MORREU COMO UMA VIRGEM

Escrever sobre a capacidade que a TV possui de influenciar as pessoas, é a mais pura perda de tempo. Porque psicólogos, sociólogos, cientistas sociais e especialistas em comunicação já estudaram e ainda continuam a estudar o assunto, com empenho e competência. Mesmo assim há um aspecto específico, em relação a essa capacidade — facilmente observável por qualquer telespectador mais atento — que não quero perder a oportunidade de comentar e sobre o qual, certo dia, meu filho chamou a minha atenção:

— Pai, você já notou que esses canais, como o DISCOVERY e o MUNDO, estão reescrevendo a História dos Estados Unidos?

Não tenho a menor dúvida quanto a isto! Como a televisão é o mais poderoso veículo de comunicação de massa e serve aos interesses de quem pode pagar pelos seus serviços, é claro que alguns dos canais que consumimos por aqui estão incumbidos de melhorar, tanto quanto possível, a imagem do “Tio Sam”, entre nós e demais sociedades que os assistem.

Já escrevi sobre a minha declarada preferência pelas emissoras de TV que se especializaram em documentários. E dentre elas estão, justamente, esses dois canais. Mas nem por isto deixo de reconhecer que, nos programas cujos temas envolvem alguma participação norte-americana, a versão apresentada aos telespectadores sempre altera sutilmente certos detalhes, estratégicos na narrativa, de modo a beneficiar a imagem dos Estados Unidos para a História.

Nos documentários que esses canais produzem ou exibem, cubanos, russos, asiáticos, iraquianos ou árabes, de um modo geral, sempre são muito piores do que jamais o foram. Os simpatizantes de qualquer outro estilo de vida, que não o “american way of life” são, invariavelmente, espiões impatrióticos, que desejam todo o mal do mundo àquela gente laboriosa e bem intencionada, que são os estadunidenses. As eventuais qualidades daqueles que consideram os “representantes do mal”, via de regra, aparecem amesquinhadas; enquanto os seus defeitos são postos em destaque.

Seus espiões — assim como os espiões ingleses, a quem estão associados neste “marketing” — são pessoas que prestam relevantes serviços à democracia no mundo. E a CIA, uma Agência que nunca soube o que era a violação dos direitos humanos pelo mundo afora, que nunca patrocinou assassinatos e nem financiou golpes na América Latina.

Por outro lado, o “serviço sujo” nesta história peculiar, é sempre feito por latinos, negros ou asiáticos. E a conduta — politicamente correta — do policial médio daquele país, está muito mais para os papéis do incorruptível Clint Eastwood do que para os do “sempre corrupto” Harvey Keitel.

Há muito telespectador medianamente inteligente, mas bastante desinformado, que acredita nisto tudo, como acreditará em tudo mais o que lhe for transmitido pela TV. Desde a despropositada “potoca” de que o Mike Tyson tentou estuprar aquela espertalhona (que arrancou dele uma “grana preta”), até a conveniente versão de que o Bill Clinton teve com a ex-secretária (também muito esperta) apenas umas atenções e mimos de “executivo agradecido”. E, machismos à parte, se você fosse casado com uma mulher insípida como a Hillary, era capaz de andar por aí, atacando as estagiárias também...

Haverá de acreditar, da mesma forma, que os Estados Unidos só invadiram o Iraque porque havia armas nucleares no país de Saddan, prontas para serem disparadas contra as democracias do planeta. E que a infindável guerra do Afeganistão é movida pelo compromisso moral do “Tio Sam” de garantir o que é melhor para o sofrido povo afegão.

Estou seguro de que, se a “mídia televisiva” quiser, em alguns lares haverá quem acredite que os Estados Unidos venceram todas as batalhas de que participaram, que a grande preocupação do Tio Sam é com o bem estar dos outros países, que o Silvester Stallone realmente derrotou sozinho os vietcongs e, até, que a Jackie Onassis (ex-Kennedy) morreu como uma virgem.

Claro! Morreu tão virgem quanto eu morrerei escorpião!