QUATRO TRAÇOS CULTURAIS BRASILEIROS QUE AFLORAM COM AS CRISES

*Por Herick Limoni

O ano de 2020 não tem sido fácil, até agora, para nós, brasileiros. Já no mês de janeiro, muitas regiões do país sofreram com volumes recordes de chuvas, ocasionando tragédias de norte a sul do país, com mortes, deslizamentos, soterramentos e milhares de pessoas desalojadas e desabrigadas. E ainda teremos os problemas advindos com a dengue, mal de países subdesenvolvidos que não conseguem erradicar tais doenças em razão da falta de saneamento básico na maioria das localidades brasileiras. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), de 2018, apenas 66% das residências brasileiras têm seu esgoto devidamente coletado – ainda que saibamos que grande parte dessa coleta é despejada, sem nenhum tratamento, em cursos d’água diversos. A falta de saneamento para uma grande massa de brasileiros ajuda a explicar as 754 mortes por dengue em 2019, segundo dados do Ministério da Saúde (MS).

Passadas as chuvas torrenciais, mais incisivamente no mês de março, muito em razão das massivas notícias internacionais, o brasileiro se depara, então, com o CORONAVÍRUS – sabe-se, hoje, conforme informa o próprio MS, que a doença aportou no Brasil em Janeiro, apesar de ser alardeada somente em março. Essa endemia, que logo se transformou em pandemia, vem assustando alguns, enquanto outros não têm se preocupado tanto. Não podemos julgar aqueles que se sentem à porta do apocalipse, em razão da ampla, sistemática e incessante cobertura jornalística, que, como sabemos, deleita-se sempre que há uma tragédia. Também não podemos julgar os que continuam levando sua vida de uma forma quase que normal, por não se sentirem tão ameaçados, ou por não poderem, por qualquer motivo, manter o isolamento social, ou por não acreditar nas notícias que são veiculadas segundo a segundo. Quem está certo? Só o tempo responderá. Certo é que, não importa a tragédia, alguns traços culturais dos brasileiros sempre emergem em tais situações. Iremos destacar quatro.

O primeiro diz respeito ao fato do brasileiro sempre fazer piada em qualquer tipo de situação. Alguns chamarão isso de humor, outros de falta de senso. Em tempos de redes sociais, muitos são os memes que circulam tendo como pano de fundo a pandemia, vários deles com sátiras até engraçadas e inteligentes, outros tantos com falta de respeito e irresponsabilidade. Essa falta de seriedade, ou excesso de informalismo, é uma característica do povo brasileiro, assim como também o é dos povos africanos e latinos.

O segundo traço cultural patente em épocas assim é a nossa falta de educação. Não me refiro aqui à educação acadêmica, formal – essa também extremamente deficitária –, mas à educação cidadã. Essa falta de educação fica clara quando vemos imagens de pessoas aglomeradas, que não respeitam a distância mínima recomendada pelo MS e não primam pela etiqueta da tosse, espargindo seus perdigotos para todos os lados.

A terceira característica diz respeito à nossa chamada “malandragem”, ao “jeitinho brasileiro”. Essa, das três citadas até agora é, de longe, a que mais nos denigre perante a comunidade internacional. Trata-se de uma chaga que, em passado recente, mergulhou o país no maior caso de corrupção da história brasileira e mundial. E infelizmente, nesses tempos de crise, como o que o país atravessa agora, a malandragem do brasileiro também está presente, seja na falsificação do álcool em gel para auferir lucro, seja no aumento abusivo dos preços em razão da demanda e do medo de desabastecimento – o gás de cozinha dobrou de preço em algumas cidades – seja na compra exagerada de papel higiênico ou qualquer outro produto, como se isso, de alguma forma, fosse garantir alguma vantagem a quem comprou mais do que necessita. Essa mania de olhar sempre para o “próprio umbigo”, como aqui se diz, esse egoísmo imperante, essa falta de empatia para com o próximo é algo extremamente nocivo a uma nação que é intitulada, por muitos, como o país do futuro.

O quarto traço cultural de que iremos falar é o único pelo qual podemos nos orgulhar de verdade. É emocionante ver como o povo brasileiro, em sua maioria sofrido e desrespeitado em seus direitos mais básicos como educação, saneamento, moradia, etc, consegue, apesar de tudo, ser solidário. Não importa o tipo de tragédia, não importa a necessidade daquele que está precisando, o brasileiro sempre, tal como o sol que nasce a cada dia, estará lá para contribuir com o próximo, ainda que pouco ou nada tenha para ofertar, iluminando e aquecendo o coração dos que têm menos do que ele naquele momento. Ou até mesmo mais. Esse desprendimento filantropo, essa empatia com o próximo, que nos coloca muitas vezes no lugar do outro em momentos de desolação, enfim, essa solidariedade genuína, sem esperar nada em troca, é, a meu ver, a melhor e maior característica desse povo que, contra tudo e contra todos, consegue superar momentos como esse. Não há dúvida de que com a benção de Nosso Senhor e o altruísmo da maioria esmagadora dos brasileiros venceremos mais essa batalha, mostrando, mais uma vez, que apesar da corrupção, da malandragem e do famigerado “jeitinho brasileiro”, aqui há muitas pessoas que se preocupam, também, com o umbigo do próximo.

Aproveito a oportunidade para render minhas homenagens aos profissionais da saúde, policiais, bombeiros, garis e outros tantos trabalhadores de serviços essenciais que continuam, dia a dia, arriscando suas vidas em prol das pessoas que não podem sair de casa. A vocês, o meu muito obrigado. Que Deus os proteja!

*Bacharel e Mestre em Administração de Empresas

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