AGIR SOBRE SENTIMENTOS PREJUDICIAIS

Quando alguém, de alguma forma, se mostra independente de mim, isso me entristece ou pelo menos me sujeita a um sentimento que é contrário à minha afirmação, me “diminuindo”. Não é que este comportamento meu seja certo. Não é que seja errado. Mas que seja prejudicial, tanto a mim como ao ser de cuja independência emana. Que devo fazer diante de tal sentimento?

Já disse em minha filosofia que os sentimentos não se justificam por serem naturais. O ódio e o ciúme são naturais, no entanto, são condenáveis em relação à liberdade alheia, que é a nossa própria (democracia). O sentimento a que me refiro pode trazer más conseqüências a outro (ser), porque, tomado por este sentimento, posso agir contra a independência daquele ser.

“A ética – possível somente para animais racionais – deve mediar as nossas relações.” (“Relações Amorosas e a Perfeição”) Nesse caso, devo eu impedir que esse sentimento aja. Reprimi-lo, simplesmente, é entristecer também. Isso, uma vez que cerceio meus impulsos, donde concluo que, se não sai, sua ação interna é devastadora. Devastadora porque é como se eu quisesse respirar e alguém me tivesse costurado nariz e boca.

Ainda tenho de pensar sobre isso, porém, de alguma forma, existem pessoas que conseguem sublimar os impulsos de sua alma sem entristecer. A priori penso que tem alguma relação com sua própria atividade de negar seus impulsos, a qual os satisfaz mais que externá-los. Algum sentimento, e não a razão, os leva a eleger a “atividade de negar” como principal. Para a maioria das pessoas, a atividade vital, evidente, não se dá neste sentido (de negação).

Eu me considero como as demais pessoas, a maioria. De forma que, se tenho de controlar aquele sentimento, fá-lo-ei canalizando para outras vias aqueles impulsos (e talvez aqui eu invada Freud e Artaud). Vias possíveis são o esporte, o jogo, o lazer... Observemos que, para as pessoas que reprimem tão-somente, o que lhes guia é a paixão (sentimento) – que, não raro, tem relação com sua religião. E para as pessoa em geral?

A razão tem o poder de nos levar ao entendimento de que aquele sentimento é prejudicial, mas não tem o poder de nos fazer agir sobre ele. Entender não é agir. Entendo que a timidez não tem justificativa, e sou tímido. E, nisso, observemos, agimos de modo a afirmar a timidez mesma, segundo ordem talvez da mesma timidez – ou de algum outro sentimento (invado Spinoza).

Marx disserta sobre o condicionamento histórico, o condicionamento do pensamento, ideológico e de classe do ser humano, entretanto, sua teoria sugere que, pelo conhecimento de como funciona esse ‘determinismo’, se o supere em muito (e não em tudo). É análogo à questão dos sentimentos, segundo os quais agimos, mas, em determinadas situações, devemos agir sobre eles.

O marxista age na história, se perceber que por ela é condicionado. O entendimento, então, o leva à ação; mas ele tão-só não é suficiente para interferir em nome da ética sobre os próprios sentimentos. Se entendo que é democracia é necessária – até para minha sobrevivência –, um amor-próprio me leva a conservá-la. Assim, a razão me leva a um sentimento, que pode controlar outro, segundo alguma escala de hierarquia.