Lágrimas infantis por uma violência adulta

Que é que essa menina tá chorando? Perguntei a minha esposa ao chegar em casa e ver minha filha, Fernanda - 09 anos chorando no seu quarto com a TV ligada.

Suas lágrimas corriam no rosto choroso a meio silêncio. Sua fisionomia de tristeza, lamentação e dúvidas estavam nítidas.

Não tive uma resposta imediata, porque outros assuntos adentram antes de descobrir o motivo das lágrimas que Fernanda ora derramava.

Enquanto comentava por algo que me deixara aborrecido, um tanto ríspido novamente perguntei: porque motivo essa menina está chorando?

Nesse momento eu já havia transformado os traços da minha face em dúvidas também. Internamente questionava-me o porquê das lágrimas? Do choro quase silencioso? Da tristeza daquela face infantil lamentando por algo que ainda não sabia e buscava respostas imediatas.

Sem demora, após o segundo questionamento do choro, veio a reposta acompanhada de uma pergunta: - A menina papai! Levou um tiro na cabeça e está em coma irreversível. Por que papai? Por que Deus? Clamava Fernanda por respostas que eu naquele momento não sabia dar-lhe. Contudo, "caiu a ficha": - Ela deve ter assistido ao jornal e viu o caso de Eloá. Deduzi imediatamente.

A mãe conduzia as sobrancelhas à cima como se dissesse: "já sabe agora o porquê?".

Um tanto mais frio e acostumado com essa violência diária em nossas vidas, comentei: - Precisa chorar? Isso acontece Fernanda, mas não precisa chorar desse jeito. Enfim, tentei trazê-la à realidade urbana de todo dia. Mas não consegui porque não é algo novo que surge, e por algum tempo ela ainda chorou.

Passados alguns minutos fui até ao meu interno senso de consciência e perguntei-me: Precisava chorar? Precisava?

Lamentavelmente a minha resposta foi que sim. Era a defesa de Fernanda contra o sentimento de medo dessa violência que ora cresce, que ora nos domina, que ora nos desmancha.

Um tanto preocupado com o sentimento que via em minha filha, de apenas 9 anos, tendo de encarar um "mundo cruel", com realidades brutas e sem fundamentos. Situações irreversíveis que nenhum de nós queríamos e queremos que aconteça conosco.

- É. Analisei com meus botões. Esse foi o primeiro embasamento para a resposta quer dei a Fernanda sem pensar. Não era comigo, por isso achei que não precisava chorar.

Bem, mas, até aí eu ainda pude responder. Porém, e Deus? Qual a resposta que ela, Fernanda, poderá ter de Deus?

Infelizmente é comum assistir aos telejornais e ver somente violência espremida em cada espaço jornalístico. Nos jornais impressos, tem dia que, com diz o velho ditado popular, "se você espremer sai sangue" de tanta notícia ruim.

Queria poder ter uma resposta contundente pelas lágrimas derramadas naquele semblante infantil, aterrorizada e atemorizada por essa violência constante.

Tudo bem, tudo bem meu Pai do céu! Infelizmente a gente acostuma com essas coisas, e sei que isso é a falta de Ti no coração dos homens e mulheres deste planeta. Afinal, não é o primeiro caso de crime passional que nos vem à tona. É mais um exemplo claro de uma paixão doentia. Isso definitivamente não pode ser amor.

Mas voltando ao assunto.

Ficou tarde. Era noite e Fernanda acabou distraindo-se com a novela e dormiu. E eu, ainda diluindo as lágrimas de uma criança pela "desconhecida" Eloá, que se vai à flor da idade, ainda debutante, vítima de um inconformado ser, exigindo um amor que ela não poderia mais lhe oferecer, faço das palavras infantis às minhas: Por quê? Porquê?

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Texto escrito no último sábado (18/10/2008) e publicado no jornal Diário da Região.

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Mário Pires é Profissional de Marketing.