“Avatar”, ou Um presente do Céu

“Renascido em sua forma avatar, Jack consegue voltar a andar”...

Assim começa uma sinopse do mais recente filme do cineasta norte-americano James Cameron, embora nada diga da complexidade do argumento da nova obra idealizada por aquele que, detentor de onze estatuetas do Oscar por Titanic, declarando-se “o Rei do Mundo”, encanta-nos com uma bela fantasia inspirada em tudo o que foi capaz de apreender da Vida e de suas histórias, quer em suas versões sagradas, profanas, quer por outras tantas fantasias contadas pela imaginação e criatividade de seus companheiros artistas ao longo dos mais de cem anos da invenção do Cinema.

Para contar a incrível história de Avatar, o cineasta James Cameron enclausura “Jack”, seu personagem protagonista, num “hibernador” a fazê-lo viajar dormindo pelo espaço dentro de uma nave por cinco anos, nove meses e vinte e dois dias em direção do planeta dos Na’vi, um povo “humanóide”, alto, de pele azul e jeitão de fada – o que de fato parecem ser quando os vimos pequeninos em relação ao tamanho das árvores existentes em seu planeta. Lá, além de uma floresta exuberante e animais exóticos, uma luminosa árvore das almas é alimentada pela Vida de tudo a gerar memórias como sementes, proporcionando aos nativos conexões instantâneas com tudo o que existe no lugar, além das “almas” que são as memórias de seus antepassados.

A despeito de tal riqueza de conhecimento científico, que nos parece já artificialmente dominado pelos humanos (sic) – uma vez que os cientistas o utilizam como propulsor dos “sarcófagos conversionais”, artefatos tecnológicos que Cameron não se dá ao trabalho de explicar como funcionam ao transferir personas humanas (sic) para os corpos industrializados dos Na’vi – a despeito de tal impressionante riqueza cultural existente no planeta, então, é ainda a obtenção de certo “precioso” minério o que impulsiona os “vindos do céu” a armar estratégias de infiltração, extermínio e domínio exclusivo do território dos Na’vi, e então outra guerra é declarada.

Embora talvez James Cameron, tanto ótica quanto semioticamente, tenha conseguido nos dizer “tudo” sobre como se processam as relações da Vida com os milhares de milhares de belíssimas imagens que ele conduziu sua equipe técnica a produzir – já que “uma imagem vale por mil palavras” – a sinopse que li sobre o filme nada diz, por exemplo, do que seja um “avatar”. Dessa forma, poucos sabem que não está correto dizer que “Jack renasce em sua forma avatar”. Porque o corpo que Jack assume no planeta dos Na’vi é apenas um corpo Na’vi, não o de um Na’vi avatar – embora, em si mesmos, os corpos Na’vi possam ser considerados natural e potencialmente avatares, já que frutos das evoluções de seu “planeta sagrado” a torná-los mais adequados a condição de receptores das muitas dimensões da Vida – o que é a característica fundamental de um avatar. E isso graças a fantásticos potenciais fisiológicos de conexões que eles dispõem, como tranças que se entrelaçam a de animais e a vegetais existentes no planeta a tornar os Na’vi conscientemente unos com tudo e terem domínios sobre o comportamento de certos animais, como espécies de cavalos e gigantescos pássaros.

A palavra “Avatar” significa genericamente aquele que vem do céu, como se diz terem vindo Buda, Jesus Cristo e Gandhi antes de Krishna – cujas influências de sua milenar cultura hindu também colaboraram certamente à inspiração de James Cameron para que, entre outras coisas, construísse seus Na’vis de pele azul, sendo o clima de seu planeta quase exclusivamente de um azul-lilás, cor considerada “bastante esotérica” por muitos “místicos”. E foi provavelmente com as descobertas do cientista Albert Einstein que Cameron se inspirou a fazer seus seres não de “sangue azul”, mas de sangue luminoso, bem como toda a seiva vital do planeta deles. Mas a condição “avatar” do corpo Na’vi idealizado por Cameron não é apenas considerada porque é um invólucro habitado pelo ser de Jack. O corpo Na’vi de Jack torna-se um avatar porque é também um “mensageiro do céu” – embora emissário dos que vieram de um céu onde há uma Terra, um “avatar” espião de homens (sic), portanto, sempre os mais cruéis predadores, como descobrem depois os Na’vi. E então é graças a nossa remanescente cobiça e violência, transferida até outros distantes quadrantes estelares, que a raça Na’vi anda também ameaçada de ser extinta.

Entre as grandes mentiras produzidas pelas novas tecnologias a serviços das artes visuais para comunicações de partes da Verdade, e a despeito da dinâmica aventureira do filme atrair, principalmente, a jovens habitantes do novo século, ouvi dizer que Avatar foi inicialmente considerado “Impróprio para menores de 12 anos”. Pensei que nem tanto pelas cenas de violência ou de sexo que exibe: cenas de sexo e violência, abundantemente mostradas de formas mais vívidas em outros filmes – cultuadas por sanguinários jogadores de videogames menores de 16 anos – em Avatar são quase tão ligth’s quanto àquelas produzidas em filmes como As Crônicas de Nárnia, da Disney.

Mas, como defendem psicólogos, talvez não seja uma boa idéia dizer a personas em formação que, lá, bem fundo, podem não ser aqueles que eles acreditam ser, aqueles que dizem outros que eles são ou, ainda, aqueles melhores “heróis” ou “avatares” que, graças às influências do Cinema, existem dentro deles como referenciais de vir a ser.

Ao se considerarem certas coisas, enfim, Avatar terminou por ser aberto a expectação dos que já completaram 12 voltas ao redor do Sol. Com isso, pode ser possível contar com a possibilidade de que, já que andam a negligenciar o valor das bibliotecas, talvez num filme como Aavatar uma nova geração possa descobrir o que, essencialmente, tudo e todos nós somos. Porque, como nos mostra bem o novo filme de Cameron – entre outros – como tudo, “no fundo” somos apresentações deste “Ser” vital chamado “Vida” que, pela eternidade a fora, nos torna a todos reais avatares inconscientes de Si mesma. “Ser” que, para muito, muuuuuuuito além dos preconceitos, pode levar nossa juventude, e ainda alguns velhos de nós, a descobri-Lo em algum lugar de nossas consciências a aí fazer-nos saber exatamente onde, em nós, se poderá encontrar o centro do Universo.