O Corporativismo

O CORPORATIVISMO.

O corporativismo, salvo raras exceções, ainda persiste nas polícias militares, disfarçado, quer pela omissão quer pelo descaso na apuração de algumas infrações administrativas ou criminais, quando os envolvidos são colegas de farda de alta patente da Corporação. Geralmente, são acobertados pelo silêncio e, pasmem, pela perseguição ou até destruição da própria vítima.

Caso a vítima venha a ser do sexo feminino, essa mulher, então, será “despida” de toda a sua vida pessoal, até ser transformada numa “reles” policial. E, ouso afirmar pela minha experiência na magistratura militar, numa prostituta fardada!!!... Sabem porquê? É muito mais fácil e cômodo desmoralizar a policial feminina, ao invés de apurar o crime de que se está sendo vítima...

O Brasil é um país machista, infelizmente, por mais que alguns tentem negar...

Atente-se para um exemplo chulo, porém de fácil compreensão: se um homem está num bar tomando cerveja, “o cara é homem” – a sociedade, em sua maioria vai considerá-lo normal. Já, uma mulher dentro de um bar, mesmo que, apenas conversando, será vista como uma desocupada ou, como se diz, popularmente, está caçando homem (grifo meu)!

O homem maduro, solteiro é visto pela sociedade como um “bom-vivant”; a mulher, nessas mesmas condições, receberá a alcunha de “encalhada”.

O homem que não tem filhos é “esperto”; a mulher, uma insensível, frígida, incapaz de amar ...!!!

E mais, um policial fardado é um “gatão”; a mulher de farda, “sapatona”. O homem no quartel, em horário de folga é um policial dedicado; a policial, uma mulher procurando homem !!!

E, por aí vai...

Lembro-me, certa vez, uma diligência que fiz à cidade de Ourinhos/SP para acompanhar um flagrante por tráfico de drogas, envolvendo dois policiais militares. O Conselho de Justiça, integrado por quatro oficiais PMs, mais o escrivão do Cartório, o advogado dos réus e um soldado PM, responsável pela segurança do grupo me acompanharam. Todos eles foram alojados no quartel e, por óbvio, como única mulher, hospedei-me num hotel muito simples, próximo ao centro. Como estava em fase de separação judicial, levei meus filhos às minhas expensas. E, por óbvio, freqüentemente, os mesmos iam até o hotel ou até ficar comigo naquele local.

Decidi, dada a gravidade do caso, ficar na cidade e realizar o julgamento no próprio Tribunal do Júri daquela Comarca e com o Promotor que já estava acompanhando o processo desde o seu nascedouro, também da própria Comarca. O que foi feito.

Acreditem! Após o julgamento em pública audiência, fui representada por um tenente da Policial Militar que estava na platéia assistindo a sessão e não gostou do meu voto absolutório (isso mesmo que está escrito!). E, ainda, fui “contemplada” com um processo administrativo, tendo em vista que o Tribunal Militar me acusou de receber HOMENS num quarto de hotel – que, nada mais eram do que meus dois FILHOS de 12 e 14 anos, respectivamente!!!

Lamentável, porém verídico tudo o que foi narrado acima. O número do processo disciplinar - 217/96. Desnecessário dizer que fui punida por conduta incompatível com a magistratura (sic). Porquê? - Porque ousei enfrentar todo um batalhão envolvido com irregularidades e arbitrariedades. Tudo porque dois soldados se recusaram a participar do “esquema” daquela Unidade Policial e, por isso, esses que não aceitaram a recusa, montaram uma “arapuca” onde os mesmos foram acusados de uso e porte de drogas e, em conseqüência, presos em flagrante delito por tal crime.

Tenho a serenidade em meu coração, por ter ido, pessoalmente, ao local dos fatos e visto, com meus próprios olhos, o que estava acontecendo naquele processo. A surpresa (desagradável) com a minha chegada pelo efetivo fardado daquela Unidade, envolvidos com as ilegalidades foi tamanha que, em todo o tempo que ali permaneci para a realização das oitivas das testemunhas, interrogatório dos réus e etc, sequer foi providenciado por aquele Comando um banheiro feminino para ser por mim utilizado...Sem contar as ameaças de todos os tipos e duas tentativas de invasão no hotel em que fiquei hospedada.

Enfim, fui repreendida pelo Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo.Porém, recebi tal condenação administrativa como um prêmio, tendo em vista que no julgamento tive a oportunidade de desmascarar toda aquela farsa, inocentando ambos os policiais. Posteriormente, recebi das mãos do advogado dos réus, cópia da sentença do Juiz da Justiça Comum onde os mesmos foram reintegrados às fileiras da Corporação, adotando, na íntegra, minha sentença absolutória – fiz justiça e é isso que me orgulha e não o que, determinados homens de farda pensam a respeito de minha postura independente e desprovida de qualquer sentimento corporativo.

Não sou otimista a ponto de pensar que o corporativismo, os mandos e desmandos nele contidos, venham a ser exterminados tão cedo. Porém, não há porque se curvar diante de determinadas demonstrações de “coleguismo exagerado”.

Faça a sua parte! Eu fiz a minha.

Encerro esse texto com Beatrice Bruteau: “Não podemos aguardar que os tempos se modifiquem e nós nos modifiquemos junto, por uma revolução que chegue e nos leve em sua marcha. Nós mesmos somos o futuro. Nós somos a revolução".

24 de janeiro de 2005.

Roseane Pinheiro de Castro

Presidente da MMPM

Massacre das Minorias das Polícias Militares

www.massacredasminorias.com.br

Zane
Enviado por Zane em 27/02/2006
Código do texto: T116715