O capitalismo politicamente correto

A conscientização da sociedade pode humanizar um sistema econômico como o capitalismo? Se o consumidor deixar de ser apenas 'consumidor' para ser 'consumidor-cidadão', como isso pode ser importante para conduzir uma sociedade rumo à plena civilização?

A demissão do cineasta James Gunn, após seus tweets (publicados de 2008 a 2011) que fazem piadas com pedofilia e estupro virem à tona, oferece alguma luz sobre essas questões. A Walt Disney Pictures mandou-o para o olho da rua mesmo ele sendo um diretor e produtor que trabalhou em recentes filmes de sucesso. Seu currículo foi desconsiderado porque a conduta agora se sobrepõe sobre o talento. Segundo a empresa, Gunn teve atitudes "indefensáveis e inconsistentes com os valores do estúdio, e nós rompemos nossa relação de negócios com ele".

Por trás desta postura louvável da Disney talvez haja o medo do boicote. Isso porque o consumidor de hoje não é mais um consumidor 'alienado', mas um consumidor consciente e não raro ativista. Hoje alguém pode deixar de usar uma marca se descobrir que tal empresa usa de trabalho escravo, se tem racista, homofóbico ou algum criminoso sexual em seu quadro de funcionários.

O empregado não é mais um individuo cujos os atos só devem ser associados à empresa se ele fizer tal coisa enquanto trabalha. Não. Com as novas tecnologias da informação, como a internet, houve uma revolução na estrutura e reputação da empresa porque a informação ganhou muito mais importância, fazendo com que o consumidor priorize mais a marca, a imagem da empresa em si.

Querendo ou não, James Gunn estava associado à imagem da Disney. Os fãs o admiram principalmente pelo seu trabalho na série de filmes "Guardiões da Galáxia". Se ele fazer escárnio de estupro e pedofilia em uma rede social, isso vai induzir o consumidor consciente a questionar a empresa se ela concorda com tal visão. Mantê-lo como empregado significa, para o consumidor, que a resposta para esse questionamento é sim. Então surge a possibilidade de boicote o que significaria prejuízos financeiros. O que resta é a demissão a partir de valores criados e enfatizados pela empresa.

Especialistas em comunicação chamam essa postura de "responsabilidade social". Por medo de boicotes, as empresas firmam compromissos ambientais, humanistas e sociais. Mas essa conscientização do consumidor está avançada mais em umas sociedades do que em outras. Aqui no Brasil progredimos nesse aspecto. Vimos casos recentes como o do jornalista William Waack, demitido da TV Globo após o vazamento de um vídeo onde ele faz uma piada racista, e do youtuber Júlio César Pinto Cocielo, que perdeu patrocínios de empresas por causa de piadas racistas no Twitter.

O capitalismo está mais "politicamente correto" porque a sociedade também está.