EU SÓ QUERO OS BÔNUS

Um país não pára. Uma casa não pára. A vida não pára. Onde quer que comecemos um trabalho temos de ter uma base, quando não continuar o que já existe. Enfim: não podemos deixar o passado de lado. Nós herdamos o ônus e o bônus dos atos alheios, ou dos nossos atos do passado. Impossível começar do zero. Só podemos utilizar um carro que outro construiu com todas as vantagens e desvantagens que ele tenha.

Quando Lula recebeu o governo em 2003, na transferência mais transparente da história, tratou de maximizar os ônus e de ignorar os bônus. Difamar o que havia de inconveniente e esconder as boas heranças. O Brasil estava lubrificado e era fácil de ser governado. Embora a propaganda oficial acusava o governo anterior de tudo, não mudou uma vírgula na política cambial, do controle da inflação, nos incentivos a exportação. Tampouco mudou muita coisa no que havia de errado. As rodovias federais, por exemplo, continuam esburacadas e mal cuidadas como a seis anos.

O novo prefeito recebe a prefeitura de Manaus de maneira transparente. Ele também não vai alardear que as contas estão enxutas como nunca estiveram. Vai divulgar a buraqueira nas ruas da cidade, a não conclusão do Viaduto do Coroado y otras cozitas más. É sempre assim. Maximizar o mal para que o bem seja valorizado e o herói reconhecido. Na primeira quinzena de janeiro as máquinas ainda não saíram do pátio e a chuva continua esburacando as ruas. Esperemos apenas que o prefeito não imite o governo federal e desperdice seis longos anos queixando-se de seu antecessor.

Uma notícia triste nos vem no início do ano: aumentaram as mortes nas rodovias federais. O governo fez estardalhaço, criou leis estapafúrdias, atropelou direitos constitucionais, divulgou estatísticas duvidosas e agora está diante de uma triste realidade: morreram mais pessoas que no ano anterior. Todas as medidas foram em vão, ou mal direcionadas.

No mês de julho, quando foi editada a lei de tolerância zero para o álcool nas estradas, o Brasil todo comemorou. A imprensa colaborou como nunca. A sociedade inteira começou a fiscalizar. Muitos até se esqueceram que estavam tendo seus direitos básicos abalados. Motoristas com algumas gramas de álcool no sangue foram presos como se fossem criminosos comuns. Estatísticas que, malandramente, não levaram em conta as férias escolares de julho, nem o medo do motorista em sair com um carro irregular foram alardeadas como definitivas.

As estatísticas de acidentes em rodovias caiu em meados de 2008. Não em conseqüência de uma lei burra, mas por causa da fiscalização e da simpatia da imprensa. Todos correram para os holofotes apadrinhando a lei. Agora que o índice de acidentes com mortes aumentou muito, procura-se alguém que queira arcar com o ônus. Não precisamos ser radicais e pedir que alguma autoridade vá à televisão e diga: “Eu matei tantas pessoas no trânsito.” Não precisa tanto. Apenas queremos alguém que diga, com toda a humildade: “Desculpem-nos, estávamos no caminho errado. Vamos corrigir com a ajuda de vocês.”

Todas as pessoas querem um país melhor de viver. Querem uma cidade melhor de viver. Mas, quando deparamos com um governo que comemora o aumento de número de prisões, que comemora o aumento de multas, descobrimos que este ideal ainda está longe.

No passado houve pessoas com vontade de acertar. Hoje existem outros com o mesmo propósito. No passado, pessoas cometeram erros. Hoje existem outras errando com o objetivo de acertar. Não chegou a hora de sermos um pouco mais humildes e arcar com o ônus e dividir o bônus?

Luiz Lauschner – Escritor e empresário.

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Luiz Lauschner
Enviado por Luiz Lauschner em 11/01/2009
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