OS CAVALOS MARINHOS “ESTRELA DE OURO” E “ESTRELA BRILHANTE”

Em l984, fizemos um importante artigo no jornal “A ENXADA”, sobre o Cavalo Marinho “Estrela de Ouro” do Condado, fundado pelo Mestre Biu Alexandre, em l981. Para redigir aquele artigo fizemos uma entrevista com o Mestre Biu Alexandre, na qual ele lamentou por nunca ter recebido apoio do poder público municipal.

Além de se apresentar no Auditório da Fundação Joaquim Nabuco - FUNDAJ, nas comemorações do Dia do Folclore, daquele ano, o “Estrela de Ouro” também era objeto de estudo de Sylvio Fougaray da Universidade de Paris e estagiário do Departamento de Antropologia da FUNDAJ. Fougaray gravou e fotografou alguns momentos dos ensaios do Cavalo Marinho a fim de mostrá-lo na França.

Essa pequena história demonstra há quanto tempo, o “Estrela de Ouro” é importante para a cultura condadense. Por tudo isso, ainda em 1984, passei a chamar Condado de “Terra do Cavalo Marinho”. Eu insisti neste lema pra Condado, principalmente depois que vi os órgãos do Governo do Estado adotarem Goiana como “Terra do Caboclinho” e Nazaré como “Terra do Maracatu”, e também depois que assisti a uma entrevista de Siba, do grupo “Mestre Ambrósio”, no Programa do Jô, do apresentador Jô Soares, na TV Globo, onde ele disse que em todo o mundo, o Cavalo Marinho só existia em Condado, Aliança, Camutanga e Itambé (Pedras de Fogo/PB).

O Mestre Biu Alexandre - Severino Alexandre da Silva, começou a botar figura aos 13 anos. Em 1979, ele fundou o seu “Estrela de Ouro” e hoje comemora o fato de ter os filhos e netos envolvidos no brinquedo. O seu Cavalo Marinho conta também com a presença do Mateus mais velho de Pernambuco, o nosso amigo Seu Martelo. Martelo e outros brincantes do Cavalo Marinho Estrela de Ouro integram o elenco do grupo Grial.

No ano de 2006, o Estrela de Ouro fez parte do Coletivo Pernambuco, representando o Brasil no evento “Brasil em Cena” na Alemanha.

“É uma tradição que nós temos. Desde pequeno eu acompanho Cavalo Marinho e toda vida eu achei bonito e gostei de Cavalo Marinho. Posso dizer que a cultura pra mim é uma benção e o Cavalo Marinho é o principal. Pra mim não existe outra brincadeira. Eu só me acabo dentro de Cavalo Marinho”. – Mestre Biu Alexandre

O Mestre Antônio Teles (Antônio Manuel Rodrigues), nasceu em 1932 e começou a brincar Cavalo Marinho aos 12 anos, como Mateus. Já desempenhou diversos papéis dentro de diversos Cavalos Marinhos. Como rabequeiro brincou 25 anos ao lado de Mestre Biu Alexandre. Em 2004, realizou o sonho de ter seu próprio Cavalo Marinho, com o apoio fundamental de sua filha Nice, que além de integrar o grupo também criou um Cavalo Marinho mirim. O Cavalo Marinho Estrela Brilhante integra o Ponto de Cultura Viva Pareia!, junto com o Estrela de Ouro.

“Pra mim é uma cultura importante. Não tem outra melhor. Desde 12 anos que eu brinco e gosto do Cavalo Marinho. É uma brincadeira simples, boa, sadia. Não tenho preconceito com ele.” – Mestre Antonio Teles.

Além dos Cavalos Marinhos “Estrela de Ouro” e “Estrela Brilhante”, Condado tem diversas pessoas que brincam em outros municípios, como é o caso de Zé Borba, que integra o Cavalo Marinho “Boi Pintado” do Mestre Grimário, de Aliança e do Mestre Biu Roque (João Soares da Silva), do Cavalo Marinho Boi Brasileiro, de Itaquitinga.

A dança, Cavalo Marinho, nasceu de artistas que têm em comum o trabalho na cana-de-açúcar, economia que viabilizou o começo da nossa história como país e foi quando surgiram as primeiras caras brasileiras. É um teatro de rua tradicional da Zona da Mata Norte de Pernambuco e uma das variantes do bumba-meu-boi.

O aparecimento do Cavalo Marinho, segundo seus Mestres e brincantes, aconteceu na época da escravidão quando os negros tinham apenas um dia por mês, de folga do trabalho, e nestes dias criaram essa dança. É uma dança folclórica muito religiosa que começa no mês de julho indo até o dia seis de janeiro (Dias de Reis), mas essa regra está sendo quebrada graças aos contratos que os grupos conseguem durante o resto do ano, o que é muito importante para preservação do histórico Cavalo Marinho.

A brincadeira é composta por músicas, danças, poesias, coreografias, loas, toadas e reúne cerca de 76 figuras (personagens), que podem estar pintadas, vestindo máscaras, paletós, chapéus, penas, golas ou armações de bichos. Estas figuras podem surgir em pernas de pau ou cuspir fogo.

São figuras que improvisam, dialogam e interagem com o público, distribuídos em 63 partes, tendo cada personagem uma história baseada na vida real. Esses personagens são divididos em três categorias: animais, humanos e fantásticos. Geralmente, 21 componentes são o suficiente para encarnar todos os personagens.

A apresentação é intercalada com a participação do público, dos brincantes e da entrada dos personagens, que têm como destaques Capitão Marinho, Mateus, Bastião, Soldado da Gurita, Empata Samba, Mané do Baile, Ambrósio, Valentão, Matuto da Gama, Mané Joaquim, Galante, Véia do Bambu, entre muitos outros.

Nesse espetáculo temos música, dança, canto e teatro, numa diversidade e riqueza que impressionam. A música e o canto são os fios condutores de toda a trama e são executadas pelo "banco" ou “orquestra” do brinquedo onde não são necessários muitos músicos e estes tocam sentados, com um instrumental formado por rabeca, pandeiro, reco-reco e mineiro (também conhecido por ganzá). Não se usam instrumentos de percussão, nem como apelação para chamar a atenção do público.

Na dança dos brincantes não existem rebolados nem giros, os passos são rasteiros, para levantar poeira, intercalados com saltos rápidos, vigorosos. Gestos que demonstram vigor físico com habilidade e beleza, ideal para quem tem bom fôlego. As sambadas varam a noite, pois uma apresentação completa dura nada menos que oito horas, sem intervalos.

O Cavalo Marinho se formata como teatro, o que faz dele uma das tradições mais peculiares do Brasil. Embora a música e a dança sejam elementos imprescindíveis, o funcionamento da brincadeira como um todo está voltado para o teatro.

É importante frisar também que esses anônimos que fazem a festa, não são tão anônimos assim. São pessoas simples, mas riquíssimas, com uma sabedoria única. Eles possuem histórias, sabedorias, cultura.