A IDADE DO CORAÇAO

A IDADE DO CORAÇÃO

Visitei um amigo enfermo, com problemas cardíacos. Aos cinqüenta e poucos anos, em função de muito cigarro, bebida e estresse, o coração começou a falhar e ele teve que baixar o hospital. Mesmo no leito do hospital, ele falava em uma nova fase de sua vida, fazendo planos, na esperança de ter mais alguns anos de vida. Depois de muitos fracassos, ele havia voltado a amar a alguém, com paixão e destemor, aliás, característica dos apaixonados. O brilho de seus olhos atestavam essa emoção, Disse-me ele que, na expectativa de vê-la chegar, seu cansado coração dispara, as mãos ficam frias e ele se surpreende mordiscando os lábios, como um adolescente no fogo do primeiro romance. Eu saí do hospital pensando nas lições que a vida nos dá, mesmo nas circunstâncias mais inesperadas. Quando amamos, o coração não tem idade nem estado de conservação, mas assume um processo de envolvimento, em torno da pessoa amada, esteja ela próxima ou distante. Quando alguém ama, aguarda um telefonema, uma carta, um e-mail ou uma visita da outra pessoa, e isso faz disparar o coração, subir a adrenalina, excitarem-se as glândulas. Pior é quem não pode amar, não sabe amar, ou vive naquela fantasia de algo, que embora sonhado e expectado, nunca ocorreu de fato. Na verdade não amamos com o coração; trata-se de um eufemismo dos românticos. O coração em si é um músculo, feio e irrequieto, ao qual atribuímos a função de amar. Nós amamos com a mente, com os gestos, com toda a energia vital de nosso ser. Uma história de amor, tenha ela final feliz ou não, é engendrada a partir dos sentimentos, desliza pelos sonhos e busca realizar-se no encontro a dois. Encontro esse que às vezes se espera, dez, vinte anos... Quando o amor dá um sinal, falamos com a pessoa amada, ou simplesmente temos despertada a possibilidade de um colóquio ou de um encontro, o coração se agita, independente da idade que se tenha, torna-se jovem, e de novo somos adolescentes, a espera de algo fantástico, que mesmo sem ter acontecido, imaginamos inesquecível. A pessoa humana nasceu para amar e ser amada, e não se realiza enquanto esse processo, crescente e recíproco não é deflagrado. Quem ama vive, mesmo que o outro esteja distante e que o encontro não tenha sido tão real; espera seu amor, ainda que ele não chegue logo; curte até o encontro, em especial aquele que não aconteceu, vive o momento tentando torná-lo eterno. O coração de viver, às vezes, por causa do tempo, falha, mas o de amar, por renovado, esse nunca se torna cansado...