Sobre castas e a Verdade

Desde que foi ao ar pela primeira vez, a novela Caminho das Índias, escrita por Glória Perez e veiculada pela Rede Globo de Televisão, tem suscitado várias discussões sobre diferenças de costumes entre a cultura oriental hindu e a ocidental brasileira – sendo os dois países infestados de inúmeras variáveis culturais que determinam, por exemplo, desde como devemos cortar corretamente verduras e legumes até como devem se portar homens (sic) e mulheres (virgens, solteiras, casadas, viúvas...), entre inúmeros outros hábitos e crenças que nos fazem ter certeza não apenas de que os seres humanos (sic) são essencialmente diferentes uns dos outros, mas parecem mesmo terem se originado em planetas distintos a povoar a Terra.

Entre os muitos considerados “horrores” da cultura indiana, há um sistema de castas (ou varnas) explicitamente excludente, o qual, contudo, aqueles que nos colonizaram e administram negam tê-los inspirado a fundar tudo o que diz respeito ao arcabouço de valores, pensamentos e ações que constitui aquilo que aprendemos a considerar “nossos” hábitos e costumes, “nossa” cultura, tão socialmente excludente quanto o sistema de castas hindu – embora, ao contrário da Índia, pelas bandas de cá seja possível, e até desejável a uma saudável (sic) dinâmica social, que alguém essencialmente “pária”, tendo se tornado abastado o suficiente, possa casar-se com uma pessoa que, por aqui, nascida em “berço de ouro” – e apenas por isso – bem poderia ser confundida como pertencente à casta dos “brâmanes” pelos caminhos das índias.

Porque, pelas bandas de cá – como, de resto, parece-me, em qualquer lugar – “o importante mesmo é ter dinheiro”.

Num parágrafo acima, grifei a palavra “essencialmente” para destacar minha compreensão sobre o fundamento das evidentes diferenças entre as pessoas. Porque, hoje, a despeito de que me expressar aqui com tal honestidade possa socialmente me prejudicar (tendo em vista que a sociedade onde vivemos se fundamenta sobre os alicerces das muitas mentiras que mantém nosso status quo e suas muitas injustas exclusivas posições sociais), não abro mão de dizer a Verdade a evidenciar as gritantes e insuperáveis diferenças entre as pessoas que, bem intencionadas, reivindicam uma “igualdade” (racial, de sexos etc.) verdadeiramente impossível que se estabelece somente graças à prática de irresponsáveis arbitrariedades, muitas cometidas por aqueles que, por força de conchavos políticos e interesses de toda espécie, detêm os poderes que regem os valores que deformaram “nossa” sociedade – pra não dizer a sociedade mundial.

Entretanto, antes que a perversidade se servisse da política e de toda burocracia para determinar “quem é quem e quanto vale, ou o que pode vir a ser e valer”, o sistema de castas hindu foi idealizado a partir da observação do que ocorre durante as naturais encarnações da Vida, então percebida evidentemente como naturalmente discriminante quando a Se engendrar na forma de animais (irracionais e racionais), vegetais e minerais, entre outras de Suas muitas derivações.

Para que o leitor possa saber exatamente quais diferenças essenciais existem entre aquele considerado um “dalit” e um “brâmane”, na velha ou na nova Índia, será bom dizer que tal sistema de castas foi idealizado por um tal “Manu”, legislador indiano, que dividiu os membros de sua sociedade de acordo com as observações que fizera sobre a natureza diferenciada das pessoas, que se expressa inequivocamente pelos interesses que demonstram ter a aquisição ou não de certos conhecimentos e à propensão a execução de certas tarefas.

A despeito de que tenhamos gerado outras realidades – e a inclinação a pensar que não fazemos mais parte da Natureza, ou que “a superamos” – ainda estamos submetidos as suas leis. Como entre a extensa variedade de seres humanos (sic) existente, no âmbito do reino vegetal, por exemplo, um coqueiro jamais se tornará uma bananeira, e vice-versa – a menos que, como pretende a engenharia genética em franco desenvolvimento, manipulações possam ser feitas a fim de criar uma espécie de “cocneira”, embora talvez inevitavelmente a gerar sempre algo tão problemático como foi a tal ovelha Doly (lembram?), primeira experiência do processo de clonagem, que envelheceu e morreu precocemente; ou, mais recentemente, o “black and white” cantor norte-americano Michael Jackson, que também morreu (sic) jovem, provavelmente pelas conseqüências das interferências que decidiu realizar no corpo a se tornar o que não era.

Assim, aqueles que, hereditariamente (ou por vocação, como sabiamente se considerava outrora) demonstram interesses pelo desenvolvimento intelectual, na Índia são considerados “brâmanes”, os quais devem exercer a função de professores e sacerdotes. Os de natureza guerreira, os brigões, portanto, se tornam os “xátrias”, reconhecidos naturalmente competentes a prestação de serviços militares. Os inclinados aos negócios (com tendências a realização de trapaças e a exploração perversa da força de trabalho alheio), são os “vaishas”, sendo os dotados da vontade de servir considerados os “sudras”.

Os considerados “dalits”, ou “intocáveis”, são aqueles que não obedecem às regras da casta a que supostamente pertencem e, tendo cometido graves delitos, dela foram sumariamente expulsos, não sendo permitido, na Índia, misturas entre membros de castas diferentes, prática considerada por muitos sociólogos ocidentais causadora de uma sociedade conservadoramente “estática” – embora saibamos o quanto “nossa” democrática dinâmica social anda amargando incontáveis resultados negativos, em todos os seus níveis de relações, graças ao permanente estímulo arbitrário de certas misturas entre pessoas de culturas e situações financeiras extremamente diferentes. E tudo isso foi (e é) a causa das pequenas e grandes tragédias cometidas em nome desse estímulo a considerações igualitárias e a certas misturas por estas bandas da Terra, principalmente pela ação de certos movimentos sociais (como o que deu início ao chamado “Movimento de Emancipação Feminina”, que exigiu “direitos iguais” para mulheres e homens (sic), do qual incontáveis mulheres, hoje, se arrependem de terem estimulado a se realizar ao reconhecerem que tal movimento foi responsável, não apenas pela destruição de muitas famílias, mas também pelo acréscimo de uma excessiva carga de trabalho feminino – uma vez que a maioria dos homens (sic) não acatou a idéia de que deveriam se empenhar mais a execução de trabalhos domésticos; ou concordar que “suas” mulheres deveriam ter o mesmo direito a liberdade de ação sexual que eles – por razões de procriação , naturalmente dotados com quase incontrolável impulso a poligamia).

Imagino quanto muitas pessoas, especialmente as mulheres, estão boquiabertas com esse meu comentário “conservador”, indigno de alguém reconhecido um artista, que, supõem, num necessário exercício democrático, “deveria prezar pela absoluta liberdade de pensamento e expressão das pessoas a permitir e estimular a fazerem o que lhes der na telha”. O problema é que, na Verdade (e muitas vezes eu odeio essa grande destruidora de ilusões), nenhuma família, nenhuma sociedade pode resistir às investidas de um povo ainda extremamente mal educado como o nosso ao exercício da Democracia.

Olhe para o passado e, mais, para o presente: você será forçado a reconhecer que, apesar de certas “conquistas”, a história toda tem demonstrado que não estamos prontos para ser e viver das muitas formas ideais que imaginamos – nem mesmo ainda como os “simples” seres Humanos que verdadeiramente não somos; ou da forma como demonstrou o escritor inglês Aldous Huxley em seu livro Admirável Mundo Novo, onde imaginou uma futura sociedade tecnológica-geneticamente preconcebida a gerar castas, ou biótipos de pessoas que, formadas em úteros artificiais, sem sequer imaginar o que seja uma família (tendo a prática sexual apenas como mais uma fonte de prazer, sem as más conseqüências de uma indesejada concepção e sua conseqüente necessidade de violentas medidas abortivas e seus traumas), e também graças a uma educação hipnopédica , são “condenadas” a se sentirem felizes realizando as tarefas que foram criadas e condicionadas a realizar, sejam quais forem (a despeito de que toda a liberdade de pensamento, toda criatividade, toda filosofia e toda forma de arte tenham sido suprimidas do Mundo Novo, consideradas apenas “reflexos de uma indesejada instabilidade individual e social”).

Porque, “nas práticas, as teorias são outras” – reconhecerão todos os que tentarem experimentar ser o que, de fato, não são e jamais serão; quer individual ou coletivamente; quer aqui ou na Índia.