar razão ao amigo leitor. Nos países desenvolvidos, top em educação, eles só aprendem coisas de utilidade, investem mais na cultura técnica. No Terceiro Mundo sempre quisemos dar uma de “cultura geral”, autêntica cultura inútil. À noite, minha mulher se queixava de falta de memória. Embora me lembre - dizia ela - de coisas que aprendi há cinquenta anos, tenho dificuldade em memorizar dados recentes. Falei-lhe da carta do leitor e chegamos à conclusão que o cérebro humano é como um “winchester” de computador. Chega um tempo em que ele fica lotado de informações. Na informática dá para apagar ou fazer um Up-grade, ou seja, trocar por uma peça de mais memória. Em nossa cabeça isso não é possível. E como armazenamos dados inúteis!

Minha mulher tem extrema facilidade para guardar números, de telefones, de contas, senhas, placas de carro, de casa, etc. Ela se jacta de lembrar o número de telefone de nossos amigos da Paraíba, de onde saímos há mais de vinte anos. Eu sou uma besta para números. Se a telefonista me informar um número e a ligação der ocupada, eu já o esqueci na hora de nova discagem. No entanto, consigo decorar textos enormes com muita facilidade. Mas tudo isso toma espaço. Não tem razão o Clemente Pinto (autor da “Seleta”) quando diz que o saber não toma espaço. Toma sim, e como!

A gente devia possuir um mecanismo que possibilitasse deletar dados inúteis, para evitar o armazenamento de informações defasadas como, por exemplo, as historinhas infantis que nos contaram na infância, ou endereço completo de gente que já morreu. No Windows tem a “lixeira”, onde se coloca informações julgadas dispensáveis. A memória faz parte da essência antropológica da pessoa, mas não precisamos exagerar... Às vezes um dado inútil, superado, toma o lugar de uma informação importante.