* * * UMA AVENTURA NA INDIA * * * Parte 1

Publicado por Marcondes Brito no Correio Braziliense em 06/08/08

Ao desembarcar no Aeroporto Internacional de Nova Délhi, o turista pode sentir, em poucos minutos, o desafio de viver e de se aventurar por um país com quase 1,2 bilhão de habitantes.

Preste atenção nos números: o Brasil, nosso país de dimensões continentais, representa só uma vírgula numa comparação populacional com a Índia. Pois bem, logo no desembarque,

um batalhão de taxistas luta pela oportunidade de conduzi-lo ao seu destino. No aeroporto, sem sala vip ou qualquer outro luxo aparente e com obra para todo lado, dezenas de placas alertam: “Obrigado pela sua compreensão e paciência”.

E a aventura está apenas começando, mas com um detalhe importante: nesse mundo novo, distante e revelador, não há o menor risco de violência urbana. Antes de mais nada, jogue fora os clichês. Desfaça-se de estereótipos. Afaste de sua mente imagens preconcebidas. A Índia, afinal, é infinitamente mais fascinante e complexa do que as brochuras turísticas insistem em mostrar.

O fato é que, hoje em dia, ninguém no mundo pode mais fechar os olhos para o que acontece na Índia, uma nação de cultura milenar, classe média emergente formada por 300 milhões de pessoas e considerada atualmente uma das estrelas da economia mundial. De todos os pontos de vista, é um país que desafia a racionalidade. Com um contingente imenso de miseráveis, 23 línguas oficiais, religiões conflitantes, paupérrimo de infra-estrutura e com vários setores dos negócios em estado rudimentar, a Índia é encarada por investidores internacionais como um lugar de grandes oportunidades.

“Evite escovar os dentes com a água da torneira, seja qual for a categoria do hotel que você se hospedar”, aconselha um exagerado brasileiro residente em Nova Délhi, para o espanto dos visitantes de primeira viagem. Você pode pensar que é um daqueles exageros preconceituosos, com os quais o Brasil também convive. Muitos de nós já fomos abordados por norte-americanos ou europeus, querendo saber se, no Brasil, existem animais selvagens no meio da rua.

A propósito, em Nova Délhi, a poucos metros do aeroporto, dezenas de macacos transitam nas ruas procurando comida. Os animais — vistos como a manifestação do Hanuman, um deus hindu — são reverenciados pelos fiéis. Ou seja, são aparentemente inofensivos. Mas o vice-prefeito de Nova Délhi, SS Bajwa, morreu vítima de um ataque desses bichinhos, dentro de casa. Ele estava lendo jornais na sacada, numa manhã de sábado, quando os animais invadiram o local. Ao tentar espantá-los, o vice-prefeito perdeu o equilíbrio e caiu do primeiro andar, sofrendo graves ferimentos na cabeça.

A vaca, outro animal sagrado, também está virando um problema no país. Cerca de 40 mil vacas que perambulam tranqüilamente entre pessoas e o trânsito caótico de Nova Délhi estão

sendo removidas das ruas da cidade. Segundo as autoridades, o objetivo é melhorar a imagem do país no exterior, dando um padrão internacional de organização, pois a presença das vacas é uma ameaça à ordem pública e à saúde da população. Os animais estão sendo retirados e levados para um santuário fora da cidade, onde serão cuidados pelo governo. O recolhimento, entretanto, está sendo feito com todo o cuidado e prudência, já que a população fiscaliza o tratamento que os funcionários dão às vacas. Os animais são considerados deuses sagrados e não podem ser molestados e nem abatidos ou sacrificados, conforme a religião hindu, predominante no país.

CHINA x INDIA

"A India é a China de 15 anos atrás.” A frase é do embaixador do Brasil na Índia, Marco Brandão.

Rodeado por jornalistas, após o Seminário Florestas do Brasil, organizado pela Fundação Gilberto Freyre, em Nova Délhi, ele falava com otimismo sobre o futuro da Índia. De fato, há uma parte considerável do empresariado brasileiro que se ressente de não ter investido mais na China há 15 anos. Isso dá força à frase do embaixador brasileiro, sobretudo quando se sabe que a segurança jurídica e o fato de a Índia ser uma democracia são vantagens sobre a China dos anos 1990.

A guinada da Índia para a economia de mercado aberta e competitiva veio com atraso em relação à vizinha China e aos demais países emergentes, mas foi a que mais resultados conseguiu em curto prazo. No fim dos anos 1980, os especialistas consideravam a economia indiana tão fechada quanto uma ostra. O capital estrangeiro só podia entrar no país em associações minoritárias com os empresários locais, em geral testas-de-ferro de políticos corruptos. Hoje os tempos são outros. A Intel, por exemplo, norte-americana fabricante de chips de computador que domina o mercado, acredita que, nesse ritmo, a Índia pode ameaçar até a China como país emergente mais promissor.

A introdução da língua inglesa — fruto da colonização britânica, que durou dois séculos — permite que haja uma língua comum falada em todos os estados, cada qual com seu próprio dialeto nativo. Isso dá uma boa vantagem competitiva à Índia em relação a outros países emergentes, como o Brasil, China e Rússia. Mas, além disso, os ingleses introduziram o sistema de trens, que cobre todo o país, o telégrafo e toda a modernização nas comunicações.

A independência foi conquistada em 1947, após a célebre resistência pacífica liderada por Mahatma Gandhi, o grande personagem do século 20, que deu o exemplo para o mundo, ensinando que a paz é possível A mais extraordinária face da revolução indiana é seu foco naquilo que a elite do país tem de melhor, a competência acadêmica nas áreas de matemática,

física e, mais recentemente, de software. Por conta disso, há cinco anos a economia indiana vem crescendo em média 6% ao ano. É o dobro do ritmo de crescimento da economia mundial

no período.

Marcondes Brito
Enviado por Marcondes Brito em 24/09/2009
Código do texto: T1828191