Aos sessenta e quarto aninhos, sou parte de uma geração que conheceu ...

Afinal, o que está acontecendo? - Luiz de Aquino

O video está no Youtube - http://www.youtube.com/watch?v=UI2m5knVrvg – e, no texto de narração, ouve-se que foi veiculado em 2007 – há dois anos, pois. Mas só agora chegou a mim. Como se vê, a Internet é tão vasta que mesmo para alguém que se conecta todos os dias, por algumas horas diárias, muita coisa importante passa ao largo.

Aos sessenta e quarto aninhos, sou parte de uma geração que conheceu o ferro (de engomar, ou “de passar roupa”) a brasa, a pena de escrever (com tinteiro e mata-borrão), a caneta-tinteiro, o surgimento da esferográfica, o fim da lousa individual (cada aluno levava consigo uma peça de ardósia fina, no tamanho convencional de uma página de caderno), o “zipper” (ou fecho-éclair) nas braguilhas, a substituição das máquinas de escrever por teclados eletrônicos e computadores individuais.

Existem os resistentes, tal como existiram em todos os momentos da História. Estou entre os que aprenderam que não basta conhecer o passado sem se ligar ao futuro, e entendo que o presente é isso: aponte real entre dois tempos inexistentes, o ontem e o amanhã. Como se fôssemos, cada um de nós, seres virtuais, se considerados na ótica do tempo, essa dimensão que todos pensamos entender, mas na qual nem sempre nos situamos.

Comecei a “navegar” na Internet em 1996. Pessoas da minha idade, na época, olhavam o computador como quem se depara com um tigre de bengala caçando cotia num parque urbano, seja na Avenida Paulista, no Aterro do Flamengo, no Parque Farroupilha aqui, na esquina onde meu prédio foi fincado. Não me surpreendo com as inovações da moderníssima tecnologia e sei muito bem abusar dos adolescentes que decifram teclados e códigos “raitec” como quem devora uma belíssima macarronada. Gostaria de ter um Opala 73, naquele modelo original do selo, desde que com ar condicionado, erbegue, direção hidráulica, freio ABS e, se puder ainda, um modesto GPS bem alimentado com dados brasileiros. Não podendo, queria então poder comprar um Civic ou algo parecido, com tais recursos.

Esta semana, Nilson Gomes falava-me de seu propósito de substituir a velha biblioteca de alguns milhares de livros pelo direito (que já temos) de acessar as centenas de milhares (ou mesmo milhões) de livros digitalizados. Eu, não. Ainda que o malfadado acordo da Língua Portuguesa, ao qual apenas o Brasil adere de fato, transforme meus livros em peças antigas e obsoletas, vou conservá-los comigo. Minha viúva e meus órfãos talvez os jogue fora, talvez os doe a alguma biblioteca pública, comunitária ou escolar. Cada um desses livros conta-me uma história, foram eles (e meus discos de vinil, meus cedes e meus quadros) que me ensinaram o valor da solidão, a importância de eu curtir a mim mesmo.

Os meninos adolescentes desta era de bites e satélites são mágicos, aos meus olhos. Eles podem ser muito bem informados, quando o querem. Se aprenderem a selecionar as informações, serão geniais já no início da idade adulta. Precisam apenas aprender a ligar o ontem e o hoje. Meu receio é que se ocupem demais do futuro e seus edifícios de vida fiquem sem alicerces.

Nestes treze anos de andanças pela rede mundial, fiz inúmeras relações de amizade. Pelo meu perfil, aconteceu o que se podia esperar – fiz amigos no meio literário (escritores e afins, como leitores, professores, bibliotecários etc.). Com a Internet, o Brasil ficou bem menor, reencontrei amigos que se perdiam nos anos e estavam tão próximos, e também reencontrei meninos da minha infância, garotos da minha adolescência. Não quero mais viver sem eles. Se posso, vou ao seu encontro; se não posso, mantenho amizades virtuais.

E “la nave va”... Ou, em linguagem dessa belíssima geração de jovens, a fila anda. Entre um tempo e outro ao computador, conectado à Rede Mundial, saio à rua, dirijo um velho automóvel, exerço ações tradicionais, como a fila do banco, a espera nos congestionamentos, o bom-dia a um velho amigo que passa, as horas de conversa e cerveja num bar – e os bares, ainda que administrados com recursos eletrônicos e oferecendo telões onde vemos xous e futebol, têm a mesma alma das tavernas de outras épocas.

A vida segue seu curso, feito o rio visto por Heráclito. E não somos mais nós mesmos. Ao terminar este texto, não sou mais o mesmo que começou a escrevê-lo, pois aprendi com ele (o texto). Ao concluir, envio-o ao jornal, posto-o no blog e envio-o a vários leitores via Net. Mudei-me, sem sair do lugar.

Luiz de Aquino (http://penapoesiaporluizdeaquino.blogspot.com) é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras, e escreve aos domingos neste espaço.

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Luiz de Aquino (Alves Neto)

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http://www.vaniadiniz.pro.br/luiz_de_aquino/index.htm

http://discutindoliteraturacronicas.blogspot.com/

Douglas Lara
Enviado por Douglas Lara em 17/09/2009
Código do texto: T1816444