Filhos do Medo

Nunca me contaram histórias dos meus parentes ou amigos de parentes que sejam LGBTs. Nunca me contaram histórias sobre homens que se beijam e mulheres que tem relações sexuais e vice-versa. Sempre me contaram histórias de figuras - e hoje sei que são personagens - que iriam me levar para longe caso eu não fizesse o que meus pais quisessem. Histórias sobre ficar longe de sujeitos estranhos pois eles me colocariam em sacos e me levariam para fazer sabões de barra.

Também nunca me ensinaram a ter empatia por ninguém. Me ensinaram apenas a sentir pena dos próximos a mim e que se não sentisse, com certeza eu era alguém não muito bom. Sempre me ensinaram a ter medo e jamais respeito. Medo de ser abandonado, expulso ou amaldiçoado, nunca pude contar o que meu coração dizia pois tinha medo enraizado já no meu coração juvenil. Adultos não contam para os jovens que o respeito também se ganha e apenas nos mostraram que respeito que eles tanto pediam de nós era apenas uma coisa conquistada na base do medo.

Se ao invés disso, tivessem me ensinado que eu deveria procurar e ser aquele que eu era no fundo da minha alma, teria sido mais fácil. Pois o difícil é ter que aprender com tanto preconceito e ignorância que grita, chuta, bate, maltrata e repudia. Se tivessem me ensinado que comprar o que eu quiser e me nomear o que eu quiser fosse tão simples e até banal quanto somar 1 + 1, eu teria me descoberto sem tantas cicatrizes para contar. E eles é claro, iriam aprender na vez deles que não se deve fazer do seu filho a representação dos sonhos deles como pais, apenas criar pessoas boas, de caráter e que sejam felizes com sua personalidade.

Pessoas precisam serem amadas e de receberem carinhos porém muitas vezes o preconceito e intolerância conflitam com isso. Quando as coisas são proibidas e despertam tanto desejo, quase nos parece que é loucura nossa e crime por sentir desejo de curiosidade. O mínimo desejo, a liberdade de decidir que aquilo ou alguém é certo para si e para sua vida. Vão deixando nossas cabeças ainda mais emboladas que a adolescência já faz por si só. 

Se boa parte fosse aberto para perguntas e uma boa conversa, talvez nós não teríamos vivido tantos anos assombrados por dúvidas. Não teríamos ido perguntar a terceiros, quartos e nem procurar respostas em locais e situações perigosas. O medo nos diminui e nos separa, cega nos olhos e nos trás tantas questões pessoais. Se não fossemos filhos desses medos e dúvidas, talvez nunca tivéssemos medo de perguntar e esperar o pior.

Texto: Raphael Maitam (Data: 13 de Maio e 17 de Junho)

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