NECESSITADOS E PROVEDORES

Entre os grandes desafios que os humanos que vivem nesse planeta (acho que tem mais gente em outros lugares do universo) enfrentam ao longo de sua curta existência, um deles é o mais difícil de ser domado, pois que não é um só, mas um conjunto de qualidades boas e más. Os sentimentos.

Esse grande desafio diz respeito a todos os sentimentos; aquele senso que permanentemente recebe as impressões do que acontece a nossa volta. Uma sensação íntima.

São como cavalos xucros, selvagens. Para torná-los bons, de boa qualidade moral, é preciso, sobre tudo, técnica e muita paciência. E exercícios permanentes, o que pode tornar a vida cansativa e, às vezes, amarga.

São muitos os sentimentos, como se sabe bem, e vou tratar apenas de alguns deles.

Psicólogos e psiquiatras tratam disso muito melhor, sem dúvida. Entretanto leigos curiosos e quem está mais interessado nas coisas humanas do que em outras de toda natureza, sem desmerecê-las, porém, também dedicam-se prazerosamente a, se não desvendar, a observar com mais atenção o que somos e nossas atitudes. A psicologia humanista é uma corrente da Psicologia a qual dedicam-se vários psicólogos, entre eles o norte americano Abraham Harold Maslow, um dos mais notáveis, que me foi “apresentado” por Alexandre Pedrassoli, também psicólogo, ao vasculhar seu site na internete. O Dr. Maslow, um judeu de pais imigrantes russos, teve uma vida miserável onde nasceu, no Brooklin, NY. “Fui um garoto tremendamente infeliz. Minha família era miserável e minha mãe era uma criatura horrível. Cresci dentro de bibliotecas e sem amigos. Com a infância que tive é de se surpreender que eu não tenha me tornado um psicótico.”

Maslow afirma que algumas necessidades são mais prioritárias do que outras; entre fome e sede beber água é a prioridade, por exemplo. Ele criou a Hierarquia das Necessidades, com cinco níveis; que são as fisiológicas, as de segurança e estabilidade, as de amor e pertencimento, as de estima e as necessidades de auto-realização. Sobre o quarto nível de necessidades, a de estima, Maslow ensina que ela existe em duas versões. Uma inferior, que é o desejo de ser respeitado, de receber atenção, de glória, fama, dignidade; de ser reconhecido. Ou seja: de ser levado em conta. Na versão que ele classifica de superior, estão os sentimentos de capacidade, competência, liberdade, independência. O que as difere é que na primeira versão, esses sentimentos nos podem ser tirados, ou nunca serem obtidos, pois se trata do respeito que os outros tem por nós. Enquanto na segunda versão é mais difícil perde-los desde que se tenha auto-respeito. Quando essas necessidades não satisfeitas a auto-estima é atingida e aí surgem os complexos de inferioridade. Certamente não se pode ser feliz sentindo-se inferior aos demais; às outras pessoas em geral ou particularmente com as quais convivemos. Segundo o Dr. Maslow, “se você planeja ser qualquer coisa menos do que você é capaz, provavelmente você será infeliz todos os dias de sua vida”. É aqui que entra a auto-realização, que difere do conceito adotado nessa nossa sociedade capitalista de mercado que nos desafia a ser competitivos mesmo que sejamos infelizes. Já passei por essa fase e não tenho boas lembranças dessas sensações e dos sentimentos que me atordoaram. A auto-realização, portanto, é transcendente.

Como explica o Dr. Maslow as metanecessidades é que direcionam as pessoas auto-realizadas. Entre elas está a verdade, que é desejada, em oposição à desonestidade. A beleza, em oposição à feiúra e a vulgaridade; a simplicidade em oposição à complexidade desnecessária. É disso que necessitamos para sermos felizes. Essas são apenas algumas das metanecessidades apontadas pelo Dr. Maslow e que destaco nesse artigo que não tem nenhum compromisso com o rigor acadêmico e nem pretende ir além do que está aqui exposto.

Penso e acredito que o tempo, o passar dos anos, nos dá mais controle sobre as nossas metanecessidades assim como sobre a maioria de nossos sentimentos. Diminuem–se os medos, a fome, as angústias, as ansiedades. E desaparecem outros, como a raiva, o ódio, o orgulho, por exemplo. Não falo de sexo nem de amor. Um, porque tem implicações tão complexas que suas relações envolvem aspectos da moral, da ética, da religião, da própria designação - se masculino ou feminino - de tabus, de preconceitos e de hábitos, usos e costumes. O outro, o amor, porque, além de seus diferentes significados e manifestações, a mais difícil e perturbadora delas somente os poetas conseguem entender a ponto de cantar e versejar as dores e os prazeres que ele proporciona. Há outros tipos de amor mais compreensíveis.

Dentre esses sentimentos, o orgulho, a compaixão, por exemplo, são daqueles que podem ter mais de um significado; do ponto de vista semântico. Orgulho pode ser estar insatisfeito consigo mesmo, por suas ações ou características, ou por causa de outras pessoas. Também pode significar a soberba; ou altivez, brio. E também pode significar o sentimento que se tem por alguma coisa ou por aquilo ou por aquele, por aquelas pessoas, de quem se tem orgulho. Nesse último caso temos orgulho, dos filhos, dos amigos que nos acompanham sem nenhuma reclamação, de algumas atitudes que tomamos, dos livros e de todos os objetos que temos; guardados, colecionados e adquiridos por livre escolha. E, principalmente, temos orgulho de quem amamos que é justamente a razão pela qual amamos.

O Dr. Abrahm Maslow estudando as motivações humanas criou a Hierarquia dos Desejos Humanos. Muitos de seus artigos sobre esse assunto têm sido usados na área da administração de empresas; em treinamentos, em palestras. Confundem-se os estudos de Maslow e suas conclusões sobre as motivações humanas com as teorias motivacionais aplicadas em grandes corporações comerciais e industriais por especialistas em gestão de pessoas. Quando ele trata da auto-realização refere-se às pessoas que lidam com as dificuldades como problemas a serem resolvido e não como frustrações pessoais. Pessoas que sabem distinguir o que não é verdadeiro, o que é falso, do que é genuíno, autêntico. Bem, penso que isso pode ser aplicado em qualquer circunstância da vida, no dia a dia. São percepções que se aprimoram com o tempo, com as experiências vivenciadas. Por isso não vejo mais lugar para alojar certos sentimentos, como raiva, ódio, orgulho, vingança e outras predisposições malfazejas, depois de certo tempo de vida. De uma determinada época. E para alcançar isso não se pode apenas atribuir a uma desmesurada e repentina bem intencionada atitude que se toma deliberadamente. Certamente, a auto-realização somente será alcançada se forem atendidas as metanecessidades a que se refere o Dr. Maslow. Sendo que algumas necessidades têm prioridade sobre outras e que enquanto umas são atendidas outras surgem para serem satisfeitas. Isso pode parecer que temos que passar a vida atendendo nossas necessidades e nada mais. Uma espécie de Atendimento Eterno, sem fim. E é. Não fazemos nada mais na vida além do que atender e satisfazer as nossas metanecessidades. Somos, nós mesmos, necessitados e provedores. Viver é um fascinante desafio.

CESAR CABRAL
Enviado por CESAR CABRAL em 30/01/2009
Código do texto: T1412826
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