Infidelidade feminina em xeque

Prólogo:

Os seres humanos são de natureza inexoravelmente dualista: constituídos de uma pequena porção de razão e dominados em maior parte pela emoção. Por isso mesmo, nos casamentos e/ou demais relações interpessoais há grandes dúvidas sobre a base primorosa do relacionamento: será amor ou interesse? Paixão? Piedade ou vingança? Provação ou destino? Um pouco de tudo isso. Creio.

AQUI, NESTE ESPAÇO, HOUVE UM PROTESTO. RETIREI ALGUNS PARÁGRAFOS PORQUE SEM QUERER CAUSEI UM MAL-ESTAR TERRÍVEL A UMA LEITORA POR QUEM TENHO VERDADEIRA ADORAÇÃO. APÓS CONVERSAR PESSOALMENTE COM ESSA QUERIDA MENINA-MOÇA TALVEZ ELA ME PERMITA APOR DE VOLTA OS PARÁGRAFOS SUPRIMIDOS SEM PREJUÍZOS RELEVANTES NO CONTEXTO.

Agora quero escrever sobre o tema instigante a que me propus:

Falar sobre infidelidade feminina pode ser interpretado como um viés machista, mas perante a obviedade quase genética da infidelidade masculina, a traição das mulheres é mais instigante por ser a única a sofrer reprovação unânime, tanto de homens, quanto de mulheres e de toda a sociedade hipócrita como um todo. O homem tudo pode! Mulher? Ora, mulher apenas deseja, suspira e poderá sonhar.

Assevero sem medo de errar! Em ambos os sexos o motivo essencial da infidelidade é logicamente a insatisfação com a relação em um ou mais dos seus vários níveis: sexual, emocional, intelectual, social, afetivo, etc. Assim, por ser um assunto tão complexo e volúvel, torna-se necessário reduzi-lo a, digamos assim, motivações mais picantes e palatáveis.

Um alegado motivo deflagrador da infidelidade feminina é a incorrência no adultério como mera resposta ao adultério, real ou imaginário, do marido, amante, noivo ou namorado. Este tipo de alegação oportuniza a pergunta: um ato justifica o outro? Quem sabe? Creio haver um misto de arbítrio e necessidade nessa represália.

A vingança é uma forma medonha de atraso, mas é esse doce e perigoso castigo que dá um quê de felicidade a quem se vinga. Só quem um dia já castigou alguém, física ou psicologicamente, saberá a que me refiro.

Não basta apenas castigar! O excelente é ser o instrumento da desforra, castigar sem se sentir culpado (a) e permanecer impune; poder conviver com o (a) infeliz e sorrir entredentes pensando:

"Foste o instrumento de minha paz. O teu desgosto é a melhor reparação e causa de meu ultraje e ofensa. Não me sinto podre, injusta (o), e tampouco culpada (o). Os teus chifres são o adorno mais justo e merecido que eu poderia te proporcionar". Isso é ser maquiavélica (o)? Em absoluto! Isso é ser verdadeiramente humano.

Atenção! Não me queiram mal! Não quero e não faço apologia a vindita pela traição. Apenas defendo, veementemente, o direito de ser gente abominando a acomodação desditosa dos mais fracos.

Aqui no Recanto das Letras já escrevi sobre os mitos associados à infidelidade. E também já expressei a minha discordância em relação à estereotipagem dos papéis de gênero, que enfatizam a ideia de que os homens e as mulheres pensam e sentem tudo de modo diametralmente oposto.

Hoje decidi desmontar uma crença há muito enraizado nas mentes humanas: a de que os homens traem mais do que as mulheres. Isso é uma mentira deslavada! O que realmente ocorre é que alguns homens (a maioria), por serem indiscretos e irresponsáveis, alardeiam suas conquistas bem ou malfadadas. “Comer” alguém se acredita, é a sublimação do estado masculino a sua posição mais elevada. Claro que discordo dessa tola e inconsequente pretensão machista.

Ainda há quem defenda que os homens são incapazes de ser monogâmicos e que as mulheres – coitadas – não passam de vítimas em suas mãos. A própria ficção – a literatura, o cinema ou a televisão – continua a alimentar a ideia de que as mulheres que se envolvem com homens casados são frágeis, dominadas por uma combinação explosiva de fraca autoestima e dependência emocional. A mulher que é apanhada num caso de traição é quase sempre a amante do marido, e não a mulher casada.

Ora, as estatísticas – e a minha experiência vivenciada ao longo dos 87 anos de idade – demonstram exatamente o contrário. Alguns estudos indicam que 45-55% das mulheres casadas e 50-60% dos homens casados têm relações extraconjugais.

Numa sondagem levada a cabo nos Estados Unidos 74% dos homens e 68% das mulheres admitiram que seriam capazes de ter um “affair” (caso) se tivessem a certeza de que não seriam apanhados. Aqui no Brasil há um filme (comédia) cujo título é bem sugestivo: “Trair e coçar é só começar”.

Bem sei que as coisas não foram sempre assim e que no tempo dos meus avós a disparidade dos números seria maior. Mas se enganam aqueles que consideram que nesse tempo não havia infidelidade feminina tanto quanto masculina!

A infidelidade – masculina ou feminina – depende, também, da oportunidade, pelo que é importante considerar que a emancipação da mulher potenciou o contato com pessoas do sexo oposto, favoreceu o equilíbrio em termos do poder conjugal e minimizou a dependência em relação ao marido. Mas as donas de casa também têm caso ou casos. E tê-los-iam há trinta ou quarenta anos atrás, ainda que poucos suspeitassem.

Quanto às razões subjacentes à infidelidade: de um modo geral (cada caso contém as suas próprias especificidades), as pessoas traem o cônjuge pelas mesmas razões por que se separam, isto é, porque as suas necessidades afetivas não estão a ser preenchidas pela relação “oficial”. Em muitos casos, o que está em causa é a ligação emocional.

Claro que os problemas econômicos contam e até empurram as estatísticas para o alto. Quanto maior a necessidade financeira mais fácil se apertará o laço da infidelidade humana. As contas de aluguel, água, energia e telefone não podem esperar pelo salário minguado do parceiro desqualificado, acomodado, inculto, e por isso mesmo não apto aos melhores empregos.

Mulheres adoram jóias, perfumes, cremes, roupas, sandálias, flores; viver perigosamente em busca de orgasmos múltiplos; sentirem-se totalmente preenchidas em suas necessidades básicas e surreais; gritar suas fantasias aos amantes que possam manter essas expectativas acesas como a chama do desejo latente e proibido (práticas sexuais inconfessáveis) é a tônica de suas ousadias.

Mas o peso do “pecado” também já não é o mesmo e o sexo pelo sexo também existe – nos dois gêneros, claro. Isto é biológico! O acasalamento não é mais imperativo para a procriação. Gozar e fazer gozar, nos dias de hoje, mais do que nunca faz parte da vida e do sagrado direito de ser gente.

Há diferenças de gênero, sim, na forma como homens e mulheres lidam com a revelação de que foram traídos. Os homens tendem a isolar-se mais, pelo que apresentam maior resistência a pedir ajuda externa.

Prestem bem atenção nos três depoimentos aqui reproduzidos foram publicados na Revista Donna do Jornal Zero Hora, de Porto Alegre, em 26 de janeiro de 2003.

CASO n° 1 - Professora, 30 anos. Casada há nove anos mãe de dois filhos:

"Não é que eu seja mal-amada: meu marido é um tesouro e vivemos muito bem. Nem penso em me separar. 0 fato de ter pulado a cerca, e de pular novamente sempre que me der vontade, não é culpa dele nem minha. A gente se casa cheio de paixão, mas o romance se desgasta, acaba o olho no olho e o frio na espinha.

Não sou vulgar, mas já tive vários casos. Esses relacionamentos são para preservar meu lar, ficar mais feliz. Transar com o marido é, às vezes, quase uma violência, como se fosse com o pai ou o irmão. Mas fazer o que? A união não é só sexo, tem muitas outras coisas.

Posso não acreditar muito no casamento, mas acredito menos ainda na separação. Se eu pegar outro marido, vai virar a mesma rotina, e o meu é melhor que todos eles. E ele jamais imaginaria que tenho casos, porque não ando por aí me expondo. É tudo muito escondido.

Tenho uma história por vez, que dura um ou dois anos. Às vezes me apaixono e, então, me despedaço. Não acho errado trair, não do jeito que faço. Tomo muito cuidado, namoro por telefone ou me encontro com ele no meio do dia, e digo que fui ao centro.

Nos vemos de 15 em 15 dias, mais ou menos, e ele sempre me deixa em uma rua bem longe de casa. Não digo que seja fácil, mas não exponho meu marido nem meus filhos. Então, vou ter culpa por quê?

Fico preocupada sim, quando não tenho ninguém, quando fico infeliz.

Agora, estou há 1 ano e 2 meses em uma história bem light com alguém do trabalho. É um namorado só para me dar um pouco de alegria. Tenho certeza que quando eu ficar beeeeem velhinha isto vai acabar. Aí, se eu não for feliz, vou me contentar com a minha vida e os meus netos. Mas, enquanto eu for bonita e nova, não vou me enterrar.".

CASO n° 2 - Profissional Liberal, 50 anos, mãe de uma filha:

"Fui casada por mais de 20 anos. Casei virgem para ser de um homem só. Não estava procurando ninguém, mas tinha insatisfações: falta de namoro, de diálogo. Até então, ficava me dizendo que ele era bom pai, bom marido. Tentava me contentar com aquilo que não me satisfazia, nem como mulher. Então, conheci uma pessoa em uma festa, alguém próximo de nós.

Foi fulminante. Fiquei mais de 12 anos com ele. Parecia uma adolescente, não dominava meus sentimentos. Ele também era casado, e nós tentávamos fugir disso, mas não conseguíamos. Por mais que tentássemos encobrir, era transparente.

Com o passar do tempo, conhecidos ficaram sabendo, porque nós convivíamos juntos como casais. Éramos forçosamente amigos, porque eu não tinha nada em comum com a mulher dele nem ele com meu marido.

Manipulávamos encontros para estarmos perto. É algo de que hoje me envergonho, mas era mais forte que eu. Meu marido desconfiava, mas não tinha coragem de enfrentar. Até porque, desde que tive outra pessoa, ele nunca mais me tocou. Pensei em me separar muitas vezes, mas ele não queria e havia os filhos.

Também me preocupava com o que iriam dizer. Até que meu marido me deu a entender que sabia de tudo, e aproveitei para pedir a separação.

Meses depois ele se separou também, e nós assumimos. Foi difícil com nossos filhos e é até agora. Muitos ficaram contra mim, me viraram a cara. É fácil julgar os outros. Sei racionalmente que não agi certo, mas o coração me impedia.

Hoje, moramos separados. Sabemos que, por enquanto, tem que ser assim. Existem dificuldades a serem resolvidas e, se forem, maravilha. porque ainda me sinto a mulher mais feliz do mundo nos braços dele.".

CASO n° 3 - Advogada, 49 anos. Casada há 25 anos, mãe de dois filhos:

"Nunca tive intenção de trair, mas quando eu vi estava completamente envolvida por outra pessoa. Havia descoberto uma felicidade que não conhecia até então, visceral. Estava casada há mais de 10 anos, e o casamento era muito diferente do que eu imaginava.

Fui feliz com este outro homem por três anos em uma relação muito prazerosa. Cheguei a acreditar que tinha encontrado a metade da laranja. Conheci-o na faculdade, e nos encontrávamos em horário de trabalho. A emoção era tanta que eu tinha até ânsia de vômito antes.

Ele também era casado e tinha filhos. Tivemos uma amostra de felicidade, porque nossa história era mais ou menos igual, de casamentos mornos, mesmos ideais, tudo fechava.

Mas sabia que não iria muito longe pelo comprometimento que tínhamos com nossas famílias e nossa educação. Havia também a questão financeira: ele teria que deixar bem a mulher e os filhos, e eu teríamos de abrir mão, pois estaria deixando a casa, do pouco que havia amealhado.

Ficaríamos sem nada em nome do nosso amor. Ele vinha de uma família de pais separados, e eu tinha perdido minha mãe, o que pesava quando pensava nos meus filhos. Diante disso tudo, a gente se acovardava.

Ficamos mais íntimos para poder chorar as horas que ficávamos separados e cobrar a distância um do outro. A mulher dele desconfiou e começou a pressioná-lo, assim se escassearam nossos encontros. Quando vimos que a relação dava mais sofrimento que prazer, já que nem podíamos andar de mãos dadas no shopping, decidimos acabar.

Nunca mais tivemos contato.

Meu marido já desconfiava, porque eu tinha ficado mais bonita e confiante. No meio da crise, contei tudo a ele e aos meus filhos. Precisava desabafar, e eles perceberam que eu estava sofrendo e até ficaram com pena. Disse que tivera um caso e que nunca tinha sido tão feliz, mas que não dava mais para continuar.

Falei ao meu marido para fazer o que quisesse, mas ele não quis ir embora, continua comigo. Não temos mais nada, nasceu uma amizade.

Tive uma depressão profunda, culminou com um câncer. Acho que só hoje estou me recolocando na vida.

Esse relacionamento me trouxe mais prejuízo que felicidade, mas faria tudo de novo, com mais experiência. Deixaria de lado o sentimento de posse para ser feliz por mais um tempo. Na ansiedade de tê-lo acabava cobrando demais. Não soube ser uma boa amante.

Hoje, meu marido e eu dormimos em quartos separados, mas não penso em me separar nem em ter um novo amante. Parece 'que a fonte secou.'".

Eis meus singelos comentários:

Cada um dos depoimentos reflete um tipo de atitude diferente em relação ao adultério, sentimentos diferentes, além de se referirem a situações diferentes. No texto 'Suas dúvidas entre dois amores' escrevi um pouco protervo:

"O coração está dividido, você fica entre dois amores, sem saber para que lado deva ir. Mas será que é mesmo possível amar duas pessoas ao mesmo tempo? Essa dúvida não é apenas da indulgente Santa, mas de muitas mulheres apaixonadas, pragmáticas, livres, dinâmicas, amorosas, casadas, separadas, divorciadas, viúvas, solteiras, párvoas e extremamente inteligentes".

Podemos perceber pelos relatos que em alguns casos há níveis diferentes de amadurecimento e resolução interna, em termos emocionais e conceituais, em relação à situação.

Quem está certo? Quem está errado? A natureza humana é complexa! Por isso, hoje mais do que nunca a infidelidade feminina, igual a mim, igual aos meus inúmeros leitores, está em xeque.

Leiam o texto 'Uma amante perfeita', foi publicado aqui, no Recanto das Letras, e certamente me compreenderão. Eu sempre quis e desejei expandir os horizontes dos que me cercam. Se eu pudesse apagaria a Santa de minha mente. Não fui e não quero ser capaz!

Não. Não posso! Ela faz parte dos meus mais coloridos sonhos desde o dia 17 de outubro de 2008. Foi maravilhoso, ótimo, e quero que aconteça novamente, inúmeras vezes, com a maior intensidade e força universal possível.

"Um beijo e um abraço fraterno, já na entrada da casa dos sonhos coloridos, selou o pacto de mútua discrição e recíproca cumplicidade. Finalmente aconteceu, entre os que se mereciam e queriam. Amaram-se e foi bom para ambos. Aquela seria sempre uma noite memorável." (17 de outubro de 2008 - 'Uma noite memorável').

A sociedade que tente compreender nossos infortúnios ou sofridas causas. A infidelidade feminina e eu estamos ameaçados, vivenciamos um contratempo muito grave, comprovadamente estamos em xeque.