Impressões rasas - as fotografias de alguns escritores e poetas num jornal de Goiânia...

Impressões rasas - as fotografias de alguns escritores e poetas estampadas num jornal de Goiânia.

Me caiu nas mãos, a pouco, um caderno encartado no jornal "O Popular", que circula em Goiás, denominado "Vestiletras", cujo público visado são os pré-vestibulandos e, o escopo é a veiculação de ensaios de análise sobre as obras de autores selecionados para os vestibulares das maiores universidades locais.

Na capa do tal encarte, estão, as fotos, pela ordem, de Ivan Ângelo, Adélia Prado, Clarice Lispector, Marina Colasanti e Afonso Félix de Souza.

De Ivan Ângelo só li "Malagueta, Perus e Bacanaço" e, a despeito da leitura prazerosa, não sei se impressionou muito. Já Adélia Prado me encantou vivamente, desde que a li, a partir de um comentário do Ziraldo, lá pelos anos 80 - ela, é dona de um fazer poético genuíno, e de uma simplicidade profunda e misteriosa. Clarice Lispector é uma autora que me impressiona pela incrível capacidade de mergulhar corajosamente e, prescrutar o mais recôndito da alma e do ser. Marina Colasanti, confesso, li pouco e, olhe lá, em artigos publicados numa revista semanal. Já Afonso Feliz de Souza, modernista da segunda geração, é um poeta de competente fazer poético e, é, o meu poeta favorito dentro os goianos.

Mas, a minha intenção aqui, não é tratar de quaisquer aspectos da obra desses escritores e poetas consagrados, porque me faltaria conhecimento e competência para tanto. Quero falar é da impressão que me causou as suas fotografias, espalhadas na capa do "Vestiletras", um conjunto chamativo, senão provocadoras de algum comentário.

Ivan Ângelo, de braços cruzados e corpo um pouco recurvado para trás, na foto, domina a cena e, impressiona, do alto de seus cabelos embranquecidos, pelo olhar objetante e seguro - parece mesmo dizer estar seguro de que é bom escritor, impondo ao expectador uma desejada distância.

Adélia, com seus olhos miúdos, cercados pelos vincos do tempo e, seu sorrio tímido, me falam de uma alma rica de experiências, de vivências profundas, escondidas na delicadeza da timidez, denunciada pelos braços firmemente cruzados sobre o peito (a despeito de se mostrar, talvez, um pouquinho envaidecida, senão, seduzida pelo ato de ser fotografada).

O retrato de Clarice, para mim, é surpreendente (e foi ela, que me levou a estas linhas): ela está de lado, o rosto enquadrado pelo lado esquerdo. O queixo está levemente abaixado, parecendo confiante bastante na própria elegância e beleza. Os olhos - meu Deus, os olhos! - olham de uma forma corajosa e desafiadora para a câmera e, parece sondar desconfiado, seu maquinismo e, mais além o fotógrafo . A elegância da fotografia é ditada pela fotografada, que se exibe um belo penteado e vestes sóbrias. Mas, há algo mais - daquele conjunto expira muito da melancolia de Clarice (me ocorre a lembrança, agora, daquela espantosa e franca entrevista à TV Cultura, onde ela, se mostra, como pouca gente ousaria)... E, não sei porque, minha mente teima em associar essa foto, aqueles traços, em especial, os olhos amendoados, com as imagens das pinturas femininas de Lasar Segal!

Marina, exibe um olhar algo cansado, voltado para a esquerda. A mão forte e ossuda, indica um gesto de argumentação suspenso no ar, como se depois de ter consultado a memória sobre algum dado ou assunto, tivesse sido surpreendida por um assunto diverso que lhe puxou a atenção. A fotografia terá sido obtida durante um seminário ou evento parecido?

Por fim, a foto de Afonso Félix de Souza. O olhar perde-se em algum ponto distante, parecem sugerir distância ou questionamento do momento da captação da fotografia. Exibe um terno de linho branco - daqueles, que sua geração gostava de envergar, na juventude. As órbitas oculares, estão cercadas das rugas impostas pelo tempo e pelos rigores da vida. A boca, semi-cerrada parece denunciar a alguém que, à parte de seu ofício, enfrentou a vida em muitos combates e muitas fronteiras diferentes...

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O estudo da iconografia dos nossos grandes escritores, talvez valham muitos e bons ensaios e, boa literatura. Alguém com bom traquejo no ofício, nos poderia brindar com excelente literatura, se debruçando sobre a fala muda da iconografia dos nossos grandes escritores e poetas. De Machado de Assis, Clarice Lispector, Carlos Drummond de Andrade, Manuel bandeira, Stanislaw Ponte Preta e Millor Fernandes, por exemplo, restaram um legado de fotografias pra lá de interessantes.