EXPLORADORES DA MISÉRIA (ou, MISÉRIA DOS EXPLORADORES)

 

Ficamos a nos perguntar o porque das pessoas viverem uma vida de mendicância, outras de plena miséria, se é que se existe alguma coisa plena em ser miserável.

É muito fácil questionar se nunca passamos por este vale sombrio, que é a miséria.

Aqui não estou como questionador, mas ponho-me como mestre na arte da miséria.

Algumas indagações são feitas tipo:

“Por que aquele pobre infeliz bebe?”.

Se analisar a fundo, situação por situação, caso a caso, primeiramente algumas respostas nos são dadas, onde o pobre infeliz diz ter “pobrema de nervo”, isso é muito comum, e como não estamos do lado de lá rebatemos, “se o infeliz esta com problema de nervo por causa de que não faz um tratamento e toma uns remédios controlados?”. Fácil e falar, mas se nos contextualizarmos, se vivenciarmos o problema, ai sim poderemos ver as dificuldades que o infeliz enfrenta pra se achegar até o medico e este por sua vez trata-o com descaso, desdém, indiferença e alguns dizem que o pobre esta dando “pití”, garanto que isso não é raro. Pois bem eu lhes asseguro que no meio em que o pobre infeliz vive habitualmente não encontra respaldo para se tratar. Vejam só. Quando uma pessoa bem relacionada chega a casa de um amigo bem de vida com uma situação financeira confortável, este quando esta muito nervoso logo é indagado se o amigo não gostaria de tomar um Ocadil, ou um antidepressivo que o valha, já ao infeliz quando chega a casa de um outro amigo que tem uma situação relativamente social igual a dele logo ao ser detectado o problema este o convida: “e ai jão? Isqueci esti probrema e vamu tomá uma pinga das boas qui guardei aqui ô!”.

Pois é meu caro amigo, em botequim não tem Ocadil, Lexotam, Diazepam ou outro antidepressivo que o valha, o jeito é tomar uma pinga e esquecer as dores e angustias.
Inclusive esta na Bíblia, onde a mãe do Rei Lemuel diz ao seu filho em provérbios capitulo 31
versículos de 4 a 7.
Provérbios 31:4 Não é próprio dos reis, ó Lemuel, não é próprio dos reis beber vinho, nem dos príncipes o desejar bebida forte;
Provérbios 31:5 Para que bebendo, se esqueçam da lei, e pervertam o direito de todos os aflitos.
Provérbios 31:6 Dai bebida forte ao que está prestes a perecer, e o vinho aos amargurados de espírito.
Provérbios 31:7 Que beba, e esqueça da sua pobreza, e da sua miséria não se lembre mais.

Ao deparar-me pessoalmente com uma situação de dificuldade, miséria mesmo! Diria eu, penúria. Pude entender todo o sofrimento e angustia daquele que trilham estes caminhos inférteis, inférteis sim, pois não adianta plantar nada onde pisam os miseráveis que nada brota, quer seja por terem os pássaros devorado as hipotéticas sementes, ou quaisquer outros motivos que o sejam, ali naquele terreno falta o adubo da fé, da esperança, mas sobra adubo da caridade e é onde os infelizes se apegam.

Fui ajudado por uma família amiga e devo salientar que jamais tive os celeiros com tanta fartura, fizeram uma campanha com os vizinhos e parentes deles, foi de um dia para o outro, e solicitaram que eu fosse buscar algumas “coisinhas”, tinha tanta coisa que espantei-me ao deparar com tamanha dádiva.

Alguns questionamentos meus naquele momento foram dissipados, pois aqui onde eu moro existe um projeto social, “sem fim Lucrativos” onde eu sempre questionava o porque da existência dele, já que os seus freqüentadores não, ao meu ver, necessitavam daquela ajuda, onde eles traziam garrafas pet’s e a trocavam por cestas de verduras, algumas destas pessoas, era comum a vermos em portas de botequim a sorver uns e outros goles da “mardita”.

Julgamentos eram feitos por mim ao deparar-me com as cenas mencionadas acima. Julgava sem dó ou piedade sem ao menos me importar com o dia dia daqueles que ali estavam. Somente quando me vi em situação equiparada é que fui entender os “porquês”.

Algumas pessoas, sem duvida alguma, sobrevivem, e digo de passagem, muito bem explorando a caridade alheia, pois é comum presenciarmos alguns destes casos.

Conheci no estado do Rio de Janeiro, na cidade de Resende, um senhor que vivia a mendigar em frente a Caixa Econômica Federal (C.E.F), este “pobre coitado” tinha uma conta na C.E.F onde depositavas seus “lucros” diários por seu “trabalho”, “trabalho” este que eu não me dispuseria a fazê-lo, pois bem este Senhor tinha uma renda mensal e títulos de capitalização de dar inveja a muitos empresários.

Aqui em Vitória do Espírito Santo não foi diferente minha experiência, quando trabalhava na Ação Social da Prefeitura de Vitória, presenciei muitos casos de mendigos que viviam a perambular pelas ruas e tinham muitas casas alugadas em bairro vizinho ao centro da capital.

Havia um senhor que na hora da distribuição da marmitex, que era feita para efetuarmos as abordagens, que mais parecia assistencialismo, este senhor brigava de unhas e dentes por seu quinhão dizendo estar faminto, e foi numa destas discussões que descobrimos, eu e toda equipe da prefeitura, a identidade secreta daquele explorador da caridade alheia.

Estava eu almoçando num restaurante no centro da capital quando avistei alguns meninos de rua, com idade entre 12 e 17 anos, acabei de almoçar e fui ao encontro deles e indaguei se eles não gostariam de estudar, trabalhar como jovens aprendizes e este me questionaram quanto ganhariam com este trabalho, eu os respondi que seria por volta de um salário mínimo, riram-se de mim e perguntaram se eu os queria matar de fome, pois eles tiravam uma média de 100 reais diários e quando o movimento estava fraco eles angariavam com o “suor de seu labor” no mínimo uns 60 reais, segundo eles quando tinham muitos “miseráveis e mão de vacas” na rua o dia era fraco, mas no geral eles viviam “bem”.

Devo salientar que para quem tem amor próprio e vergonha na cara e muito difícil passar por isso, mas é como eu disse lá atrás, neste tipo de terreno, da miséria, não nasce nada, nada mesmo, e amor próprio, vergonha na cara, caráter, dignidade são sementes que devem de ser plantadas na formação do ser humano, saliento, porém que, mesmo que estas sementes estejam plantadas, germinadas, crescidas, o sejam como arvores frondosas, mesmo assim podem ser derribadas, pois o machado cortante da corrupção, da impunidade e alguns outros crimes afiados podem jogar por terra uma “floresta” inteira e ainda tornar o terreno árido como areia s do deserto.

A fome corta, não te deixa pensar, não te deixa agir, torna-o incapaz, não te deixa viver.

Eu passei por isso juntamente com minha família. Somos em seis dentro de uma pequena casa, quase igual a Historia “Éramos seis”, mas esta já é uma outra história.

REFLITAM!

Marcelino Rocha
Enviado por Marcelino Rocha em 30/11/2008
Reeditado em 01/12/2008
Código do texto: T1311532