QUER SABER, VÁ PRA CHINA!

Cheguei à Pequim. Nunca pensei que pisaria os pés tão longe de casa, ainda mais num lugar que parece que tudo ao redor gira ao contrário. É uma quantidade de gente andando pelas ruas apressada que parecem pingüins fora da cerca. O que é legal é que quase todo mundo por aqui tem a mesma estatura. É que não deu tempo de ir ao cinema, mas certamente eu não teria problema de me sentar e ter a cabeça de um cara me impedindo de ver o filme, como se um Pé Grande estivesse sentado bem a minha frente. Enfim, Pequim. Cheguei para passar seis dias, mas a minha estada acabou se arrastando para mais. A cidade tem muita comida boa para comer, monumento incrível para visitar, coisa legal para comprar e balada empolgante para se esbaldar. Fiz de tudo um pouco. No primeiro dia, à noite, fui encontrar o Davi, um médico amigo meu alagoano que está se especializando em acupuntura. Nosso ponto de encontro foi a Praça da Paz Celestial. Acho que só quando vi o ‘retratão’ do Mao (um dos poucos ainda expostos em prédios públicos) caiu à ficha. "Caraca! Eu tô em Pequim!" Pensei. Foi dos muitos momentos mais emocionantes que passei na China, entre tantos outros que vou dividir com vocês até o final.

A cor vermelha da bandeira chinesa representa a revolução, enquanto a cor amarela das estrelas é para destacar a claridade da terra vermelha. A estrela maior simboliza o Partido Comunista da China e as quatro estrelas menores, o povo chinês.

Nos dias seguintes, lógico, fiz o roteiro Cidade Proibida, o Palácio de Verão, menos a Grande Muralha. Essa eu preferi deixar para quando eu trouxesse os patins motorizados. Tudo é incrível, mas certamente está melhor depois das Olimpíadas. A Cidade Proibida, particularmente, está uma bagunça. É impressionante como os chineses parecem não se importar com um de seus maiores tesouros históricos. Peças que parecem que nunca viram um espanador pelas frente, iluminação precária, legenda que não corresponde ao objeto exposto, enfim. Não estou aqui para criticar, mas para me situar onde estou e para onde vou se caso acontecer alguma coisa aqui.

Convidei a Fay, minha secretária na China que se tornou a melhor amiga chinesa que um gringo como eu poderia ter e fui às compras com ela. A danada é boa de barganha e me garantiu uma economia de algumas centenas de dólares. Para retribuir sua gentileza, convidei-a para ir a um espetáculo da Ópera de Pequim. Ela nunca tinha visto pessoalmente, só na televisão. Eu, desde que assisti ao filme "Adeus, minha concubina", morria de vontade. Ao vivo, é lindo mesmo, mas é um evento ‘mega-monster’ turístico. A Fay era a única chinesa da platéia. Acreditem! Na minha primeira semana na China, decidi tomar lições de mandarim. Aqui não dá para sobreviver na base do inglês. Ademais, a experiência é sempre mais interessante quando você se comunica no idioma local. Tive apenas seis aulas. Lógico que, em tão pouco tempo, não esperava sair falando. Como disse meu pai, eu aprenderia "the book is on the table" e olhe lá. Mas até que algumas palavrinhas básicas eu consegui decorar. A Megan, minha professora gracinha, se preocupou mais em me ensinar a pronúncia correta do que qualquer outra coisa. Mandarim tem os malditos tons, quatro no total, mais o som neutro. Isso significa que uma mesma palavra pode ter cinco significados.

Mais difícil do que pronunciar um único tom é juntar um monte de palavras com entonações diferentes numa sentença. A frase "wuo yao mai qu Beijing de che piao", ou "me vê um bilhete para Pequim", tem oito tons. É uma desgraça. E inúmeras vezes, mesmo quando você fala certinho, o povo não te entende. Dá desespero. E a escrita, então? Jesus, nessa seara, evidentemente, nem me meti. Sei ler apenas às palavras: "saída", "banheiro", "mulher" e "briga". Sabem por que conheço o caractere de briga? Porque é o símbolo da mulher posto um do lado do outro, tipo assim: 女女. Sensacional, não? Agora associar mulher a briga, hum. Bom, estou na China, eles devem saber melhor do que eu. Mas para minha segurança briga é o que não quer ver por aqui, entretanto confesso que me deu vontade de aprender chinês por causa dos caracteres (a sonoridade, me desculpem, eu acho horrível).

Por não se entender uma só palavra em chinês a gente começa a separar essa experiência em três fases: Fase do "Ching-chong-ching". Fase do "Pronto! Relaxa que isso é apenas outro idioma. Fase do "Me Tirem Daqui Porque Eu Não falo Chinês.

Diferenciar um Qi, de um Xi, um Shi, ou de um Chi é algo de uma complexidade extraordinária. Meu ego profundamente afetado pela depressão pós asiático me dizia:"Burro velho não aprende línguas". Enquanto meu amor próprio me fazia repetir: Eu não sou burro; Eu não sou velho; Eu não sou Chinês.

Meus amigos gringos dominam uns oitocentos caracteres após dois, três anos debruçados sobre livros. Para ler o jornal, e necessário conhecer em torno de 2.500. Tenho a maior admiração por esses ocidentais que se metem a aprender mandarim. Conheci um bocado aqui na China, incluindo três brasileiros como o Davi e o Paulo, médicos, e a Paula, jornalista. Os três estudam em Pequim e falam um chinês que dá gosto ouvir.

Pelo menos na gramática, a língua é bico. Não há conjugações verbais. Bom, alguma compensação tinha de ter, né? Só faltei perguntar para o meu anjo da guarda o que era aquilo. Se ele falasse teria me dito: Isto para mim é Chinês.

Depois de quase uma semana, ainda não consigo falar muita coisa. Sei pedir comida no restaurante, perguntar onde fica a estação de trem e dizer que meu chinês é uma porcaria. Até agora, tenho-me sentido praticamente um analfabeto-surdo-mudo: não consigo ler nada, não percebo nada do que me dizem e não consigo dizer nada.

Safo-me com o inglês, o que a nível profissional até resulta, mas no dia-a-dia, nem isso ajuda. Como seria de esperar, a maioria das pessoas não fala inglês, e das poucas que falam, falam "Chinglês". Bom deixa pra lá. Meu melhor desempenho é na hora de comprar. Pergunto quanto custa, falo que está caro e peço descontos. Uma frase que sempre uso é: "wo bu shi meiguoren, wo laizi Baxi". Traduzindo: "abaixa esse preço que eu não estou podendo". Mas, nem sempre cola. Para chinês, todo estrangeiro é endinheirado. O pior é que no Brasil também. E em qualquer um dos casos eu tô sempre ferrado.

Ontem fui às comprinhas. Fui ao Carrefour (sim, aqui também tem Carrefour - mas se diz qualquer coisa como "Djeàlefu"). Aqui o Carrefour é maior que os hipermercados normais no Brasil. Conforme o esperado também tem muito mais gente às compras. O que é diferente é a das comidas, sobretudo dos produtos frescos. Peixes ainda no aquário e pedaços de carne "em bruto" são talvez as coisas mais estranhas. O mais engraçado é que dentro do supermercado as coisas funcionam literalmente como num mercado de rua, na maior gritaria, com os vendedores aos berros por tudo e por nada e com umas senhoras de megafone na mão a fazerem promoções a todo o tipo de produtos.

Outra coisa estranha é que os rótulos estão quase todos só em chinês (o que é normal, para eles, acredito!) o que torna a escolha muito mais complicada. Sobretudo nas coisas em que não existe nenhuma marca que possa servir de referência. Nestes casos, praticamente só dá para escolher pelo preço e pelo aspecto da embalagem, o que nem sempre dá bom resultado.

Mas até agora, memorizei os números e mais umas oitenta palavras e expressões. Porém o "The book is on the table", infelizmente, não está entre elas.

Uma das primeiras coisas que chamam a atenção quando se chega a Pequim (se não mesmo a primeira) é a poluição. Essa está por todos os cantos da cidade e acreditem de todas as cores.

Meu primeiro fim de semana em Pequim e adivinhem, está chovendo. Claro que os planos para passear e visitar coisas foram por água abaixo. Por falar em água, aqui, não sei o porquê, mas a maioria das poças de água da chuva fica com espuma. Vá se saber o porquê.

Tive de pensar em planos alternativos. E rapidamente me surgiu à idéia: Que tal experimentar as tão reconhecidas massagens orientais? Informei-me com alguns portugueses, que já conheciam o "The Joy Club" e fui lá. Ficamos os três na mesma sala e escolhemos a "Chinese Full Body Massage" (com a promoção ficou por pouco mais de seis euros para cada um). Pelo que pude perceber a massagem chinesa não incluía óleos ou qualquer tipo de creme - simplesmente vestimos um "pijama" feito de sacos de batata ou coisa parecida e a massagem foi feita por cima dessa roupa. Bem, apesar de não ter sido a experiência "zen" pela qual eu esperava, foi muito bom. Parecia que me esfoliavam a alma. Sai de lá desejando trinta anos de assadura do que passar por aquilo novamente. Ainda tive que ouvir alguns comentários do tipo "You have very good hair". E outros menos positivos do tipo "You need to lose weight. Chinêzinha atrevida. Aonde foi que ela viu gordura aqui? Ficou sem gorjeta!

Uma coisa que quero que você saiba é que é possível alguém lhe ligar no seu quatro de hotel, perguntando se você quer uma massagem. Bom, é melhor saber que isso não é massagem, nem tão pouco é um serviço do hotel. É você quem decide falar se "sim" ou se "não". Vai da sua necessidade.

Aqui em Pequim, o meu computador acompanha-me quase durante todo o dia. Ele é o meu posto de trabalho, a minha cabine telefônica, centro de lazer, etc. O que eu quero dizer com isto, é que tenho de carregá-lo para todo o lado. Embora o computador seja propriamente pequeno, com a papelada e com os acessórios necessários, a mala chega facilmente aos cinco quilos. Logo, o esforço para carregar para todo o lado é bastante grande. Isto é particularmente penoso quando tenho reuniões em diferentes pontos da cidade. Ainda ontem fiz a trajetória casa-táxi-trabalho-metro-combóio-táxi-empresa-táxi-combóio-táxi-empresa-táxi-combóio-metro-táxi-carrefour-táxi-casa.

Moral da história: tenho as costas completamente feitas um oito.

Os táxis de Pequim fazem parte do meu dia-a-dia.

Posso mesmo dizer que foi através deles que aprendi a dizer as minhas primeiras palavras de Chinês, como a indo para casa, indo para o trabalho, siga em frente, esquerda, direita, recibo, obrigado, etc.

Os Táxis de Pequim cheiram freqüentemente a alho. O cheiro é de tal forma intenso que faria qualquer Vampiro caminhar a pé pelo resto da vida que estivesse por ali. Isso me fez recordar uma amiga que diz que exercício de pobre é caminhada, entretanto acho que Vampiro por aqui é bem mais que pobre. É freqüente eu ir para o trabalho de manhazinha, com um frio de rachar, e ter de ir com a janela completamente aberta. Os taxistas devem estranhar e achar que sou louco. Mal sabem!Outra coisa é que nos Táxis de Pequim vamos sempre a ouvir contarem histórias em chinês. E acreditem, os taxias são geradores de energia. Depois de pagar, pedir o "fapiao" (recibo), e dizer o "xie xie" (obrigado) da praxe, é freqüente, ao fechar a porta do carro, apanhar um choque de eletricidade estática. Não se trata de um choque qualquer: é mesmo uma brutalidade. Creio mesmo que em algumas vezes os meus ossos começaram a dar luz, como nos desenhos animados. Já começo a ganhar alguns truques, como o fechar a porta com a manga do terno, ou empurrá-la apenas pelo vidro, mas ainda é freqüente m esquecer e nesses casos... ZZZap! Fico esturricado.

Uma das profissões mais características com que me tenho cruzado todos os dias aqui em Pequim é a de Vendedor de Ananases (abacaxi). Em toda a parte há uns senhores nuns carrinhos cheios de ananases para vender. Há ananases para venda em vários formatos, desde inteiros a fatias espetadas num pauzinho, tipo gelado. Mas, os mais engraçados são ananases descascados com uma ferramenta própria (tipo um formão) que ficam com um aspecto fantástico.

Uma outra curiosidade é que a moeda chinesa se chama Ren Min Bi (/jên min bi/) - a moeda do povo; a abreviação é RMB, entretanto como em todos os lugares, também se aceita dólares, porém você corre o risco de pagar sempre mais caro, por isso é melhor trocar o dinheiro assim que possível.

Os chineses se cumprimentam apertando as mãos. Às vezes os homens batem no ombro um do outro (pode ser uma batida forte), e isso é um gesto muito amigável, com o sentimento que ele o considera um amigo e um bom sujeito. Bom, eu estou só de passagem galera, portanto não precisam ser tão íntimos comigo.

Quando você trocar seu cartão de visita com seus clientes, dê e receba os cartões com duas mãos. Isso é muito importante na China, que mostra um gesto de respeito, tanto ao seu cliente quanto a você. Se começar jogando o seu cartão na mesa, será considerado mal-educado e em geral, já perderá no primeiro cliente ou terá perdido o negócio.

Uma coisa que não se pode fazer à mesa é colocar os pauzinhos "de pé" no arroz. Isso não será muito agradável para a pessoa na sua frente, porque assim coloca-se o arroz e pauzinhos para os mortos. Para pedir a conta, pode falar "Mai Dan": "Mai" significa "cobrir", mas muita gente acha que signifique "comprar", é mal entendido; "Dan" significa aqui "conta". Ou pode falar "Jie Zhang", que significa "fechar a conta", "Jie" é "fechar", "Zhang" é "dívida".

Para pedir um recibo, fala-se "Wo Yao Fa Piao", "Wo"-"eu", "Yao"-"querer", "Fa Piao"-"recibo".

Agora usar o banheiro na China é uma merda literalmente. A falta de privacidade é algo complicando num lugar aonde existem milhares de pessoas. Dentro dos banheiros de alguns restaurantes freqüentados basicamente por chineses, os sanitários não têm portas e são separados apenas por uma divisória baixa de madeira. Isso significa que você pode receber a companhia de outra pessoa enquanto tenta se equilibrar no seu ‘agachamento desajeitado’. Mas é bom dizer que os banheiros para homens e mulheres são separados, porém em alguns bares, não! Eu havia tomado umas cervejinhas e me deu vontade de ir fazer um pipizinho, e qual não foi a minha surpresa ao chegar ali e ver um buraco no chão te chamando para mais perto. O pior é que mesmo para um pipizinho simples você é obrigado a baixar, senão acaba molhando todo o sapato. Já que estava no inferno o jeito foi sair cumprimentando o Capeta. No momento em que eu me acomodei para fazer o tal pipi que era necessário, uma chinesa nua se prostrou bem na entrada do banheiro para esperar sua vez, o que claro me fez esquecer imediatamente a razão pela qual eu estava ali. Sai de mansinho e gentilmente cedi lugar a senhora que passou por mim toda esbaforida sem dizer uma única palavra, quanto mais obrigado. Sentou e fez o que queria fazer bem ali na minha frente sem a menor cerimônia. Quase morri depois dos cinco segundo que a tia havia entrado ali. Se ela tivesse muitos pecados, certamente estava deixando tudo aqui naquela hora. Sai correndo lá de dentro com falta de ar, achando que o mundo todo cheirava a banheiro chinês. Me deu vontade de saber se a tia chinesa havia saído viva do banheiro, porém é melhor morrer com essa duvida, do que chamar o resgate.

Enfim, para quem passou já viajou todo o planeta sentado, já passou por furacões na República Dominicana, por acidentes aéreos em Madrid, por escolta policial na África do Sul, ter se tornado um analfabeto na China me daria certamente à alegria de achar que a minha vida vai virar Best seller algum dia e que eu ainda vou aparecer no Fantástico.

Joel Thrinidad
Enviado por Joel Thrinidad em 03/02/2009
Reeditado em 20/07/2009
Código do texto: T1419733
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