AQUI, O HAITI E O HAVAÍ.
(Goulart Gomes)

Estou abismado! Foi desenvolvido um aplicativo que informa ao cidadão onde estão acontecendo tiroteios em uma determinada cidade. Não, isto não está acontecendo em Mossul, no Iraque, nem em Palmira, na Síria, mas aqui mesmo no Brasil. E pelo sucesso do aplicativo, logo, logo, outras cidades estarão adotando também.

Mais entristecedor, ainda, é saber que por trás desse fenômeno negativo não está nenhum conflito ideológico ou religioso (o que também não justificaria a violência), mas sim o tráfico de drogas. Drogas que tem os seus produtores, traficantes, entregadores, mas também quem as consome, e faz o círculo vicioso girar.

Retrato trágico de um país desgovernado, em todos os sentidos, que se tornou refém da corrupção, do crime, do suborno, do delito, do nefasto "jeitinho" brasileiro, que corrompe do agente público ao policial, do senador ao magistrado, do empreendedor ao trabalhador.

Trabalhador, por sinal, que é quem paga a mais alta conta, muitas vezes com a própria vida. A imagem que utilizei para ilustrar este texto foi extraída de uma matéria chamada "Socorro, estamos morrendo aqui", escrito por Cléber Araújo, morador do Complexo do Alemão, publicada no site Agência de Notícias da Favela. Nele, o autor diz: "É algo inimaginável pensar como é ficar horas e horas ao som das 'metralhadoras' e o zumbido das cápsulas a cair no chão, o frio que sentimos na espinha ao sentir o perfurar nas paredes e o corre corre para se abrigar com urgência para não ser também um fácil alvo de uma 'bala dita perdida'”. A matéria é de 2015. Será que alguma coisa mudou de lá para cá? Uma "imersão" que fiz, há um ano, na comunidade de Vila Joaniza, Ilha do Governador, no Rio de Janeiro, quer me dizer que não.
"As grades do condomínio são para trazer proteção, mas também trazem a dúvida se é você que está nessa prisão", diz a música da banda O Rappa. Mas se as classes sociais melhores posicionadas na pirâmide se queixam das consequências do crime, imagine quem tem que conviver com ele, lado a lado.

Como se não bastasse, o efeito colateral é igualmente desalentador. Por descrença total nos políticos "convencionais", a população passa a validar pensamentos de extrema-direita, acreditando em pessoas que defendem o uso desenfreado da violência, a aplicação da pena de morte e o armamento da população como soluções, sem se deter nas causas básicas de todo este problema: a falta de oportunidades profissionais e de educação de qualidade.
Uma matéria recente, de um grande veículo de comunicação, afirma que o atual sonho da classe média brasileira é se mudar para Portugal. Triste situação, de pessoas que se auto-exilam por não verem mais perspectivas, não terem mais esperanças em seu país, e desejarem um futuro digno para seus filhos.

A imagem desta foto, por si só, já diz tudo: uma mulher agachada, com as mãos nos ouvidos, esperando que cesse o tiroteio para seguir em frente, sendo observada por um policial em ação. À frente dos dois, por trás da câmera ou do celular, um fotógrafo, que registra a cena, e deve estar igualmente aterrorizado.

O célebre filósofo romano Cícero, imortalizou-se por sua capacidade oratória. Uma de suas mais frases célebres é "Quousque tandem abutere Catilina patientia nostra?". Até quando, Catilina, abusarás de nossa paciência?, referindo-se a um de seus adversários políticos. Cabe-nos perguntar: Até quando, senhores governantes, permitirão que o povo que os elegeu seja cruelmente assassinado, diariamente, enquanto carregam malas de dinheiro ilegal, usam e transportam drogas lícitas e ilícitas, e compram joias caríssimas para suas esposas e amantes? Até quando nós continuaremos a eleger estes mesmos homens? Até quando esperaremos? Quousque tandem?
(Goulart Gomes,30/06/17)
Goulart Gomes
Enviado por Goulart Gomes em 30/06/2017
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