A VIDA EM QUE MORREMOS

Não vivemos o hoje.

É triste constatarmos isso, mas é uma realidade. Não vivemos porque estamos a passar este tempo em função de outro. O hoje em função do amanhã... Um amanhã que, infelizmente, nem sempre amanhece em nossa vida.

E quando ficamos a maior parte da nossa existência sem alcançar a vida que almejamos, ou quando percebemos que os nossos dias estão por findar-se, passamos então para amenizar a nossa frustração, a viver voltados para o ontem - o ontem que, obviamente, não vivemos na sua plenitude já que estivemos sempre em função do futuro.

Não sabemos verdadeiramente viver o dia de hoje. Pela manhã já despertamos para viver na ansiedade das horas, desejando o passar rápido do tempo, uma vez que só ao término do dia, quando encerramos as nossas atividades, é que desfrutaremos de algum bem-estar. Entretanto, à noite, é quase sempre certo que dormiremos preocupados com o dia seguinte que, da mesma forma, não saberemos vivê-lo.

Sim, não sabemos viver o instante presente. Ansiosos, apressados, vivemos controlados, escravizados pelo horário, pelo calendário, pela agenda, aguardando sempre aquela liberdade esporádica ao final do expediente, ao final da semana, ao final do mês, ao final do ano, enquanto não chega aquele descanso que presumimos ser definitivo ao final do tempo de serviço, a tão sonhada aposentadoria. Isso faz com que cheguemos rapidamente ao final, sim, da vida, envelhecidos como que precocemente, cansados e desiludidos, sem ter percebido o longo tempo que passou e que, estupidamente, não aproveitamos tão apressados estivemos em passar os momentos que a vida nos concede. Agora só nos resta a consolação das lembranças de um passado mal vivido ou a de uma esperança numa vaga existência de outra vida além-túmulo.

Não sabemos viver a vida. Passamos a maior parte dela desperdiçando o tempo a fazer planos e, embora creiamos na felicidade, julgamos ser impossível encontrá-la aqui e agora, que se trata de algo que se acha sempre à distância, no tempo e no espaço, senão na eternidade, e só mesmo com o passar das épocas - ou desta vida - poderá ser alcançada. Todavia, quando nos tornamos idosos, quando vemos nos avizinhar a morte, somos tomados pelo inconformismo de que não vivemos o suficiente.

Talvez porque ignoramos que todo o tempo estivemos a viver não propriamente em função da vida, mas da morte.

“A vida - como bem disse o John Lennon - é aquilo que está acontecendo, enquanto você faz planos para outra vida".