Visita a José Luiz da Silva (Pernambuco)

Por Nemilson Vieira de Morais (*)

A VISITA

Ao bater a saudade de alguém costumo dar um jeito de ver a pessoa. Com o amigo José Luiz da Silva (o Pernambuco) foi assim: fui vê-lo. Sempre teve muita consideração comigo, connosco da família Vieira e a recíproca é verdadeira.

Num ambiente qualquer, se percebesse algo desconforme, ouvíamos dele o jargão: "Vai-te embora Zé Luiz!"

Viveu os primórdios da sua vida com o comerciante, fazendeiro, político Francisco (Chico) Xavier; primeiro Prefeito da cidade, eleito em votação direta. Por ele acabou de ser criado.

Na nossa cidade, lugar que o acolheu de braços abertos, constituiu família e uma legião de amigos...

Ainda garoto saiu de Belo Jardim (PE), e chegou a Campos Belos (GO). De um belo ao outro teria mesmo de ser bela a sua história!

É bom demais ver a mãe e nesse ano de 2015, tive a alegria de estar com ela em, fevereiro e julho. Ao saber do "personagem lendário" a viver na saída da cidade, sentido distrito do Barreirão, fui lá.

Nesse dia fazia bastante calor, mas não me impediu de rever Pernambuco. Segui numa rua que leva a sua alcunha. — Bairro limítrofe à Vila Baiana, onde me criei. Temia não o encontrá-lo; ainda assim prossegui com o meu intento...

Rolinhas caldo-de-feijão nas copas das árvores, meio queimadas pela ação danosa do fogo, pareciam pedir chuva, — ao cantarem dolentemente. Uma ponte caída na Rua Pernambuco dificultou o meu acesso, mas prosegui…

Afinal vislumbrei uma casa antiga, comprida, de telhado rebaixado; coberta com telhas comuns, feitas provavelmente, por lá mesmo, onde no passado havia uma olaria. Estava ilhada por veículos e sucatas por todos os lados. — Tirava de lá uns trocados, uma ajuda à sua aposentadoria.

O meu pai foi um dos seus clientes; comprou dele uma camionete Ford (8 cilindros); uma C14, de cor branca, carroceria-longa que eu chamava-a de “Garça” e talvez um Jeep antigo.

De longe o vi, no balanço duma rede armada na sala, agarrado de prosa com uma visita. — A conservar a bela tradição pernambucana.

Ao abrir o colchete que dá acesso a residência, senti um cheiro da infância… que vinha dum cajueiro nativo no pátio da casa. Com seus frutos dava o ar da graça e reportei-me ao tempo de menino, onde os colhia nos campos do lugar, nas primeiras chuvas.

Levantou-se e recebeu-me com um largo sorriso no rosto que sempre cultivou. De longe mesmo cumprimentou-me em voz alta.

— Tá louco gruvião, quanto tempo não o vejo! Onde anda, como vão às coisas? Nos abraçamos forte e alegremente. Conversamos bastante...

De bermudas, sem camisa, um pouco encurvado pelos anos ainda conservava uma longa barba branca. Rosto comprido lembrava Manuelzão — personagem do Guimarães Rosa.

Carregava um braço na tipópia, devido a uma queda. Pedi um gole d’água e em seguida ofereceu-me um café onde o aceitei prontamente.

A prosa fluiu ao gosto do freguês… Dentre os temas abordados o futebol, a política e a religião não puderam ficar de fora.

O velho amigo Pernambuco fora um grande articulador político bastante atuante e influente. Com abnegação representou por alguns mandatos os munícipes, na Câmara Municipal de Campos Belos.

Posteriormente ao contar com o seu prestígio, carisma e serviços prestados à comunidade, elegera com folga, o seu filho Valderêz à Câmara Municipal. Prematuramente, um trágico acidente automobilístico ceifou à sua vida.

Na visita eu soube que Pernambuco fora um grande atleta do futebol amador da cidade. Contou-me sobre isso, e mostrou-me uma das suas fotos preferidas onde aparece como integrante do Campos Belos Futebol Clube (CBFC). Com a sua permissão, adicionei algumas, no meu arquivo pessoal.

No campo religioso surpreendeu-me as suas revelações. Mesmo como romeiro nas excursões ao Santuário de Bom Jesus da Lapa, BA, todos os anos, e professar o credo católico abriu às portas da sua propriedade — onde há um pequeno monte — à irmandade de outros credos religiosos a suplicarem ao seu Deus, exercer as suas atividades afins junto à natureza.

Migrante nordestino e, cidadão campos-belense, Pernambuco contribuiu significativamente para o desenvolvimento da Cidade nos seus mais variados aspectos: urbano, econômico, social e político…

Colaborou com a Igreja Evangélica Assembleia de Deus local, por ocasião da construção do seu 'Grande Templo'.

Depois da prazerosa prosa que tivemos não me despediu vazio:

— Leva essas rapaduras para dona Isabel — a minha mãe; foram feitas pelo meu garoto no assentamento onde vive.

O meu encontro com o amigo dos bons tempos foi prazeroso, significativo...

Demorou, por precisar interagir-me mais com ele; um assunto puxava outro e, a prosa rendeu que foi uma beleza…

Agora com mais sensibilidade pude perceber na conversa que tivemos, se tratar de um conceituado pilar da sociedade campos-belense; um acervo histórico da cidade. Sua história é vasta, rica e precisava ser contada com uma riqueza de detalhes, como uma boa biografia merece.

*Nemilson Vieira de Morais

Gestor Ambiental/Acadêmico Literário

— Crônica publicada no jornal "O Vetor", em 9 de abril de 2016.