DEUS ADAPTADO

Pessoas procuram Deus como quem procura um par de sapatos em uma loja – um Deus que sirva a seus propósitos. Por isto a maioria não encontra Deus, pois querem que Ele seja como o imaginam – como o concebem, e o imaginam de uma forma que os agrade, que os favoreça, que lhes sirva aos propósitos. Em regra, os ateus não encontraram Deus porque o Deus que eles encontraram não está de acordo com o que eles procuram, o que esperam de uma deidade. Para esses o Deus Criador não pode ser Deus porque tem por princípio censurar os erros humanos (e o ser humano erra em benefício de suas vontades). Tal repreensão os ultraja, pois aos seus próprios olhos são irrepreensíveis. Quanto aos deuses inventados, entretanto, não os aceitam porque são inconcebíveis do ponto de vista racional.

Na visão do pensamento natural (o que se dá com a maioria dos indivíduos da humanidade) um Deus tem que se pôr ao lado de cada indivíduo, concordando com seus pensamentos e bonificando seus atos. Dessa mentalidade é que nasce o paganismo e a variedade de deuses, pois, não vendo um deus que lhes sirva de cúmplice, tais pessoas criam seus próprios deuses segundo a sua própria vontade (assim como os ídolos – astros e estrelas humanos atuais), que lhes faça o que querem que faça, ou adaptam o Deus que já existe. É comum a muitos que dizem crer em Deus sustentar que Ele sanciona leis e princípios por eles mesmos inventados. Entre esses estão os maiores adaptadores de Deus, pois esses reconhecem o Deus Criador, porém não reconhecem, visto que não se submetem, Sua soberania, pois ficam interpretando isso, abolindo aquilo e adicionando aquela nova regra. Assim dizem nas entrelinhas que esse Deus não é perfeito, pelo que não pode ser Deus, pois Seus princípios não valem para todos e para sempre, Suas normas e palavras não são imutáveis, Ele é inconstante. As palavras dessas pessoas dão dizem claramente isto, ao contrário, confirmam esse Deus, o que fazem para manter-lhe a autoridade, a mesma que usam para sancionar as doutrinas, leis e ordenanças que elas próprias criam. Todavia, dizem objetivamente, pois em seus atos o contestam, destroem Sua reputação, fazendo que os incrédulos dEle tenham pavor, pois contestam tudo o que Ele estabeleceu, mudando Seu próprio caráter de um Testamento para o outro, concordando com os perversos no que dizem que Ele no Antigo era um tirano mimado e no Novo Seu Filho refreou-lhe os impulsos sanguinários. Isto fazem quando pregam que a Lei da Soberania do Criador, a mesma que serve para manter a humanidade Salva, foi revogada na cruz pela misericórdia de Seu Filho.

Deus não seria Deus se fosse conforme as pessoas querem que Ele seja, pois Deus deve ser um fator de referência. As mentes mais racionais esperam que um Deus que exista seja um modelo, uma referência permanente pelo qual o ser humano se guie para alcançar e manter o caráter elevado. Se Deus fosse conforme os indivíduos esperam que Ele seja (para o uso e satisfação individual), jamais se poderia esperar harmonia e continuidade, pois jamais alguém se sujeitaria aos princípios, pensamentos e costumes alheios (nem mesmo às leis dos países, pois elas derivam das concepções alheias), sendo que todos quereriam servir de referência (de exemplo) para os demais, pois o que se vê é cada indivíduo querendo impor ou impondo sua visão, sua opinião, suas regras e suas maneiras sobre o restante. Uns exigindo que todos vivam sem regras e outros inventando milhares de regras de interesse próprio. Se não existisse Deus, uma média acima das intenções individuais, todos seriam deuses e, se tivessem poderes, partindo dos quatrilhões de princípios (pontos de vista) desses tantos deuses, a humanidade, a Terra, a Galáxia e o Universo estariam perdidos, haja vista que, sem reconhecermos uns aos outros como deuses e desprovidos de poderes sobrenaturais, já arruinamos catastroficamente nosso planeta porque cada um quer dar uma utilidade particular para a natureza, a sociedade, a economia, a política, etc., quanto mais faríamos se fôssemos deuses e tivéssemos poderes.

Quanto a um Deus verdadeiro, espera-se que Ele seja um marco – o marco, a âncora, o ancoradouro conhecido numa rocha firme, imutável, o farol na mais visível torre, onde as pessoas saibam que Ele está e sempre estará, onde todo que procurar não seja surpreendido com Sua mudança repentina. Espera-se que um Deus verdadeiro seja o tira-teima, o elemento onde todos as discussões se dissolvem, a prova real de todas as coisas, onde as opiniões se harmonizem, o ponto de chegada de toda disputa, a esperança de todos revezes e discórdias. Espera-se que um Deus verdadeiro seja melhor e esteja cima dos demais em poder e caráter, não que seja volúvel e inconstante como somos. E seria correto se todos estivessem amarrados a esse Deus, esse porto, firmados nessa âncora, como o João e Maria da fábula deviam ter se amarrado a uma corda presa ao ponto de partida ao entrarem na floresta.

As pessoas não encontram Deus porque esse fator de harmonia não está de acordo com suas exigências. As pessoas querem outras coisas do seu Deus, por isto o adaptam para que Ele lhes sirva aos propósitos, pondo-os à frente dos outros, como guias, levando assim os demais a servirem a esses que adaptam Deus. As pessoas revogam a Lei de Deus justamente onde ela lhes censura os atos e obstrui os objetivos interesseiros. Muitos deles querem permissão para exercer o poder de pôr os demais a servirem-lhes por salários de fome, sem ter assim quem os censure. Outros querem ter a consciência livre para exercer o poder de praticar sua vaidade e mostrar-se melhor que os demais, enquanto esses demais não têm o que comer. A grande maioria quer poder para maltratar seus familiares, ignorar a miséria da sociedade e a carência dos desamparados. A Maioria dos crentes se aproxima de Deus por interesse no dinheiro, sendo igual aos incrédulos e ímpios, por isto devolvem o dízimo, que é uma ordenança que deve ser cumprida, mas nela está prometida riqueza e prosperidade como recompensa. Entretanto, transgridem a guarda do sábado, cuja recompensa prometida não é financeira, ao contrário, a ordem é para cessar-se o trabalho por um dia, pondo-se assim nas mãos de Deus, confiando que Ele proverá tudo o que faltar, deixando assim de pôr a confiança no ganho financeiro.

Entretanto, toda a Lei é a maneira que Deus criou e usa para harmonizar e proteger a indivíduos livres, os quais têm a predisposição de ignorar as advertências naturais sempre que elas ameaçam limitar-lhe os interesses e impulsos individualistas. A Lei de Deus é a forma escrita de Sua mão a barrar-nos a beira do abismo individual e coletivo ou no limiar de prejudicarmos nossos semelhantes com violência, abuso, exploração e indiferença, pois perdemos a capacidade de reconhecer e respeitar os limites. Se fôssemos conscientes e capazes de observar os sinais naturais dos limites respeitaríamos a Lei sem que ela sequer tivesse que ser escrita. Então ela estaria grafada em nossos corações, como Deus disse que chegará um tempo em que ela estará grafada. Todavia, se em bem de nossas intenções pessoais de riqueza, glutonaria e prazeres gerais, como a vontade de nos sobrepor aos nossos semelhantes, nos incapacitamos no reconhecer a qualidade e importância da Lei que está escrita, demonstrando que muito mais impossível seria agirmos em harmonia com ela por nossa própria vontade, – se assim fazemos, demonstramos que não reconhecemos a Deus como Criador e Soberano, declarando abertamente que Ele não é nosso Deus, sim mais um objeto de nosso uso para a satisfação dos nossos interesses. Sendo assim, esse Deus ao qual nos dizemos subordinados não é Deus, sim mais um ídolo que, não criamos, mas adaptamos a nossa vontade e vaidade. Portanto, somos idólatras, servindo ao deus que deixamos florescer em nosso interior, que não tem aspirações coletivas, que abre mão dos bons princípios em favor da satisfação de seus interesses pessoais e impulsos, que se deixa dominar pelos desejos mais primitivos, manobrando a razão em pról de satisfazê-los, que, por não ter nenhum poder, nem mesmo sobre si mesmo, demonstra ser tão impotente e fraco. Assim, servimos, mas não a Deus, sim a nós mesmos e como escravos, pois somos arrastados por nossos desejos. E assim, a exemplo da condição atual da sociedade e do planeta, nossas fraquezas continuarão nos destruindo até à aniquilação final, completa e absoluta do nosso planeta e da humanidade.