Sérgio Moro: de herói nacional a juiz iníquo

“A cada dia que passa aquele que poderia e deveria ser o herói do Brasil deixa um legado triste de juiz seletivo e iníquo!”

Eu sou muito grato ao trabalho inicialmente desenvolvido por Sérgio Moro. Colocar inúmeros bandidos do colarinho branco atrás das grades num país em que a justiça e a legislação penal foram feitas para punir somente negros, pobres e favelados não é trabalho fácil.

Sempre vibrei com as sentenças condenatórias que os juízes Moro e Bretas davam a políticos e empreiteiros bilionários.

Custei a acreditar que tanto Moro como os procuradores da Lava-Jato eram seletivos tanto na sentença que davam como nas investigações que faziam. Discuti muito com amigos petistas que faziam uma campanha vexatória e difamatória deles, sobretudo, para protegerem Lula e seus bandidos de estimação. Como nunca fui filiado a partidos políticos e sempre encarei a corrupção como um câncer ambidestro e pluripartidário, recusei-me a cair nesse jogo de criticar quem combate à corrupção e prende criminosos por paixão ideológica e partidária. Para mim, não há nada mais digno e mais sublime que o combate sistemático à corrupção!

Portanto, nunca aceitei nem aceitarei a desculpa dada por muitos de que a Lava-Jato gerou desemprego "quebrando" as poderosas empreiteiras e levando milhares de trabalhadores a perderem seus postos de trabalho. Para mim, a Odebrecht, OAS, a Queiroz Galvão, dentre outras organizações criminosas, nem deveriam existir, por servirem como instrumento de roubo de quase um trilhão ao povo brasileiro e à nação.

Nunca aceitarei um argumento contra aqueles que atacam a corrupção e o crime, que não seja plausível, coerente e justo.

O que não pode ser negado é que o Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol são pessoas extremamente vaidosas. A vaidade não só cobra um preço alto como corrompe os seres humanos com extrema facilidade.

Eu percebi que no caso de Eduardo Cunha, o parlamentar só foi preso por conta da extrema exposição no caso do impeachment da Dilma, pois foi ele quem aceitou o pedido, como prerrogativa de seu cargo de presidente da Câmara dos Deputados. Entendi então que Sérgio Moro era seletivo e tinha lado.

Ao condenar Cunha, ajudado até pelo Ministério Público suíço que trouxe inúmeras provas, e absolver sua esposa Claudia Cruz, que tinha milhões de reais de propina em sua conta, Moro colocou em suspeita a sua atuação. Tanto é que o MP recorreu da sentença. E agora, com as mensagens divulgadas pelo Intercept, através das quais ficamos sabendo que ele convenceu os procuradores a não levar computadores e celulares do Cunha, ficou claro que ele não era tão sério e incorruptível como achávamos.

No caso Lula e em outros envolvendo líderes do PT, notou-se a predisposição em condenar e a agilidade processual e condenatória, enquanto em outros casos envolvendo outros políticos de outros partidos não foi percebida a mesma vontade condenatória e tamanha agilidade nos processos. Mesmo antes das divulgações das mensagens pelo Intercept, inúmeros juristas já haviam questionado a agilidade processual e a própria sentença que condenou o ex-presidente Lula. Para muitos e para mim, a condenação se baseou mais em convicções do que em provas nos autos do processo. E o jornalista Glenn Greenwald nos revelou pelas conversas que o próprio procurador Dallagnol disse a Moro estar preocupado porque as provas contra Lula eram frágeis.

A aceitação de Moro em ser ministro da Justiça de Jair Bolsonaro e também da promessa de receber uma cadeira no STF, inflamando sua vaidade, foram péssimas para sua reputação e carreira. Pelo menos no que tange a sua imparcialidade e neutralidade como juiz, pois é antiético e indecoroso se condenar o adversário político de uma pessoa e depois trabalhar e aceitar dela promessa de cargo. Moro condenou quem seria o presidente do Brasil em tempo recorde e sem provas cabais e ainda foi trabalhar para o maior beneficiário de sua prisão.

Hoje, Moro, que fez uma escolha desastrosa por conta de sua extrema vaidade e sonho de ir ao Supremo, vive a sofrer e a aguentar humilhações, uma vez que vários da cúpula ministerial de Jair Bolsonaro são denunciados por crimes, inclusive o seu partido é investigado por candidaturas laranjas e o filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro, é investigado por inúmeros crimes além do envolvimento com milícias no Rio de Janeiro.

Deixar de ser juiz e aceitar um cargo político de Ministro da Justiça, de um presidente que quer a todo custo livrar a barra do filho criminoso e que pode demiti-lo a hora que bem entender, é algo extremamente difícil e até humilhante. Por isso, Fábio Pannunzio disse hoje: "E aí, Moro? Admiro sua capacidade de suportar humilhação imposta por Bolsonaro. Enquanto ele te destrói, você fica calado esperando a hora de levar um pé na bunda. Perdeu o STF, o COAF, a ILONA e o pacote anticrime... salve apenas sua dignidade pessoal enquanto pode".

O mundo da política é um mundo podre. Moro sabia disso, melhor que todo mundo. Condenou os grandes jogadores desse jogo de xadrez. Mas a sua vaidade o fez entrar nesse mundo imundo. Hoje não pode atuar como queria, pois o presidente, seu patrão, está fazendo de tudo para defender o filho bandido. Mudando a direção da PF do Rio de Janeiro, mudando membros da Receita Federal, sancionando o juiz de garantias, mudando o COAF e até o nome do órgão e em conluio com o presidente do STF conseguiu que não se investigasse seu filho.

Não estou escrevendo esse texto com prazer. Pelo contrário, com profunda tristeza. Em ver aquele em quem inicialmente acreditei, em que o mundo acreditou e que ainda milhares acreditam, apesar do descrédito diário, que ele, Sérgio Moro, seria o grande herói do judiciário brasileiro, superando Joaquim Barbosa e o jurista Rui Barbosa, mas vejo nitidamente o seu opróbrio, sua queda e sua humilhação.

A história de Sérgio Moro me lembra um herói bíblico que também tinha o cargo de juiz. Sansão era um homem forte, respeitado e poderoso, mas por causa da vaidade e do seu pecado morreu com os dois olhos furados, num templo pagão filisteu.

Triste demais alguém começar a sua carreira como Herói e juiz incorruptível e terminar como juiz iníquo, parcial e sem poder.

Antigamente suas sentenças eram ouvidas, acatadas e cumpridas. Hoje, sua voz se cala e não pode destoar de seu patrão.

Seus poucos dias como "Superministro da Justiça” estão contados. Seu sonho de ser ministro do STF é só uma utopia distante. O que permanecerá é a saudade do seu cargo de outrora: um simples juiz federal que se tornou herói nacional!

Obs.: Artigo escrito em 27/08/2019, com o intuito de refletir sobre a vida de Sérgio Moro, o herói nacional, que abandonou 22 anos de Magistratura, um cargo que tinha vitaliciedade, para se tornar ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, com promessas de assumir uma cadeira no STF.

Acioli Junior
Enviado por Acioli Junior em 11/07/2021
Reeditado em 11/07/2021
Código do texto: T7297215
Classificação de conteúdo: seguro