RITUAIS APENAS. MAS, ONDE ESTÁ A TRANSFORMAÇÃO?

Há muito tempo venho pensando que o evangelho foi criado, por isso que etimologicamente significa “boas novas”, para que nos tornássemos pessoas melhores. A exemplo de Jesus Cristo, o autor dessa boa nova, que atraia multidões para si e para ouvi-lo, o que ocorre hoje com os pregadores dessa “boa nova”, é o contrário – ao invés de atraírem pessoas para si, as afastam. Ou se atraem, é apenas para torná-las escravas de um Deus castrador, manipulador, e neurótico, criado a imagem e semelhança do homem, e não segundo a razão, a coerência e o bom senso.

Enquanto penso que o Deus de verdade é extremamente inteligente, deixando com o homem a liberdade de fazer suas próprias escolhas usando o que ele tem de mais transcendente e fantástico em seu corpo que é sua mente, sua inteligência, o Deus falsificado, seqüestra do homem, além de si mesmo, aquilo que ele tem de melhor que é sua excelência, sua identidade, seu direito de usar essa inteligência e sua sabedoria para fazer as melhores escolhas para a sua vida. E se não forem as melhores, pelo menos, através delas ele pode usar o que lhe é mister: o direito de ser dono de suas vontades.

Nossa que heresia você está escrevendo, diriam os que não pensam. O homem ser dono de si mesmo? Que despautério!!! O homem não pode viver sem Deus, sem Jesus! O homem não pode fazer nada sem que Deus permita! Eu digo que sim, haja vista que a maioria vive feliz e realizada, porque não vive pela fé, como dizem, mas com seu trabalho, com ousadia diante da vida e dos problemas.

Digo que homem pode viver sem Deus sim, sem Jesus, porque vivem mesmo e são muito mais felizes do que os evangélicos.

Ao contrário dos que vivem dentro das religiões, inclusive, das ditas evangélicas, que abriga dentro de si um enorme potencial de pessoas problemáticas, infelizes, preconceituosas e criadoras de estereótipos, que não conseguem fazer nada, vivem na zona do conforto na expectativa de que Deus, num passe de mágica, lhes diga o que podem ou devem fazer. Afinal, só se pode fazer algo se for da vontade dEle.

Mas que critérios esse pessoal usa para saber qual é, e qual não é a vontade de Deus? Quanta complexidade, digna de um estudo psicológico acurado e profundo.

Quanta burrice teológica, porque na verdade, essa crença, nada mais é do que um mecanismo de defesa, usado como forma de sobrevivência emocional, na tentativa de esconder o medo, a insegurança, de ousar, de pensar nas alternativas que podem levar esses religiosos a busca de seus objetivos.

Dessa forma deixam de pensar por si mesmos, ou transferem para seus líderes a responsabilidade de pensar por si.

Eu digo que sim, porque a cada dia a ciência avança, cria, faz e desfaz, e a maioria desses cientistas não usa Deus para fazerem da ciência uma fonte de benção para a humanidade, pois usa o que Ele lhes deu – a inteligência, tão pouco usada pelos evangélicos – com quem convivo há mais de 35 anos.

Como evangélico, observo que a Igreja não passa de um clube social, um lugar de encontro, um lugar onde as pessoas vão apenas para participar de um ritual, sem que esse ritual, lhes propicie uma transformação genuína, naquilo que segundo penso, foi, e é, a mensagem central do evangelho: crer nos princípios que Jesus ensinou para que nos tornemos pessoas melhores.

Ontem estive ministrando uma palestra sobre “Adicção afetiva” para um grupo de formado por pessoas solteiras, viúvas, separadas judicialmente e divorciadas, de uma Igreja Batista. Durante a palestra citei a questão dos rituais nas igrejas evangélicas, e fiz aos presentes a seguinte pergunta: o que vocês levam pra casa no que tange a princípios ouvidos que os levem a querer mudar alguns aspectos da vida de vocês? A resposta foi um silêncio mórbido.

Afinal, o que se ouve hoje nas igrejas não passam de sermões insípidos, sem consistência, sem criar impacto, e se cria, é apenas para colocar culpa ou levar as pessoas a se alimentarem de pensamento mágico, que consiste em ficar esperando por vitórias e soluções sem ter que fazer nada, com promessas de cura, prosperidade, resolução de problemas etc.

E há quem ainda cai nesses apelos manipulativos e deletérios, porque roubam o que o ser humano tem de melhor, sua mente, sua habilidade de pensar por si só, sem ter que passar procuração para que outra pessoa pense por ela.

A igreja evangélica, como qualquer grupo, faz dos rituais uma forma de sobrevivência e de engodo, não que os rituais não sejam importantes, tendo em vista que eles fazem parte de nossas vidas, com outro nome e de forma sistemática, como no simples ato de levantar todos os dias, escovar os dentes, tomar banho, trocar de roupa, passar desodorante, pegar o carro, fazer o itinerário para se chegar ao trabalho etc. A tudo isso chamamos de rotina, e não tem a função de manipular ninguém, mas a de atender a uma demanda pessoal, e ainda porque não faz parte de um cerimonial.

Mas os rituais nos grupos religiosos tem com objetivo a manutenção do controle e da manipulação ainda que isso não seja declarado ou proposital, mas ocorre de forma inconsciente, através de jogos psicológicos que, para quem não pensa, são usados como forma de seqüestro de sua subjetividade.

Mas o que é um ritual?

A palavra ritual deriva-se do latim Ritualis. São ações relacionadas ao misticismo e a religião que podem ser praticadas individualmente ou não. Pode ser cerimonial, quando há a necessidade de uma preparação quanto ao local, a vestimenta, aos materiais e aos instrumentos utilizados, ou psíquico quando pretende-se interferir e/ou transformar algo no mundo físico.

Um ritual pode ser executado a intervalos regulares ou em situações específicas. Pode ser executado por um único indivíduo, um grupo, ou por uma comunidade inteira; pode ocorrer em locais arbitrários, específicos, diante de pessoas ou privativamente. Um ritual pode ser restrito a certo subgrupo da comunidade e pode autorizar ou sublinhar a passagem entre condições sociais ou religiosas.

Os rituais são característicos de quase todas as sociedades humanas conhecidas, passadas ou atuais.

Os grupos religiosos, dentre eles os evangélicos, usam os rituais cerimoniais. Os rituais cerimoniais, usados pelos evangélicos, são aqueles que normalmente são usados em casamentos, batizados, velórios, formaturas e outros. Já os rituais psíquico, também usados por esses grupos religiosos, são usados para acionar ou bloquear energias e/ou forças sobrenaturais, criar, alterar e até desencadear forças naturais. Para isso usam algumas ferramentas-chave para que o ritual dê certo, como:

MÚSICA: nenhum culto numa igreja evangélica começa sem música, que para seus adeptos, serve como louvor e adoração, e chamada para a conexão com o sagrado, mas que no final, só serve para um ôba, ôba em massa.

Durante um culto é comum se cantar dois, três, quatro e a até 10 musicas, que muitas vezes são repetidas mais de uma vez, dessa forma o que era 10, se transforma em 20, 30 e assim vai, e ainda é comum se cantar em pé. Haja paciência!

PALAVRAS: Como já sabemos, as palavras que falamos tem poder e para que um ritual funcione da forma desejada tudo o que se deseja deve ser dito, nesse quesito é bom lembrar que antes, durante e depois que uma musica é cantada os clichês se manifestam de forma extremada. Dentro eles destaco: “Senhor estamos aqui para te adorar”; “Senhor só o Senhor é digno de Adoração”; “Senhor enche-nos de tua graça e teu poder”; “Oh! Senhor, nós te adoramos. Nós declaramos teu poder”. E se a musica, fala de necessidades, os clichês mais usados são: “Senhor declaramos libertação, prosperidade”; “Nós profetizamos a solução da cura de quem está doente” etc.

Nessa altura a igreja entra em delírio e alucinação coletiva.

MÃOS: atualmente as mãos estão em moda nos rituais da igrejas, haja vista que elas servem para identificar os que entram em conexão com os céus. Dessa forma é muito comum na hora do louvor as mãos, sempre a direita, se levantarem por todo o santuário, revelando quem está “sentindo a presença de Deus”, ao mesmo tempo em que denuncia quem anda freqüentando outra igreja, já que nas igrejas batistas, não é comum esse gesto em seus rituais, sendo essa prática comum nas igrejas neo-pentecostais.

LEITURA: a leitura do texto sagrado é parte inequívoca do ritual. Durante o ritual o ministro lê a palavra, geralmente no inicio do ritual e depois como base de seu sermão.

O SERMÃO: parte fundamental do ritual. É através dele que o ministro, segundo sua visão, fala ao povo O obedeçam, que não façam nada sem sua autorização, que todos se submetam unicamente à sua vontade. Serve também para chamar os crentes a responsabilidade com a leitura da Palavra, para que suas mentes não se tornem reféns de idéias satânicas, além de reforçar a crença nos dízimos e ofertas, como ainda, de deixar os crentes mais culpados do que já se encontram, já que a chamada para a santificação é enfática, bem como o desprezo pela humanidade de cada um.

Os propósitos dos rituais são variados. Eles podem incluir a concordância com obrigações religiosas ou ideais, satisfação de necessidades espirituais ou emocionais dos praticantes, fortalecimento de laços sociais, demonstração de respeito ou submissão, estabelecendo afiliação, obtenção de aceitação social ou aprovação para certo evento - ou, às vezes, apenas o prazer do ritual em si.

Nesse sentido, termino dizendo que o individuo vai a uma igreja anos e anos, participa ativamente de todos os seus rituais, mas ai surge a grande pergunta; em que tudo isso lhe causa uma transformação relevante? O que cada um leva pra casa que o faça querer mudar de vida? Em que tudo isso o torna uma pessoa melhor? Eu respondo: NADA, infelizmente!. E se estou errado com essa afirmação, que os céus me condenem.

Edivaldo Pinheiro Negrão

Psicólogo, com formação ainda em Teologia, Filosofia e Pedagogia. Além de Professor de Psicologia e Filosofia, ministra palestras na área da saúde emocional em empresas, escolas e igrejas.

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