MESSIANISMO

M E S S I A N I S M O

(Introdução ao livro do mesmo título. Autor: Pr. Serafim Isidoro.)

"Tal fato começou, por volta do ano cinquenta e nove dC, - cronologia da “Bíblia Alfalit”, edição mil e novecentos e noventa e seis - com o título ”Paulo se despede dos Anciãos da Igreja de Éfeso”.

Lucas, o médico, autor do Livro Atos dos Apóstolos, descreve o importante fato do querido vaso de Deus, Paulo, relatar-lhes que estava indo com destino a Jerusalém, compelido - "dedemenos" - “amarrado” pelo Espírito e sendo conhecedor de que prisões e tribulações lhe sobreviriam.

“De Mileto mandou a Éfeso chamar os Anciãos da Igreja. Logo que chegaram disse-lhes: Vós bem sabeis desde o dia em que entrei na Ásia, como em todo esse tempo me portei no meio de vós, servindo ao Senhor com toda humildade, com muitas lágrimas e tentações que pelas ciladas dos judeus me sobrevieram. Sabeis que nada que útil seja deixei de vos anunciar, e ensinar publicamente e nas casas. Tenho declarado tanto aos judeus como aos gregos que devem se converter a Deus, arrepender-se e ter fé em nosso Senhor Jesus Cristo.

E agora compelido -"dedemenos" - “amarrado” pelo Espírito, vou para Jerusalém, não sabendo o que me há de acontecer. Somente sei o que o Espírito Santo de cidade em cidade me revela, dizendo que me esperam prisões e tribulações. Mas em nada tenho a minha vida por preciosa, contanto que cumpra com alegria a minha carreira e o ministério - "diakonian" – “serviço” que recebi do Senhor Jesus para dar testemunho do Evangelho da graça de Deus. Agora, na verdade, sei que nenhum de vós entre os quais passei pregando o reino de Deus, jamais tornará a ver o meu rosto....” – At. 20:17-25.

Seria o começo do fim de uma vida nem tanto longa, porém gasta, sacrificada a um ideal maior numa renúncia de tudo o que se possa usufruir em benefício próprio ou com indiscriminadas intenções como é comum a todo o ser humano. Paulo entraria agora na reta final de sua vida constante de trinta e cinco anos de ministério, em jornadas por toda a Ásia Menor e parte da Europa.

A razão primordial de sua morte foi dedicar-se totalmente ao Cristo, ao Messias prometido pelas Escrituras. Nada, Paulo se propôs saber, senão a Jesus Cristo e Este, o crucificado. Sua pregação e o seu ensino foram centralizados em um assunto, em um tema, que contrariava os judeus ortodoxos, tradicionais.

Paulo se tornou um revolucionário da religião, da política, da moral, dos modos e até da liturgia da própria Igreja que era dirigida em Jerusalém por Tiago Pedro e João. Paulo era irredutível na negação do que se tratasse à seguir os ritos mosaicos, os preceitos judaicos, a guarda do sábado, a circuncisão. O que de fato acarretou a sua morte (decapitado em Roma na Via Ápia) foi sua intolerância ao judaísmo, mais especificamente à circuncisão e ao não mesclar judaísmo / cristianismo:

“A circuncisão nada é” – I Co. 7:19. – “Pois a circuncisão é coisa alguma, mas sim o ser uma nova criatura” – Gl. 6:15. “Eis que eu, Paulo, vos digo que se vos deixardes circuncidar, Cristo de nada vos aproveitará” – Gl. 5:2. Devido a sua filosofia quanto a essa doutrina, fora-lhe necessário ir a Jerusalém para se explicar perante a Igreja e o ministério ali constituído:

"Então alguns que tinham descido da Judéia ensinavam aos irmãos: se não vos circuncidardes, conforme o uso de Moisés não poda salvar-vos. Tendo tido Paulo e Barnabé não pequena discussão e contenda contra eles, resolveu-se que Paulo e Barnabé e alguns dentre eles subissem a Jerusalém, aos apóstolos e aos anciãos sobre aquela questão.

E eles, sendo acompanhados pelos irmãos, passaram pela Fenícia e por Samaria, contando a conversão dos gentios, e davam grande alegria a todos. Quando chegaram a Jerusalém, foram recebidos pela Igreja e pelos apóstolos e anciãos e lhes anunciaram quão grandes coisas Deus tinha feito com eles. Alguns, porém, da seita dos fariseus, que tinham crido, se levantaram, dizendo que era mister circuncida-los e mandar-lhes que guardassem a lei de Moisés.

Congregaram-se os apóstolos e os anciãos para considerar este assunto. E havendo grande contenda, levantou-se Pedro e disse-lhes: Varões Irmãos, bem sabeis que já há muito tempo Deus me elegeu dentre vós, para que os gentios ouvissem da minha boca a palavra do evangelho e cressem. E Deus, que conhece os corações, lhes deu testemunho, dando-lhes o Espírito Santo, assim como também a nós; e não fez diferença alguma entre eles e nós, purificando o seu coração pela fé.

Agora, por que tentais a Deus pondo sobre a cervís dos discípulos um jugo que nem nossos pais nem nós pudemos suportar? – Mas cremos que seremos salvos pela graça do Senhor Jesus Cristo, como eles também. Então toda a multidão calou-se e escutava a Paulo e a Barnabé que contavam quão grandes sinais e prodígios Deus havia feito por meio deles entre os gentios.

E havendo-se eles calado, Tomou Tiago a palavra, dizendo: Varões irmãos, ouví-me: Simão relatou como primeiramente Deus visitou os gentios para tomar deles um povo para o Seu nome. E com isto concordam as palavras dos profetas, como está escrito: Depois disto voltarei e reedificarei o tabernáculo de Davi, que está caído; levantá-lo-ei das suas ruínas e tornarei a edificá-lo, para que o resto dos homens busque ao Senhor, e também todos os gentios sobre os quais o Meu nome é invocado, disse o Senhor que faz todas estas coisas que são conhecidas desde toda a eternidade.

Pelo que julgo que não se devam perturbar aqueles, dentre os gentios, que se convertem a Deus, mas escrever-lhes a se absterem das contaminações dos ídolos, da prostituição, do animal sufocado e do sangue. Porque Moisés, desde os tempos antigos, tem em cada cidade quem o pregue e a cada sábado é lido nas sinagogas. "Então pareceu bem aos apóstolos e aos anciãos com toda a Igreja, eleger varões dentre eles e enviá-los com Paulo e Barnabé a Antioquia, a saber, Judas, chamado Barsabás e Silas varões distintos entre os irmãos – At. 15:1-22".

Este Concilio, realizado em Jerusalém doze anos após o Pentecoste, e dez anos depois da conversão de Paulo, definiu favoravelmente a posição contrária deste aos ritos mosaicos, à circuncisão e estabeleceu a supremacia da Igreja sobre o judaísmo.

O problema da circuncisão apresentar-se-ia sério quando alguém, judeu-crente, comunicasse ao apóstolo o nascimento de um menino em sua família. Circuncidaria ou não esse filho? - Entendemos que Paulo seria taxativo: NÃO. – Mas onde ficariam então as prescrições que Deus fizera a Israel, já desde Abraão, dizendo ser a circuncisão um “estatuto perpétuo”? Se Paulo (em Cristo) anulava a circuncisão (e também o sábado) não estaria desobedecendo ao próprio Deus? Não fora, Jesus mesmo, circuncidado? E ele, Paulo, também não fôra circuncidado?

À questão se entende, quando compreendido o fato de que Israel é Israel, e de que Igreja é Igreja.

São dois povos, são dois pactos, são duas dispensações distintas, diferentes. A circuncisão, sem dúvida, será restaurada na sua prática desde a futura dispensação da Tribulação, após ao arrebatamento da Igreja, época em que o judaísmo terá novamente a sua proeminência. Mas na dispensação da Igreja, agora, o judaísmo, a guarda do sábado, a circuncisão e os ritos judaicos nada são para a salvação em Cristo. Jesus foi circuncidado. Veio para o que era Seu povo; cumpriu a Lei em todos os seus preceitos; veio para os judeus. Como eles não O quiseram, então Ele deu-Se aos gentios. - Propósito antigo e oculto de Deus, mistério, o Evangelho.

Paulo era judeu; veio da tribo de Benjamim. Foi circuncidado (antes de conhecer a Cristo - é lógico). Mas as igrejas fundadas por Paulo não circuncidavam e não seguiam os ritos mosaicos. O que ocasionou a prisão de Paulo, oito anos depois desse concílio realizado em Jerusalém, ocasião dos acontecimentos que sucederam o que está registrado em Atos capítulo vinte, foi a sua repulsa à circuncisão. Essa doutrina o desestabilizou frente os judeus seus perseguidores, embora tivesse ele procurado evitar o confronto:

"E logo que chegamos a Jerusalém, os irmãos nos receberam de muito boa vontade. No dia seguinte Paulo entrou conosco em casa de Tiago e todos os anciãos vieram ali. E, havendo-os saudado contou-lhes minuciosamente o que por seu ministério fizera entre os gentios.

E ouvindo-o eles, glorificaram ao Senhor e disseram-lhe: Bem vês irmão, quantos milhares de judeus há que crêem, e todos são zelosos da Lei. E já acerca de ti foram informados de que ensinas a todos os judeus que estão entre os gentíos a apartarem-se de Moisés, dizendo que não devem circuncidar os filhos, nem andar segundo o costume da Lei. Que faremos? – Em todo caso é necessário que a multidão se ajunte, porque terão ouvido que és vindo. Faze, pois, isto que te dizemos:

Temos quatro varões que fizeram voto. Toma-os contigo, santifica-te com eles e faze por eles os gastos para que raspem a cabeça, e todos ficarão sabendo que nada daquilo de que foram informados acerca de ti, é verdade, mas que também tu mesmo andas guardando a Lei. Todavia, quanto aos que crêem dos gentios, já nós havemos escrito e achado por bem que nada disso observem; mas que só se guardem do que se sacrifica aos ídolos, do sangue, do sufocado, e da prostituição.” – At. 21:17-25.

Paulo aderiu a essa dissimulação, uma espécie de tapeação para com os judeus, já que ele não cria, não pregava e não ensinava dessa maneira. As conseqüências foram catastróficas, porque ele e seus companheiros, que sendo gentios, não poderiam estar no templo participando de cerimônias judaicas, foram presos quando dali saíam, sendo arrastados por uma turba desenfreada de judeus fanáticos.

Desencadeava-se assim o início das cenas finais da vida e do ministério de Paulo, aquele que dissera: “Cumpro no meu corpo o resto das aflições de Cristo” - Cl. 1:24. - Seria ele, depois, encarcerado por dois anos em Cesaréia, levado para Roma, onde finalmente, após mais dois anos de prisão, seria decapitado por ordem de Nero, o Imperador.

“Eu lhe mostrarei o quanto há de padecer pelo meu Nome...” – At. 9:16. - dissera Jesus a Ananias, referindo-se a Paulo.

O que se depreende de toda esta narrativa é que o cristianismo, em determinadas épocas sofre uma pressão de retorno ao judaísmo, às práticas e ensinos judaicos que procuram mesclar a simplicidade do Evangelho.

A reforma religiosa praticada por Martinho Lutero foi um marco divisório na história da religião mundial, mas não colimiu, não isentou o cristianismo do judaísmo, doutrina utilizada desde a era apostólica - veja-se a diferença na prática nas doutrinas de Pedro e de Paulo, um apóstolo à circuncisão e outro apóstolo aos gentios - doutrina esta que era alicerçada no sacerdócio da Velha Aliança, na monarquia dos judeus e até em um celibato à maneira dos nazireus.

A igreja que Lutero reformou continuou, assim como a igreja de onde ele viera, a práticas judaicas, a ensinos do judaísmo mesclados ao cristianismo e a uma teologia fortemente agregada aos judeus, à Velha Aliança, haja vista os credos os catecismos e as citações delas em excesso nos livros. Apesar de Deus nos haver legado uma Nova Aliança contida em vinte e sete livros neo-testamentários, a Igreja cita, ensina e prega alicerçada fundamentalmente em personagens, histórias, exemplos de Abrão, Moisés, Davi, Salomão e dos reis e heróis do judaísmo.

As declarações de fé, os manuais de doutrina e os catecismos (até hoje) continuam repletos de citações da V.A. O motivo da produção deste livro é a observação que estamos fazendo há anos, desta forma de cristianismo mesclado, que não produz caráter (vida prática) dos ensinos do Mestre, mas que procura igualar-se à justiça dos judeus e não ao amor de Cristo. Por mais exigente que seja a Velha Aliança, não se iguala aos ensinamentos e preceitos revolucionários do Mestre Jesus.

Na Nova Aliança tudo é novo, tudo é simples e só há dois símbolos: o batismo e a ceia do Senhor. Nada de títulos, nada de simbologias, nada de comemorações, nada de suntuosidades. O Cristianismo de Cristo e de Paulo fundamentalmente não necessita de trinta e nove livros para ser exposto. Sua literatura nem precisa ser interpretada; ela própria se interpreta. Ela se adapta às sociedades todas, às culturas mais simples ou às exigências mais refinadas do saber. Serve para ricos e para pobres; para doutos e indoutos; para jovens, crianças e velhos. Cristo é o seu centro; a figura modelo, a mensagem poderosa, o personagem que mais o mundo deveria estudar e conhecer.

Nos dias odiernos, poderemos assistir a igrejas durante anos e pouco sabermos acerca do Senhor. Dele pouco se fala; somente nas entrelinhas. Poder-se-ia perguntar: “Quem dizem os homens ser o Filho do homem?” – Quantos sermões falam especificamente Dele? – E de Sua morte? De Sua vida? Do Seu nascimento virginal? Do Seu ministério? Das Suas curas e milagres? Da Sua ressurreição? Da Sua mediação como Sumo Sacerdote? Da Sua vinda para o rapto da Igreja? Da Sua segunda vinda para reinar em Israel e nas nações? Do Seu juízo sobre as gentes? Do Seu juízo final? E de Sua glória eterna? – Quantos sermões temos ouvido acerca desses temas? – "De certa forma, agora é que este pequeno livro vai começar..."

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