TODO MUNDO É INCOMPETENTE... INCLUSIVE, O JÔ SOARES!

Há um escritor norte-americano, chamado Laurence J. Peter, que lançou — aí pelos anos 70 — um livro intitulado “The Peter Principle”. No Brasil, a obra, publicada pela José Olympio Editora, recebeu o inexpressivo título de Todo “Mundo é Incompetente... Inclusive Você”. Por isto, muita gente não teve interesse em ler o livro, perdendo, assim, uma excelente oportunidade de compreender o "Princípio de Peter" que, reduzido à sua expressão mais simples, vem a ser o seguinte:

“Todo ser humano é competente até um determinado nível. Mas quando o atinge, quer passar ao nível seguinte. E aí, fatalmente, torna-se incompetente”.

Lembro disto a propósito de alguns programas e apresentadores de tevê que todo telespectador, se não assiste com frequência, pelo menos conhece. E, mesmo sabendo que manter um programa diário ou semanal na televisão é algo que desgasta tremendamente a imagem do seu apresentador, estou seguro que o desgaste de alguns deles deve-se, muito mais, ao fato de haverem aplicado o princípio de Peter ao seu desempenho e ao seu trabalho, do que a qualquer outra razão.

É esta, para mim, a exata situação do programa “Jô Soares Onze e Meia”, que já foi o melhor “talk show” apresentado pela televisão brasileira. Atualmente, em minha opinião e apesar dos pesares, o melhor do gênero é o da Marília Gabriela, que considero uma excelente entrevistadora, a despeito daquele seu feitio de “proctologista em vias de iniciar o exame”, o que deixa o “freguês” entre tenso e constrangido.

A propósito, esse prazer estranho, algo sádico, de embaraçar o convidado, parece que tem sido a “pièce de résistance” de um sem número de apresentadores de tevê, dentre os quais se destacam o próprio Jô Soares (quando o entrevistado não parece ser do seu interesse), a Hebe Camargo e, disparado na liderança, quando ainda era vivo, o Clodovil.

Só eu, que não sou fã de nenhum dos três, já assisti, pelo menos uma vez com cada um deles, a algum episódio em que o “alvo da pressão” virou a mesa e avacalhou o final da entrevista. No Jô, foi o Lobão, que compareceu ao programa com umas trancinhas, que andou usando por uns tempos. E aí, depois de várias tentativas de “cercar” o convidado, o entrevistador virou-se para o roqueiro e mandou: “Sabe que você está a cara da Mercedes Sosa?” E o Lobão, de voleio: “E você, cada vez mais parecido com Betty, a feia!” O gordo perdeu a graça, ficou sem jeito e tentou consertar, mas o estrago já estava feito.

O Clodovil foi tentando embaraçar — logo quem? — o Supla, que, pelo visto, herdou a inteligência do pai e a caradura da mãe. Deu-se muito mal o “Clodô” (para quem pretendia ter um programa “de classe”), com o roqueiro amalucado subindo no tampo de vidro da mesa e sapateando, em ponto de despencar em cima do futuro deputado. Mas, aí sim, seria a glória!

E a Hebe machucou-se foi com o debochado e realmente engraçado cantor Falcão, depois de um programa quase todo tentando constrange-lo, sem sucesso. Ela fazia uma pergunta embaraçosa e ele matava a platéia de rir, com a resposta inesperada. Várias vezes. Então, já quase no final, ela provoca o cearense: “Falcão, você não acha essas suas roupas muito ridículas, não? E ele, com aquele sorriso cínico de sempre: “Ô Hebe, ridícula é você! “Véia” desse jeito e usando essa roupa de menininha!”. O auditório veio abaixo e ela dando aquela risadinha forçada, que sabe fingir como ninguém.

Mas voltando ao Jô Soares, insisto em dizer que ele já atingiu o seu nível de incompetência. O programa já mudou o cenário algumas vezes, mas não se renova. E o próprio apresentador perdeu a graça, quando trocou a sutileza pela grossura. Inventou alguns “bordões”, que fizeram o maior sucesso no início, mas não percebeu o momento de renová-los. Para quem imita, de forma escancarada, o programa do David Letterman — de quem copiou da caneca ao careca piadista — o Programa do Jô está vivendo mais da fidelidade do público do que da sua qualidade como “talk show”.

Não há telespectador, medianamente inteligente, que ainda agüente ouvir gracejos sobre o garçon atrapalhado, o riso descontrolado do Bira, a cara de bancário do Miltinho e a viadez do Derico. Tem mais: uma coisa é gostar — e até entender — de jazz e blues; outra é meter-se a cantá-los, sem garganta, nem afinação. Pois parece que reside, aí mesmo, o ponto fraco do “Jô Soares Onze e Meia”. O “gordo” é um homem brilhante (e quem duvida disto?): fala vários idiomas, teve uma educação refinada, estudou na Europa... Só que, como qualquer outro mortal, ele tem os seus limites. Coisa que insiste em não querer entender. É aí que, de um humorista engraçadíssimo, acabou virando um “mala sem alça”! São apenas exemplos, dentre os muitos que poderiam ser citados. Ás vezes, o entrevistador se evidencia despreparado para o “mote” da entrevista e insensível quanto à pessoa do entrevistado. Sem falar que, quando quer, por algum interesse ou mera empatia, favorece ou prejudica o convidado do programa.

Muitos haverão de discordar, porque, apesar de tudo, o gordo tem um público fiel, que o acha, simplesmente, o máximo! Mas, para ser sincero, penso que já passou da hora de renovar aquele programa dele. Que, atingiu, faz tempo, o seu "nível de incompetência".