FESTA DE SÃO BENEDITO NO MUNICÍPIO DA SERRA, ESPÍRITO SANTO, BRASIL

FASES DA FESTA DE SÃO BENEDITO

Ciclo de Amor, Fé e muita religiosidade

TEXTO DO ESCRITOR CAPIXABA, CLÉRIO JOSÉ BORGES

AUTOR DO LIVRO HISTÓRIA DA SERRA - ES - BRASIL

Os quatro momentos dos festejos são:

CORTADA DO MASTRO

Tem como ponto de partida o antigo Caminho de Caraípe, na Região de São Domingos. Do lado do mar. Um tronco verde, úmido de seiva, é trazido da mata, puxado por Juntas de bois enfeitadas. O cortejo é acompanhado por cavaleiros com suas montarias enfeitadas. Seguem-se Bandas de Congo e Banda de Música.

A Cortada do Mastro é uma festa móvel, realizada no primeiro domingo após o dia 8 de dezembro, dia dos festejos da Padroeira da Serra, Nossa Senhora da Conceição. É o início dos festejos em louvor a São Benedito.

Animação marcou a cortada do Mastro de São Benedito no dia 12 de Dezembro de 1999, na Serra. Nem a chuva tirou a empolgação dos quatro mil participantes, que percorreram dois quilômetros em procissão. Mais de 300 cavaleiros, vindos de diversas regiões do Estado, também acompanharam o evento. A procissão partiu do bairro São Domingos, onde foi cortado mastro, e seguiu até a Igreja Nossa Senhora da Conceição, na Serra, sede. Cinco Bandas de Congo e a banda civil “Estrela dos Artistas” puxaram a festa. O Mestre Antônio Rosa, principal puxador da Banda de Congo, morreu no último dia 3 de agosto. A mulher do mestre, Ilohyl Vieira Machado, preferiu não acompanhar a procissão, o que fez durante os 48 anos em que estiveram unidos. A fincada do Mastro acontece no dia 26 de Dezembro.

TRADIÇÃO E FÉ

Com o título “Tradição e Fé na Procissão”, o Jornal “A Gazeta”, de 27 de dezembro de 1995, em “Geral”, página 14, relata:

“Tradição e fé envolveram, ontem, a “fincada” do mastro de São Benedito, na Praça da Matriz, Serra. Desde o início da tarde, os devotos movimentaram-se entre a praça e a avenida Getúlio Vargas, enfrentando a chuva que caía. Às 18 horas, parou de chover e o barco transportando o mastro foi puxado por aproximadamente 500 fiéis, que seguravam uma corda de 200 metros seguidos pela Banda “Estrela dos Artistas”, que há 70 anos participa dos festejos. Eles saíram da avenida Jones dos Santos Neves e seguiram em procissão por todas as ruas do município, num percurso de quase duas horas, encerrado em frente a Igreja.

Na praça, durante toda a tarde, a demonstração de fé, diante da imagem de madeira do santo, restaurada para a festa. Exposta na área externa da Igreja Imaculada Consolação (?), a imagem - que é símbolo dos festejos há mais de 125 anos, segundo informaram os organizadores do evento - era tocada, beijada e reverenciada pela população.”

No texto de “A Gazeta” observa-se um erro com relação ao nome da Igreja que é Igreja de Nossa Senhora da Conceição, a Imaculada Conceição e não Consolação.

PUXADA DO NAVIO

É realizada na noite do dia 25 de dezembro. A puxada do navio em terra seca teve origem em Portugal. Quando da campanha para se conseguir voluntários para a guerra em defesa das terras Santas, nas famosas Cruzadas, Pedro Eremita motivava o povo, realizando cortadas de Mastro em cada cidade e, dias após pregações, realizava a puxada de um mastro num improvisado Navio, simbolizando as Caravelas que rumariam para a Terra Santa, em defesa do Santo Sepulcro.

Na Serra existe a versão de que a puxada do Navio representa uma homenagem por ter São Benedito salvo escravos de um Navio que afundara nas costas do Espírito Santo, na região de Nova Almeida. O Navio teria o nome de “Palermo” e após ter navegado 16 dias, foi tragado pelas águas no dia 24 de dezembro e os negros escravos, segurando o mastro conseguiram se salvar alcançando a terra firme.

PUXADA DO MASTRO

É realizada no dia 26 de dezembro. O Mastro é transportado pelo Navio, que sai do lado oposto ao da cortada do Mastro. Imensa a corda é atada ao cabeçalho de Carros de Bois, com rodas de madeiras engastadas em ferro, e a corda é puxada por todos, povo e autoridades.

Segundo a crença popular, o Serrano que é bom Serrano deve pelo menos uma vez na vida puxar a corda no dia da Puxada do Mastro.

No dia 26 de dezembro realiza-se a Puxada do Mastro. O Mastro de São Benedito é retirado de dentro do barco, nele colocada a bandeira com o retrato pintado do santo, e após é feita a “Fincada do Mastro” ao lado da Igreja de Nossa Senhora da Conceição.

Jornal “Tempo Novo” editado na Serra pelo Acadêmico Eci Scardini, relata na edição de 24 de dezembro de 1986 a “Puxada do Mastro” realizada naquele ano. Eis alguns trechos da reportagem:

“Domingo, dia em que normalmente os ônibus da Serra circulam vazios, no último dia 14 esses mesmos ônibus trafegaram cheios, crianças, jovens, velhos, todos arrumados a seu gosto e dentro das possibilidades. O destino era praticamente um só, participar da “Puxada do Mastro” e do folguedo patrocinado pelas Bandas de Congo e pela Banda de Música “Estrela dos Artistas” e assistir ao desfile e às acrobacias dos cavaleiros.”

CAVALEIROS E BANDAS

“Às 17 horas tiveram início os festejos: Três juntas de bois saem de São Domingos, arrastando um tronco de árvore, cercado por uma multidão que pulava ao som das Bandas de Congo e da “Estrela dos Artistas” e acompanhado por 60 Cavaleiros. Depois de atravessar a BR 101, todo esse emaranhado de gente, cavalos e bois percorrem várias ruas da Serra na maior das vibrações. (...) A Banda de Congo não se mistura com a de música, o pessoal é de procedência mais humilde, homens de até 80 anos cantam e tocam tambores e reco-recos, mulheres de até a mesma idade portam bandeiras com o nome de suas bandas, vestidas de branco, dançam e cantam à vontade, mas nunca dispensam um gole da branquinha (pinga) e essa mesma riqueza cultural, de mais de 400 anos, é transmitida de pai para filho, netos que aprendem as “passadas”, os toques nos instrumentos e as letras das músicas com muita facilidade.

A Banda de Música, que sempre veio atrás, com quase 20 músicos, propiciou o maior Carnaval, aderido na sua maioria pelos jovens. (...) Os Cavaleiros também foram atração, os cavalos bem enfeitados (nem todos) andavam sempre juntos, fazendo de cada porta de bar parada obrigatória, sendo que alguns cavaleiros andavam montados de costas para a cabeça do cavalo, outros ficavam em pé sobre o animal, outros saíam pulando de um lado para o outro do cavalo. (...)”

FOGOS DE ARTIFÍCIO

Com o título “Procissão homenageia São Benedito na Serra amanhã”, o Jornal “A Tribuna” publica em sua edição de 25 de Dezembro de 1990 na página 10, o texto onde destacam-se os seguintes parágrafos:

“São Benedito, o santo dos escravos, recebe amanhã uma grande homenagem com muitos fogos de artifício e Bandas de Congo no Município da Serra. Os fiéis realizam, às 17 horas, a tradicional “puxada do Mastro”, que sairá da Avenida Jones dos Santos Neves, na entrada da Serra, e passará pelas principais ruas da cidade, mantendo viva uma tradição de 157 anos. (...) Esta festa faz parte da Cultura Negra do Povo Serrano. Segundo a lenda um navio escravo chamado Palermo naufragou na Costa Capixaba durante uma tempestade, e os escravos invocaram a proteção de São Benedito, encontrando no mastro do navio o meio de se salvarem da morte. O mastro os levou à praia. (...) Os sobreviventes devotos de São Benedito, acreditaram num milagre e prometeram realizar todos os anos uma festa em comemoração ao santo. (...) O Mastro, que será fincado ao lado da Igreja Nossa Senhora da Conceição (...) ficará no local até o Domingo de Páscoa, quando os fiéis o retiram e guardam.”

DERRUBADA DO MASTRO

É a quarta e última fase do Ciclo dos Festejos de São Benedito. O Mastro colocado no dia 26, permanece ao lado da Igreja até o Domingo de Páscoa, quando é retirado e carregado nos ombros pelas ruas da cidade até ser guardado, encerrando-se o “Ciclo das Festividades” da Festa de São Benedito. A festa religiosa do Domingo de Páscoa é chamada de “Derrubada do Mastro.”

ILHA DA SICÍLIA NA ITÁLIA

Palermo é a Capital da Sicília

Existem muitas versões sobre o nome do navio usado nas festividades de São Benedito na Serra. Uns afirmam que se trata do nome de um navio que teria naufragado na costa do Espírito Santo. Outros afirmam ter sido o nome do navio que trouxe os primeiros escravos para o Espírito Santo e consequentemente para a Serra.

Historicamente nenhuma das duas versões se confirma. Pesquisando-se a história do Espírito Santo, poucos são os navios naufragados na Costa do Espírito Santo no período da Colonização. Um dos navios naufragados e que transportava escravos teria sido o que imortalizou Caboclo Bernardo, herói Linharense que salvou escravos de um naufrágio na Costa do Espírito Santo. Houve também no início da colonização um navio naufragado, onde se encontrava o padre Luiz da Grã, o mesmo que escreveu várias cartas relatando o início da colonização da Serra. Mas não foi encontrado nenhum registro de navio escravo com o nome Palermo.

O nome PALERMO está ligado à vida de São Benedito, santo homenageado pelos Negros, por ser de cor Negra já que era de origem Africana.

SICÍLIA

São Benedito nasceu na Sicília, a maior Ilha do Mar Mediterrâneo e que ocupa 25.708 quilômetros quadrados a Sudoeste da Itália, da qual se separa pelo estreito de Messina. É na Sicília que fica o vulcão Etna, ainda ativo, com mais de 3.300 metros de altura, entre 3313 a 3340.

A Capital da Sicília é a cidade de PALERMO.

Registram-se nos festejos de São Benedito, desde a cortada do Mastro até o ciclo final no Domingo de Páscoa, quando há a derrubada do Mastro, as presenças de Bandas de Congo de diversas localidades da Serra, destacando-se:

Grupos de Congo de Putiri, Campinho, Queimado, Goiabeiras, Maruípe, Nova Almeida, Muribeca, Carapebus e outras localidades vizinhas, inclusive o bairro de Pitanga.

As Bandas animam os festejos de tal forma que a festa se transforma num verdadeiro Carnaval, com o povo pulando e cantado ao som dos tambores, reco-recos e músicas populares.

ESCRAVIDÃO POR RAÇA

A escravidão por raça veio depois de 1.500.

O tráfico direto de escravos africanos entre Espírito Santo e África começou em fins de 1621, segundo registra o historiador Basílio Carvalho Daemon, na página 123 de sua obra sobre a história do Espírito Santo. Os que os importavam pagavam com açúcar e outros gêneros. O tráfico já ocorria em outras regiões do Brasil há muitos anos.

Os portugueses não conseguindo o trabalhos dos bugres, índios nativos do Brasil, através da grandes navegações e comércio marítimo, conseguiram negros africanos que foram trazidos ao Brasil e vendidos para o trabalho braçal escravo. Antes de 1500 a pessoa era escrava por dívidas ou conquistas nas guerras, onde qualquer pessoa podia ser escravizada e até ter seu corpo retalhado, caso devesse a mais de um cidadão e seus bens não desse para cobrir a dívida.

No Brasil a Escravidão foi abolida após a assinatura da Lei Áurea (Decreto N.º 3. 353), em 13 de maio de 1888, pela Princesa Isabel, cujo nome completo era Isabel Cristina Leopoldina Augusta Micaela Gabriela Gonzaga de Bragança (1846-1921).

BENEDITO NASCEU LIVRE

Benedito era filho de Mouros, os quais pela Guerra tornaram-se escravos na Itália.

A imagem de São Benedito em alguns casos, aparece com Jesus Menino no colo, dando uma certa nobreza a figura de Benedito, contudo Benedito em vida não foi escravo. Já nasceu livre e nem podia ter tido o menino Jesus em seu colo, já que nasceu em 1526 e Jesus no início da nossa Era Cristã, no ano 1. Já a devoção de São Benedito na Serra, surge através dos escravos.

A partir de 1890, os abolicionistas trouxeram a festa para o Centro da Serra, pois antes era realizada na localidade de Putiri, com coordenação do Mestre Zé Maria, o mesmo que criou antes de 1890, os versos da popular música “Madalena”, que tornou-se conhecida no Brasil e Exterior através dos cantores, Martinho da Vila e Simone.

FESTA COM ALEGRIA E ARTE

A festa passou a ter um cunho especial de alegria e arte, com um navio confeccionado com capricho. A Banda “Lira Estrela do Norte” foi criada especialmente para tocar na festa, organizada para suplantar a grande festa folclore-racista, a Festa de Santo André, que era realizada antes de 1890, em 30 de Novembro pela Guarda Nacional e na qual podiam participar os que não fossem da Guarda, desde que fossem brancos.

A puxada e fincada do Mastro tiveram origem no povoado de Putiri, segundo muitos, berço da escravidão no Município e, era realizada pelos escravos. Com o advento da abolição da escravatura, em 1888, a Festa ganhou as ruas da Sede e a adesão do povo.

CLÉRIO JOSÉ BORGES ESCRITOR CAPIXABA
Enviado por CLÉRIO JOSÉ BORGES ESCRITOR CAPIXABA em 24/07/2006
Código do texto: T200514